Agência Estado
postado em 27/08/2018 11:30
O Tribunal de Contas do Município (TCM) de São Paulo está suspendendo a contratação de obras e serviços da Prefeitura em um ritmo maior do que no passado. Só neste ano, o órgão já paralisou temporariamente o andamento de 164 licitações lançadas pelo prefeito Bruno Covas e seu antecessor, João Doria, ambos do PSDB, travando contratos de pelo menos R$ 1,2 bilhão. Segundo dados repassados pelo tribunal, o total de paralisações no primeiro semestre deste ano (104) é 20% maior do que o no mesmo período de 2017 (88).
A atuação do TCM voltou a ganhar destaque há uma semana, quando o órgão impediu a Prefeitura de concluir a licitação da concessão do Estádio do Pacaembu, na zona oeste da capital - promessa de campanha de Doria, que deixou o cargo em abril para concorrer ao governo do Estado. O órgão também paralisou outras contratações de peso, como a renovação da frota de 14 mil ônibus municipais que, em um prazo de 20 anos, iria substituir os coletivos por veículos não poluentes, estimada em R$ 140 bilhões.
No ano passado, Doria chegou a defender a extinção do TCM, posição não adotada por Covas. A gestão de seu antecessor, Fernando Haddad (PT), também teve dificuldades em aprovar licitações-chave, como a Parceria Público-Privada (PPP) que trocaria a iluminação pública por lâmpadas de LED. Dados oficiais da Corte de contas mostram que 244 processos foram paralisados em 2017, durante a gestão Doria, contra 216 em 2016 e 220 em 2015, últimos anos de gestão Haddad.
Entretanto, o levantamento do órgão revela que as suspensões não são apenas dos contratos relacionados a promessas de campanhas políticas ou de planos de governo. Em 2018, o órgão que mais teve processos contestados por auditores e conselheiros foi a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), com 20 paralisações, como de compras de rádios operacionais e de serviços de sinalização. Em seguida, aparece a Secretaria de Cultura, com 12.
Atribuições
Tribunais de contas fiscalizam gastos públicos e podem suspender editais de licitação irregulares. Mas especialistas da área apontam falhas na atuação do órgão paulistano.
O professor de Direito Público Carlos Ari Sundfeld, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), cita como exemplo o caso da concessão do serviço funerário, outra promessa de campanha de Doria. O processo foi paralisado ainda na fase do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) - quando interessados apresentam projetos que vão embasar uma futura licitação. "Os tribunais de contas seguem a Lei de Licitações e podem suspender licitações. Mas uma PMI não é uma licitação, é um procedimento anterior, e foi suspenso", afirma. "Para isso, o TCM não tem competência nenhuma. Isso não tem nada a ver com Direito. Não é possível falar em corrigir uma falha. Isso é o TCM querendo participar do jogo político", afirma.
Sundfeld questiona ainda as suspensões de editais "em cima da hora" feitas pelo TCM - para ele, a atuação do órgão deveria ser no início do processo, assim que editais são publicados. "Há um grau de politização muito grande", argumenta, ao lembrar a composição do TCM, ocupado por ex-vereadores que são indicados por prefeitos. "É algo perigoso, que não tem nada a ver com fiscalização."
A presença de vereadores nas sessões do TCM são frequentes. No caso do Pacaembu, por exemplo, Celso Jatene (PR), que havia feito representação contra o prosseguimento do processo, esteve no dia da sessão que suspendeu o processo. Procurado pela reportagem, ele não quis dar entrevista.
O presidente da Comissão de Direito Administrativo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), Adib Kassouf Sad, destaca que, neste ano, a Prefeitura enviou ao órgão uma série de licitações para tratar de assuntos novos, como as concessões, o que exigiu mais capacidade dos técnicos da casa. "Mesmo assim, no que é novo, o que vale é verificar o cumprimento da lei", diz. Sad destaca, entretanto, que tribunais de conta têm papel fundamental para o controle das compras públicas.
O Estado questionou os conselheiros do órgão, por meio da assessoria de imprensa, para comentar os dados repassados pela próprio tribunal a pedido da reportagem. Mas os conselheiros não se manifestaram. Já a Prefeitura, por nota, evitou comentar o aumento das paralisações. Disse que seus editais de licitação "são elaborados obedecendo às normas legais e técnicas vigentes" e que, quando o TCM faz questionamentos, "estes são respondidos prontamente". A gestão Covas conclui dizendo que "não cabe ao Município avaliar ou opinar sobre a forma como o TCM cumpre suas obrigações legais". As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.