Otávio Augusto
postado em 13/10/2018 09:38
Medo. Desesperança. Falta de perspectiva. Os três termos são os que mais aparecem no discurso dos jovens com idade entre 15 e 29 anos quando são indagados a avaliar a atual situação do Brasil. O pessimismo é ancorado em dificuldades para crescimento social e profissional e pela exposição à violência. Ao todo, 1.400.617 de eleitores jovens vão às urnas, mas grande parte está desencantada com a política.
A juventude brasileira é caracterizada por heterogeneidade e desigualdade, segundo especialistas. Esse é um dos fatores que devem ser levados em consideração ao se desenvolver políticas públicas para eles, segundo especialistas (leia quadro ao lado). Cálculos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que há 48,5 milhões de pessoas no país com idade entre 15 e 29 anos.
;A grande preocupação é com o que vai acontecer, como as coisas vão ficar;, explica Jéssica Oliveira, 23 anos. Ela mora em Taguatinga e conta que muitos amigos não trabalham nem conseguiram terminar o ensino médio. ;O pessimismo começa quando a pessoa tem de abandonar a escola para partir rumo ao subemprego. O jovem não é prioridade;, conclui a estudante de engenharia da comunicação da Universidade de Brasília (UnB).
Negro e morador da periferia, Jhonata Rodrigues, 24 anos, voltará às urnas no segundo turno, mas está cético. ;Não está bom para ninguém. Todos estão sofrendo com a realidade que temos. Não há perspectivas. A desesperança é uma verdade muito dura;, reclama o estudante de ciências sociais da UnB, que vive no Gama.
Essa é a primeira eleição em que a estudante de pedagogia Júlia Godoi votou. A jovem de 16 anos está preocupada com a polarização da disputa. ;O jovem não sabe para onde ir. São muitos problemas e poucas pessoas com a possibilidade de resolvê-los. A realidade do jovem muda a depender de onde ele está e qual o contexto em que está inserido, mas em todos os cenários há grandes problemas;, pondera a moradora de Águas Claras.
Júlia e o namorado, Estevão de Paula, 19 anos, estudam na UnB. Ele acredita que a parcela mais jovem é responsável por mudanças sociais. ;Estamos na transição, mas não temos ferramentas para isso. A falta de perspectiva de melhora afeta gravemente a nossa geração e, talvez ,esse seja o combustível para esse momento descrente que estamos atravessando;, conclui.
Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o número de eleitores entre 16 e 18 anos, cuja participação é opcional, caiu 14,53% em relação a 2014 quando eram 1.638.751. Para este pleito, 238.134 jovens eleitores deixaram o grupo que escolherá os representantes políticos.
O sociólogo Antônio Carlos Mazzeo, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp), destaca que o desencanto é um fenômeno mundial. ;Num paralelo entre o movimento estudantil de 1968, havia um projeto de futuro. Hoje, a juventude está pragmática, menos culta e querendo sobreviver dentro da ordem. Há uma crise cultural e econômica de intensa profundidade, das relações estruturais da sociedade. O velho ainda não morreu, e o novo não emergiu. Isso leva a desagregação e ao embrutecimento;, explica.
Rudá Ricci, cientista político da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), destaca que essa tendência entre os jovens se avolumou a partir de 2010. ;Naquela época, as pesquisas já revelavam essa guinada. A desesperança maior vem desde 2013. Todo aquele ato não deu em nada. A política se apresenta como uma frustração imensa para essa população. Na avaliação deles, de alguma maneira, a política não se renova. Por isso, muitos não querem votar;, pondera.
Francisco de Assis Costa Filho, secretário nacional de Juventude da Presidência da República, defende que é importante conscientizar os jovens de que o voto é um importante instrumento de mudança coletiva. ;A distância dos processos que envolvem a coisa pública e a falta de engajamento no exercício da cidadania, na prática, não ajudam em nada para que as transformações aconteçam;, avalia.
Panorama
1.400.617
Total de eleitores jovens que
vão às urnas, segundo TSE
52%
Percentual, segundo o Banco
Mundial, dos jovens que perde interesse pelos estudos
48,5 milhões
Número de pessoas com idade
entre 15 e 29 anos, segundo o IBGE
11,1 milhões
Total de jovens que não
trabalham nem estudam
61%
Percentual desta população
que vive em situação precária,
de acordo com o Unicef
33.590
Número de homicídios de jovens de 15 a 29 anos no Brasil entre 2006 e 2016, segundo o Atlas da Violência
23%
Aumento no número de homicídios
de jovens de 15 a 29 anos no Brasil cresceu entre 2006 e 2016