Brasil

Jornalista lança livro sobre a tragédia de Mariana, na próxima quinta-feira

Lançamento de 'Tragédia em Mariana: a história do maior desastre ambiental do Brasil', de Cristina Serra, acontece na Livraria Leitura do Píer 21

Leonardo Cavalcanti
postado em 16/11/2018 06:00
Em Paracatu de Baixo, o
Toda história precisa de grandes e medíocres personagens. O desastre da barragem do Fundão, em Mariana (MG), está repleto deles. De todos os tipos, dos mais corajosos ; que arriscaram a vida em nome de outras pessoas ; aos mais covardes, aqueles que tiveram alguma responsabilidade, inclusive cientes de riscos, ou se omitiram na tragédia ambiental, ocorrida há três anos. A jornalista Cristina Serra conseguiu identificar cada um desses perfis e contou, a partir de um quebra-cabeças medonho, uma das mais tristes, e ao mesmo tempo, heroica, histórias do país.

No próximo dia 22, às 19h, na livraria Leitura do Píer 21, Cristina lança o livro Tragédia em Mariana: a história do maior desastre ambiental do Brasil (Editora Record). A obra é uma grande reportagem, com toda sensibilidade envolvida. O cuidado da repórter com as vítimas é absoluto, a partir de uma relação poucas vezes vista entre autor e personagens. O jornalismo pode ser produzido entre o rigor da informação e a emoção dos relatos ; neste caso, distante de pieguismos ou construções baratas. O ponto mais importante de Cristina, entretanto, foi não cair nas armadilhas armadas para repórteres incautos, que tentam se transformar em protagonistas e se esquecem as lições de John Hersey, o autor de Hiroshima: não existe nada mais estúpido do que autorreferências.

Um dos mais importantes exemplos de jornalismo literário, o livro de Hersey conta como a bomba atômica trucidou a cidade japonesa de Hiroshima, em 1945, a partir dos olhos e ouvidos de seis personagens. O texto mistura as histórias dos sobreviventes de uma maneira inovadora, muitas vezes tentadas e poucas vezes conseguida por outros autores. Cristina não tem tal pretensão, ao contrário, o que só reforça a força da escrita. Mas, de alguma forma, a cidade japonesa está presente.

;A gente viu um cogumelo de fumaça, parecia fumaça, mas era poeira subindo, uma poeira marrom, alaranjada... Sabe Hiroshima e Nagasaki? Parecia que uma bomba tinha explodido ali;, relatou o major da Polícia Militar Alex Chinelato, comandante do primeiro helicóptero de salvamento que chegou a Mariana, às 17h40 do dia da tragédia, em 5 de novembro de 2015. A aeronave pousou em Paracatu de Baixo. Em pouco tempo, apenas 10 minutos, a lama que havia devorado Bento Rodrigues atingiria o outro distrito. O trabalho, então, era avisar os moradores para que abandonassem as casas.

Mensageiros

Capa do livro Tragédia em Mariana;Eles (os moradores) nem imaginavam que nós éramos mensageiros de uma desgraça;, contou Chinelato. O lugar mais alto era o cemitério. ;O que vimos foi desespero e incredulidade. Um senhor disse: ;Essa lama só vai chegar aqui amanhã;. Peguei ele pelos ombros e gritei: ;Vai embora, sobe, vai para o cemitério, senão você vai morrer.; Foi o conselho mais contraditório que eu dei na vida, mandar uma pessoa para o cemitério para que ela não morresse;, lembrou Chinelato, em entrevista a Cristina. De imediato, a lama deixou 19 mortos e destruiu os subdistritos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, em Mariana. Os efeitos, entretanto, se perpetuam.

O grande caldo venenoso que desceu do reservatório da Samarco viajou pelos ribeirões e rios Gualaxo, Carmo, Piranga e Doce por 660km até o mar do Espírito Santo, levando destruição por onde passou até as cidades de Risoleta Neves, Baguari, Mascarenhas e Aimorés. ;Por onde passava, a enxurrada deixava uma camada de rejeitos depositados nas margens dos rios que, com o tempo, ficaria endurecida como se o solo tivesse sido cimentado. Era um cenário de hecatombe;, descreve Cristina, que avança até os dias atuais, onde uma segunda tragédia se abate para o povo da região: o desemprego que chegou com as dificuldades da Samarco. A repórter também volta a dois personagens emblemáticos: Romeu Arlindo dos Anjos e Paula Geralda Alves. Enquanto um conseguiu sobreviver ao sair do mar revolto de lama, a outra salvou parte da população de Bento Rodrigues ao percorrer as ruas da cidade numa moto. Avisava sobre a morte que descia o rio.

Trecho do livro

;De dentro do carro, ele observou a pasta de resíduos, que vinha da usina. Ouviu um estrondo, como se fosse um rugido das profundezas da terra. Olhou para o reservatório e viu a massa de rejeitos mover-se como uma gelatina. Em poucos minutos, a barragem estourou por completo e a lama armazenada começou a pôr-se em movimento. Romeu travou por 10 segundos, com as mãos no volante. Achou que estava passando mal. Era como se o mundo se desintegrasse. O solo se desfazia em pedaços. Ele tirou o cinto, abriu a porta, desceu correndo. Viu a caminhonete tombando;

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