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Após prisão de João de Deus, 'remédio' de R$ 100 deixa de ser cobrado

Funcionários do centro afirmaram que a mudança foi determinada pelo próprio médium, que costumeiramente indicava o remédio manipulado para mais de dois terços dos frequentadores.

Agência Estado
postado em 19/12/2018 13:21

A maior parte dos bancos ficou vazia

A prisão preventiva de João de Deus trouxe um impacto não apenas para o movimento da Casa Dom Inácio de Loyola, onde o médium costumava fazer os atendimentos, mas também em procedimentos do local. Cápsulas "energizadas", antes vendidas a um preço de R$ 100, passaram agora a ser distribuídas gratuitamente. Funcionários do centro afirmaram que a mudança foi determinada pelo próprio médium, que costumeiramente indicava o remédio manipulado para mais de dois terços dos frequentadores.

Na manhã desta quarta-feira (19/12), a casa reunia menos de 200 pessoas em busca de tratamento espiritual. A sessão, a primeira depois da prisão preventiva do médium, começou mais tarde do que o usual, por volta das 9h. E uma hora depois já quase não havia fila no local.

A maior parte dos bancos ficou vazia. O silêncio era tamanho que era possível ouvir os grilos. A televisão, que tradicionalmente exibe filmes com operações feitas por João de Deus, trazia apenas o alerta que as traduções eram feitas em várias línguas. E o nome do líder, que antes da prisão era citado de forma constante, não foi mencionado nesta quarta-feira.

João de Deus está preso desde domingo (16/12), em Goiânia, acusado de abusar sexualmente de pacientes em consultas que ele realizaria de forma particular, no próprio centro.

Poucos foram os frequentadores dispostos a falar sobre o tema. Um dos funcionários, que não quis ter seu nome identificado, adotou o discurso dos advogados de defesa e afirmou que o médium, de 76 anos, era muito assediado por mulheres.

"Aqui nesta casa há apenas a verdade", afirmava a oradora numa palestra para os poucos fiéis que ali se encontravam. Ela pedia energia para todos aqueles que passavam por provações.

O centro atrai mensalmente cerca de 10 mil pessoas, cerca de 40%, estrangeiros. Nesta manhã, a maior parte dos frequentadores era estrangeira. E em sua maioria, já tinham vindo para Abadiânia em outras oportunidades. Poucos foram as pessoas que estavam na Casa Dom Inácio nesta manhã pela primeira vez.

A passiflora é preparada num laboratório que funciona na própria Casa Dom Inácio de Loyola. O centro foi alvo na terça-feira (18/12), de buscas pela Polícia Civil. De acordo com funcionários, as cápsulas são iguais para todos. O que muda seria a "energia" dispensada em cada frasco. Na ação de busca em imóveis de João de Deus, a polícia apreendeu armas e dinheiro vivo.

Para os fiéis, a energia do remédio é personalizada. O tratamento dura cerca de dois meses. Questionado porque as cápsulas são vendidas a esse preço, funcionários afirmam haver custos para manutenção da fábrica - registrada no nome da mulher de João de Deus, Ana Keila Teixeira. Além disso, argumentam de que tudo o que é doado, não é valorizado.

A estimativa é que sejam vendidos mensalmente cerca de 8 mil frascos de remédio no centro. Isso significa que, somente com as cápsulas, a casa teria um faturamento bruto de R$ 800 mil. Sem falar na pomada para dores, para queimaduras e o xarope.

A ordem de gratuidade é apenas para a passiflora. De acordo com funcionários, não há ainda expectativa se o remédio será dado de forma gratuita para todos. Embora sem custo, as filas para a retirada das cápsulas não foi grande.

As ruas da parte nova da cidade amanheceram vazias. Às 8 horas, menos de 100 pessoas iam à pé, vestidas de branco, rumo ao centro. Costumeiramente, são centenas.

O impacto no movimento aterroriza o comércio da região. Eles temem que, mantida essa queda, os prejuízos serão ainda maiores. Já se fala em demissões. Situada a 113 quilômetros de Brasília, Abadiânia tem atualmente 17 mil habitantes. A estimativa da prefeitura é de que a Casa Dom Inácio de Loyola seja responsável por cerca de 1.300 empregos, diretos e indiretos.

Não há, no momento, de acordo com funcionários, expectativa de se fechar a casa. O recesso de fim de ano, que foi cogitado, agora está praticamente descartado.

Funcionários costumam comparar a casa a uma igreja. O padre até pode sair, mas o centro religioso permanece aberto. Funcionários dizem não haver sucessor para João de Deus. Caso a prisão se arraste, o "hospital espiritual;, que acreditam existir em cima da casa, continuará funcionando por meio dos voluntários que fazem a corrente, afirmam.

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