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Aplicativo de viagens de ônibus é contestado pela ANTT e vai para Justiça

Buser é uma plataforma que desde o início de 2018 conecta passageiros a empresas de transporte executivo e que oferece passagens 60% mais baratas, quando comparadas com as das tradicionais viações de ônibus rodoviários

Estado de Minas
postado em 17/01/2019 16:23
Buser é uma plataforma que desde o início de 2018 conecta passageiros a empresas de transporte executivo e que oferece passagens 60% mais baratas, quando comparadas com as das tradicionais viações de ônibus rodoviários
Depois dos aplicativos de transporte privado individual de passageiros, como Uber, Cabify e 99 Pop, e até de motocicletas, como o Piloto 31, uma nova polêmica corre nas instâncias judiciais. Trata-se do Buser, plataforma que desde o início de 2018 conecta passageiros a empresas de transporte executivo e que oferece passagens 60% mais baratas, quando comparadas com as das tradicionais viações de ônibus rodoviários. Inicialmente previsto para começar em julho do ano passado, o Buser encontrou diversos problemas judiciais, sendo contestado pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT), no âmbito federal, e pelo Departamento de Edificações e Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DEER/MG), no âmbito estadual.

Em um desses imbróglios, na primeira viagem programada, dois carros do DEER/MG e duas viaturas da Polícia Militar Rodoviária de Minas Gerais cercaram o ônibus e impediram a partida do veículo, que levava cerca de 35 passageiros de Belo Horizonte para Ipatinga, na Região do Vale do Aço. Na ocasião, as pessoas que viajariam com a plataforma tiveram que recorrer aos tradicionais ônibus da rodoviária da capital mineira. Desde então, a startup começou a concentrar seus financiamentos em advogados, para que o projeto pudesse, finalmente, se concretizar.

Segundo um dos fundadores do aplicativo, Marcelo Abritta, o serviço não infringe a lei brasileira. O CEO explica que a função do aplicativo é de, simplesmente, conectar pessoas desconhecidas que queiram viajar para o mesmo destino, em uma mesma data. ;Se você vai viajar com cerca de 40 amigos, você não vai comprar 40 passagens de ônibus, mas sim ligar para uma empresa de fretamento e alugar o serviço. É isso que a gente faz;, afirma.
No entanto, Abritta esclarece que nem sempre uma viagem prevista no aplicativo se realiza. Para que o ônibus saia do Terminal JK, ponto de embarque e desembarque dos veículos das empresas contratadas pela Buser, é necessário atingir um número mínimo de interessados. Para isso, a startup desenvolveu um sistema, em seu site, que, de acordo com as demandas dos usuários em viajar para certos destinos, a probabilidade de confirmação da saída do ônibus é alterada em tempo real.;Quando o aplicativo começou, a gente mostrava quantas pessoas estavam no grupo, mas quando tinha só um passageiro, percebemos que as pessoas não compravam com medo de o ônibus não sair. Agora não mostramos mais o número de pessoas que já reservaram e sim a probabilidade de a viagem ser realizada.;

Além disso, o valor da passagem cobrada pela plataforma é relativa à quantidade de pessoas que compraram o serviço; quanto maior esse número, menor será o custo por passageiro. Na hora da compra, o valor coletado pelo aplicativo é referente ao preço máximo ; custo do frete dividido pelo número mínimo de viajantes necessários para que a viagem seja confirmada. Caso a quantidade de interessados seja superior ao mínimo, o preço diminui e um crédito é depositado na conta do usuário, para que ele possa utilizá-lo em viagens futuras. Do valor cobrado pelas empresas de ônibus pelo fretamento, 20% costumam ir para a startup, que se define como uma empresa com fins lucrativos.

Preços mais baixos

Um traslado Belo Horizonte/São Paulo, realizado, em um ônibus de categoria leito, pelo Buser, fica em torno de R$ 95. O valor corresponde a menos da metade dos preços oferecidos pelas empresas de ônibus da rodoviária da capital mineira. No caso da Viação Cometa e da Empresa Gontijo, companhias que fazem o traslado BH/SP, as passagens custam R$ 212,99 e R$ 197,86, respectivamente.

De acordo com Abritta, não há nenhum truque da startup para oferecer preços mais em conta. ;Não somos nós que somos muito mais baratos, eles é que são muito mais caros. Essas empresas estão, há anos, sentadas num monopólio, aí o preço só aumenta. Não precisamos fazer nenhuma mágica;, ressaltou.

Por outro lado, a advogada da Buser, Miriam Menasce Ajame, lembra que essas empresas, por ter autorização para atuar nesse tipo de transporte, devem obedecer a certos roteiros, como locais e horário de partida e chegada. ;Elas (empresas rodoviárias) têm várias isenções de impostos por prestar ;serviços públicos;, mas acabam tendo que atender a certas demandas;. Já a Buser, que, de acordo com a advogada, está inserida em outro contexto, o do livre mercado, apesar de não receber isenções de impostos, consegue flexibilizar certas exigências. Continua depois da publicidade

Indagada sobre o novo aplicativo, a Empresa Gontijo, por meio da assessoria de imprensa, preferiu não comentar, uma vez que não tem dados que meçam a influência da plataforma nas demandas por passagens. A Viação Cometa, procurada pela reportagem, preferiu não comentar as acusações.

Uma das críticas que a nova plataforma recebe das tradicionais empresas é de que ela estaria oferecendo um serviço semelhante aos das vans clandestinas que rodeiam a cidade, principalmente no entorno da Rodoviária de Belo Horizonte.

Em defesa da Buser, Ajame argumenta que a viagem promovida pelo aplicativo não é garantida, ao contrário das oferecidas pelas vans clandestinas. ;O perueiro faz a oferta direta e a viagem não tem autorização. No Buser é o contrário, primeiro é o interesse das pessoas, não existe garantia das passagens. Além disso, todas as empresas que contratamos são regularizadas junto à ANTT;, conclui.


Clandestinidade


Desde o surgimento da nova plataforma, agências reguladoras de transporte e sindicatos e associações que representam as empresas de transporte de passageiros vêm contestando a legalidade do serviço oferecido pela Buser. Em processos judiciais que correm em Minas Gerais, São Paulo e Paraná, a Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT), junto com departamentos regionais de fiscalização de trânsito e segurança, argumentam que o serviço de transporte coletivo prestado não tem autorização legal e, portanto, funcionaria de maneira clandestina.

No entanto, em 14 de março do ano passado, o juiz da 3; Vara Federal de Belo Horizonte, Ricardo Machado Rabelo, concedeu uma liminar em mandado de segurança preventivo que impediu a ANTT e o Departamento de Edificações e Estradas de Rodagens de Minas Gerais (DEER/MG) de interromper as viagens intermediadas pela Buser. Na decisão, o magistrado afirmou que ;não há a menor dúvida de que a Buser não oferece transporte público;. O juízo entendeu que a empresa de tecnologia apenas conecta pessoas interessadas em fazer viagens com destinos em comum.

Já em 8 de junho, o desembargador do Tribunal Regional Federal da 1; Região João Batista Moreira acatou o recurso da ANTT e suspendeu a liminar da 1; instância de Belo Horizonte. De acordo com o magistrado, ;o ;Brasil Novo; ainda precisa conviver com o ;Brasil Velho;, da forma segura o quanto possível;. Em sua decisão, o desembargador ainda transferiu a competência do juízo para a Justiça Federal de São Paulo, que em setembro, por meio do Juiz Hong Kou Hen, da 8; Vara Federal de São Paulo, sentenciou a favor da Buser. Desde então, a empresa oferece seu serviço com autorização judicial.

Em nota, a ANTT ressaltou que o aplicativo não é o objeto direto da fiscalização, mas sim as empresas que prestam o serviço de transporte de passageiros, que, segundo o órgão, não têm autorização para fazer transporte público. Além disso, a agência diz estar ;avaliando os impactos das novas tecnologias na área de transporte e como estas podem contribuir para melhorar a prestação de serviço aos usuários;.

O DEER/MG informou que não foi comunicado de nenhuma decisão judicial que autorize o transporte intermunicipal pelo Buser e que ;continuará agindo com todo o rigor para coibir qualquer modalidade de captação de passageiros que fuja aos regulamentos que norteiam o transporte regular concessionado ou por fretamento.;

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