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Armazenamento do arsênio pela Kinross é contestado

O semi-metal é derivado da quebra das rochas da região, que supostamente são despejados como rejeitos na barragem localizada em Paracatu (MG)

Gabriela Tunes* , Lucas Valença - Especial para o Correio
postado em 07/02/2019 14:59
O semi-metal é derivado da quebra das rochas da região, que supostamente são despejados como rejeitos na barragem localizada em Paracatu (MG)
Em um parecer enviado pela empresa Kinross Gold Corporation à Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais, para garantir a segurança da barragem, localizada em Paracatu, a multinacional atesta que nas águas superficiais e subterrâneas da região há a presença de ;arsênio total e solúvel;. O semi-metal é derivado da quebra das rochas da região, que supostamente são despejados como rejeitos na barragem. No entanto, o documento não especifica a quantidade ou medição da substância na água. A Supram Nor foi contratada para elaborar o parecer.

Para o geólogo e professor da Faculdade Noroeste de Minas Gerais Márcio José dos Santos, que analisou a quantidade de arsênio no corpo de moradores próximos à barragem, como já divulgado pela reportagem, a companhia tem evitado se manifestar sobre o arsênio. ;Esses dados deveriam ser divulgados e cobrados pelas autoridades públicas. São informações importantes e a população precisa ser informada;, disse.

Ao responder aos questionamentos feitos na quarta-feira (30/01), a empresa afirmou que o arsênio era ;descartado em instalações duplamente revestidas e projetadas especificamente para sua contenção, chamadas ;tanques específicos;;. Para o pesquisador, mesmo que a companhia disponibilizasse tanques para todo o arsênio, ;não teriam onde armazenar;, pois a quantidade do semi-metal seria ;muito grande;. ;De uma forma mais compreensiva, para se extrair uma grama de ouro são necessárias duas toneladas e meia de minério. Esta quantidade teria em torno de um quilo e cem gramas de arsênio. Então, a cada ano, levando em conta que a mineradora movimenta 61 milhões de toneladas de minério, ela libera mais de 67 mil toneladas de arsênio em sua forma tóxica;, calculou.

A reportagem também teve acesso ao processo de licenciamento, elaborado em 2016, onde a empresa solicita a renovação da licença para operar. Neste parecer, a Kinross ressalta que os tanques específicos são para a contenção dos sulfetos e do cianeto, produto químico também considerado tóxico, mas essencial para a atividade mineral. Assim, a empresa menciona indiretamente o arsênio, já que pode ser uma forma de sulfeto. No entanto, Márcio José dos Santos contesta a afirmação que o arsênio permanece na forma de sulfeto durante a atividade da mineração. ;Quando é atacado por cianeto, estes sulfetos são transformados em óxidos de arsênio, o que é altamente tóxico;, esclareceu.

Imagem do documento


Após o Correio publicar que a Kinross passou a controlar o acesso de pessoas e carros em vias públicas, pessoas contactaram a redação para relatar problemas ou visões sobre o caso. Entre elas, está a atual moradora de Brasília, Denise de Fátima de Araújo, que contou ter um terreno além da portaria, em nome do pai. Ela explica que o ;pequeno sítio; foi afetado pelas atividades de mineração da empresa. ;Sempre tivemos água, que era a do fundo do quintal (um pequeno riacho), mas depois que eles foram para lá, virou pura lama. Está poluído e não temos mais como plantar nada;, declarou.

;A água que temos lá é do caminhão pipa que eles levam;, esclareceu a ex-moradora. Contudo, ela ressalta que a medida é uma forma de aliviar o problema. ;Na fazenda ou nas chácaras, você tem de ter água. Eles estragaram o nosso lugar. Eles acabaram com a nossa terra. Se a gente quiser plantar qualquer coisa, não tem mais como;, lamentou.

Segundo ela, o pequeno sítio também foi afetado pela guarita instalada. ;Sempre é um transtorno quando tentamos entrar. E se eu quiser que entre um amigo? E se eu quisermos montar um bar? Quem vai conseguir ir? Não tem a menor condição;, questionou.

Outro lado


Procurados, a Kinross Gold Corporation afirmou que o arsênio presente no minério da mina Morro do Ouro se apresenta como um sulfeto, assim, também é contemplado no parecer enviado às autoridades ambientais. ;Além disso, no Estudo de Impacto Ambiental apresentado quando do processo de licenciamento, descreve que a geologia local da área da Mina Morro do Ouro tem a presença natural de sulfetos incluindo a arsenopirita;, afirmou em nota.

Sobre a quantidade de rejeitos produzidos, a Kinross explicou que tem capacidade de armazenar ;todo rejeito gerado pela sua operação;. ;A empresa projeta e constrói seus sistemas de contenção de rejeitos de forma a comportar todo minério e seus componentes. Neste contexto, os tanques específicos foram adequadamente projetados para receber a totalidade do concentrado sulfetado;, ressaltou.

Questionado se há a hipótese de haver alguma contaminação nas águas da região, a empresa foi enfática ao negar as suspeitas. ;A Kinross adota uma série de medidas para garantir que nenhuma contaminação ocorra;, garantiu no documento.

Também disseram que as ;barragens atuam como um sistema prévio de tratamento de água;, já que são construídas com ;drenos internos formados por areia e brita;.

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