Brasil

Crise e desemprego aprofundam desigualdade

No primeiro trimestre de 2012, os 10% mais ricos do país ganhavam, em média, 29 vezes a mais do que os 40% mais pobres. Já nos primeiros meses deste ano, essa relação subiu para 36,6 vezes. Índice Gini aumentou pela 17ª vez

postado em 21/05/2019 04:27
Desempregada, Renata Lima e o marido vendedor, cuja renda é de R$ 1000 por mês, se apertam para conseguir o básico





Com o desemprego alto, 12,7% de janeiro a março, e os efeitos prolongados da recessão iniciada em 2014, a desigualdade de renda atingiu o nível mais elevado em sete anos, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). O índice Gini de 0,627, medido no primeiro trimestre, é o maior desde o primeiro trimestre de 2012, início da série histórica, quando era de 0,608. A taxa mede a desigualdade em uma escala de zero a um, sendo que o zero representa a igualdade perfeita.

Este foi o 17; aumento trimestral consecutivo do indicador. O levantamento do Ibre/FGV também mostra um aumento na distância entre os mais ricos e os mais pobres. De acordo com a pesquisa, no primeiro trimestre de 2012, os 10% mais ricos do país ganhavam em média 29 vezes a mais do que os 40% mais pobres. Já nos primeiros meses de 2019, essa relação subiu para 36,6 vezes.

Essa discrepância de renda pode ser notada ao comparar a rotina e dificuldades enfrentadas por pessoas com condições financeiras diferentes. Renata Lima, de 25 anos, moradora do Recanto das Emas, procura emprego há mais de um mês para ajudar a sustentar sua família. Com uma renda familiar em torno de R$ 1.000, graças aos rendimentos do marido, que é vendedor ambulante, ela precisa fazer diversos bicos para garantir alimentos e saúde para o filho pequeno. ;Faço alguns trabalhos extras na informalidade, como cortes de cabelo ou bolos de pote. Me viro como posso para ajudar nos custos da casa;, diz.

Renata conta que, como o marido é autônomo e depende das vendas para obter sua renda, a família já chegou a passar por apertos na hora de pagar as contas e fazer compras. Ela relata que, nos últimos meses, notou um grande aumento nos preços dos produtos que compra para seu filho. ;Meus principais gastos são as coisas para meu filho, e no último mês, o preço de leites e fraldasfoi o que mais aumentou. Todo dia tem um aumento diferente no mercado. Por causa da nossa renda, acabamos tendo só o básico para sobreviver. Só o dinheiro suficiente para comida e contas da casa;, conta.

Já a professora Márcia Benetti, 53, consegue manter o emprego e a renda já que é servidora pública do Governo do Distrito Federal (GDF). Moradora do Lago Sul, ela afirma que, mesmo em escala bem menor, também sentiu diferença no orçamento. ;Apesar de ser funcionária pública, nosso rendimento não é o mesmo. Eu sinto que a nossa capacidade financeira foi se deteriorando porque a gasolina sobe, o gás sobe, tudo sobe e esse impacto pode ser sentido no nosso salário;, avalia.

Com uma renda líquida em torno de R$ 7.900, a professora afirma que um dos principais pontos onde vê impacto é no preço da gasolina. ;Em Brasília, dependendo de onde você mora, depende do carro, porque tem uma dificuldade com o transporte público;, ressalta.

Motivos e soluções

Daniel Duque, pesquisador e autor do levantamento do Ibre/FGV, aponta a falta de emprego para pessoas com menores qualificações e de classes mais baixas como o maior entrave para a redução da desigualdade de renda. ;O que precisa ser feito é ter um cenário de melhora na economia, que seja baseado no emprego da população de classes mais baixas. É necessário conseguir empregos para as pessoas de menor qualificação, que é quem mais sofre com a crise;, pontua Duque.

Na sua avaliação, a reforma da Previdência, caso aprovada, pode ter um impacto positivo no índice: ;Para obter renda, você precisa trabalhar, e uma das medidas principais da reforma é a alteração na idade mínima de aposentadoria. Com mais pessoas trabalhando por mais tempo, pode acontecer uma melhor distribuição da renda;.

O professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB)José Luís Oreiro concorda, mas acredita que além de uma mudança no mercado de trabalho, seria necessário também uma reforma tributária. ;O que vai mudar a distribuição de renda no Brasil é uma reforma tributária. Nosso sistema tributa muito os produtos, em vez de tributar a renda. Por isso, o pobre acaba pagando mais imposto do que o rico;, compara.

* Estagiária sob supervisão de Cláudia Dianni






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