Junia Oliveira/Estado de Minas, Guilherme Paranaiba /Estado de Minas
postado em 23/05/2019 13:33
Paracatu ; Em clima de muita comoção e com perguntas cujas respostas permanecem um mistério, foram sepultados ontem os corpos das quatro vítimas do acesso de fúria que levou Rudson Aragão Guimarães, de 39 anos, a assassinar a facadas a ex-namorada, antes de matar a tiros três pessoas em uma igreja evangélica de Paracatu, município de 92 mil habitantes no Noroeste de Minas, a 502 quilômetros de Belo Horizonte. O homem agiu, segundo suspeita a Polícia Civil local, movido pela fúria contra o pastor do templo, Evandro Rama, que o havia afastado há cerca de dois meses da comunidade por ;má conduta;.
Em Paracatu, foram sepultados Antônio Rama, de 67, pai do pastor da Igreja Batista Shalom; Marilene Martins de Melo Neves, de 52; e Rosângela Albernaz, de 50. Eles estavam no interior da igreja, no Bairro Bela Vista, quando Rudson os atacou, atingindo a todos com disparos na cabeça. Antes disso, o homem havia esfaqueado a ex-namorada Heloísa Vieira Andrade, de 59. Ela estava em uma casa da família do próprio Rudson, que fica a três quadras da igreja.
A mulher também orava, ao lado da mãe e da irmã de Rudson, quando recebeu um golpe no pescoço e morreu no sofá da sala de estar do imóvel, segundo a polícia. O corpo dela foi enterrado em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, sua cidade natal. A motivação para o assassinato da mulher e sua ligação com a fúria contra o líder religioso é o principal mistério do massacre.
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[SAIBAMAIS]As investigações devem mostrar, nos próximos dias, a ligação entre a morte da ex-companheira do atirador e a perseguição ao pastor da Igreja Batista Shalom.
Apesar de Heloísa Andrade ter sido a primeira vítima, até o momento as apurações indicam que o principal alvo era o pastor Evandro Rama. Durante o ataque de Rudson, o religioso conseguiu escapar da morte pulando um muro da igreja. Fraturou um tornozelo e teve de ser internado no Hospital Municipal de Paracatu. Após passar por cirurgia, seu quadro clínico é estável, mas ele permanece sob cuidados da equipe médica.
CONSTERNAÇÃO As cerimônias de despedida reuniram dezenas de familiares e amigos dos mortos. Ainda sem acreditar no massacre, a cozinheira Maria Aparecida Loures, de 57, reconheceu que terá de ser forte para aceitar a morte de Antônio Rama, com quem era casada havia 40 anos. ;Perdi meu companheiro de vida. Ele foi um exemplo de pai e esposo, que nunca virou as costas para a família. Era um homem de caráter;, lamentou.
Consternado, o primo de Marilene, o autônomo Renato Martins, de 45, também não se conforma. ;Foi uma coisa lamentável. É impossível imaginar que alguém em sã consciência entre em um ambiente sagrado e tire a vida de várias pessoas, sem mais nem menos. Não consigo descrever o tamanho da minha tristeza. A ficha vai demorar a cair;, declarou.
A professora Iana Quirino, de 37, era da mesma igreja que as vítimas e fez questão de ressaltar a personalidade dos quatro mortos, especialmente a de Rosângela. ;Ela era bastante assídua na nossa comunidade. Uma mulher ativa na obra e verdadeira serva de Deus. Sinto que perdi alguém da minha família. Ela foi uma grande companheira para todos os fiéis da nossa igreja.;
ALUCINADO Na noite da chacina, Rudson arrancou uma barra de ferro do portão da igreja para invadir o templo. De acordo com o tenente-coronel da PM Luiz Magalhães, ele parecia ter alucinações e dizia frases desconexas, como a de que havia voltado do inferno para cumprir a missão de assassinar o religioso.
;Como o pastor fugiu, ele se voltou contra os fiéis. Uma equipe da PM ia em direção à casa onde aconteceu o primeiro assassinato quando ouviu tiros na igreja. Quando chegamos, dois fiéis já estavam mortos e o assassino fez uma terceira pessoa refém. Tentamos negociar, mas ele atirou na cabeça dessa vítima. Em proteção às demais pessoas, a guarnição disparou contra ele, que foi atingido no peito. Assim, conseguimos desarmá-lo;, detalhou o militar. Pelo menos 20 pessoas participavam da reunião na igreja. Com Rudson, os militares encontraram seis cartuchos intactos.
Atrito
As investigações estão a cargo da 2; Delegacia Regional de Paracatu. A delegada de Homicídios da unidade, Thays Silva, levantou a hipótese de que Rudson tenha cometido a chacina devido a um atrito que tinha com o pastor. ;Acredita-se que Rudson tenha ficado irado em razão de sua destituição de uma posição de liderança da igreja. A partir de então, teria começado a proferir ofensas ao pastor. Isso gerou uma indignação grande e chegou ao ápice ontem (terça-feira), quando ele estava bastante alterado e cometeu os crimes;, explicou.
A delegada afirmou ontem que as apurações ainda vão esclarecer muitos detalhes. O atrito entre Rudson e o religioso teria ocorrido há dois meses. Ela acrescentou que não haviam sido ainda constatadas provas materiais indicando um homicídio em virtude da condição de gênero da ex-companheira, o que caracterizaria feminicídio. ;Não havia medida protetiva contra o suspeito, incidência de violência doméstica ou discriminação à mulher, mas destacamos que a motivação exata continua em apuração;, disse a delegada.
Integrante da Igreja Batista Shalom, Yuri Jordão, de 45, disse que Rudson ocupava o cargo de ;intercessor;, auxiliando o pastor a conduzir orações. Segundo ele, há dois meses, após ser alertado sobre problemas pessoais do subordinado, o líder religioso o tirou da função. Teria tentado auxiliá-lo, mas Rudson não se mostrou interessado nos conselhos. A partir daí, Rudson passou a atacar a imagem do religioso em redes sociais.
O atirador já foi ouvido informalmente no hospital, onde terminou autuado em flagrante pelo crime de homicídio contra as quatro pessoas, com duas qualificadoras: motivo fútil e impossibilidade de resistência das vítimas. Já a tentativa de homicídio teve as mesmas qualificadoras com relação ao líder religioso.
Frieza
;Ele alegou que o alvo principal seria o pastor, mas disse que teve a intenção de atingir os demais que acabaram mortos;, explicou a delegada. Ela destacou que, conforme as imagens do circuito interno de segurança, o suspeito foi frio, uma vez que a arma usada permite apenas um tiro por vez. ;Ele recarregava, mirava e atirava;, concluiu.
A policial pretende ouvir o atirador formalmente até amanhã, assim que ele estiver em condições. Rudson seguia ontem internado sob escolta no Hospital Municipal de Paracatu e seu estado era considerado estável.