Agência Estado
postado em 28/07/2019 10:04
A Prefeitura de São Paulo apura se obras de restauração de um palacete tombado no bairro de Higienópolis, na região central da capital paulista, causaram a destruição do patrimônio que deveria estar sendo protegido. A reforma é do Casarão de Nhonhô Magalhães, um dos maiores exportadores de café do País. A mansão foi erguida na década de 1930 e o restauro está sendo tocado pelo Shopping Pátio Higienópolis, atual proprietário do imóvel.
A apuração municipal partiu de representação protocolada pela Associação de Proprietários, Protetores e Usuários de Imóveis Tombados (Appit), entidade que reúne moradores do bairro e arquitetos, que aponta denúncias de "demolições, mutilações, destruição e alterações" no imóvel sob conservação. O tombamento, determinado em 1994 e alterado em 2005, prevê que toda a construção, incluindo os interiores, deve ser preservada.
A representação traz anexo relatório fotográfico apontando "destruição e retirada de revestimentos cerâmicos e pisos de granilite originais para a colocação de novas instalações", clareamento das madeiras e pinturas que teriam deformado elementos decorativos. "Procurei fazer representação técnica, apontando os pontos que estão incorretos", diz a advogada Célia Marcondes, da Appit, que assina o ofício enviado à gestão Bruno Covas (PSDB).
Célia é líder comunitária do bairro do Cerqueira César e foi uma das militantes à frente da mobilização que levou à criação do Parque Augusta, também na região central.
O shopping tem autorização da Prefeitura para executar reformas e alterar o uso da mansão, que será adaptada para virar um espaço de eventos. O processo de liberação teve início em 2018 e terminou em maio. Os técnicos da Prefeitura vão apurar se os trabalhos em execução estão de acordo com o que foi liberado nessa autorização.
Agentes da Secretaria Municipal de Cultura devem visitar a obra, segundo nota da Prefeitura. "Se for constatado algum dano ou irregularidade perante as diretrizes definidas, será aberto processo administrativo a ser encaminhado ao Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) para deliberação da aplicação de multa", diz a Prefeitura, em nota.
O parecer que liberou a obra, de 2018, diz que as alterações mais significativas "tratam da instalação de duas plataformas elevatórias, a abertura de um vão de porta no subsolo, acréscimo de parede divisória, um conjunto de escadas, abertura de vão no térreo, implantação de sanitários comuns e sanitários para pessoas com necessidades especiais em todos os pavimentos". Ele se baseia no projeto básico da obra, que garante que azulejos e outros objetos que tenham de ser retirados sejam identificados e catalogados.
Neste projeto, elaborado por uma empresa de restauração, há informação de que, em um dos banheiros, haverá uma "intervenção mínima", com "preservação do trabalho de azulejaria com traços art déco existente no local". Já a denúncia enviada à Prefeitura mostra o mesmo banheiro, mas a informação é de que a cerâmica foi retirada.
O shopping foi questionado sobre a representação, mas se limitou a informar, por nota, que "todas as obras de restauro do casarão conhecido como Nhonhô Magalhães estão aprovadas pelos órgãos responsáveis, como Conpresp e Condephaat (o órgão estadual que também zela pelo patrimônio histórico), e em conformidade com as normas vigentes".
O advogado Marcelo Manhães de Almeida, especialista em tombamento, lembra que as reformas têm de ser aprovadas pelos órgãos de preservação, mas que bens tombados podem ser alterados. "Um exemplo é o Museu do Ipiranga", diz, ao citar local tombado alvo de intervenções. O museu, na zona sul, está fechado para reformas desde 2013. "Acessibilidade e segurança são dois pontos que sempre resultam em mudanças."
Histórico
O casarão é uma obra de cinco pavimentos que já abrigou uma série de órgãos públicos, como a Secretaria Estadual da Segurança Pública durante os anos 1970. Ele foi arrematado pelo shopping no ano de 2005, em um leilão feito pelo governo do Estado, por R$ 41 milhões (valor corrigido). Desde 2015, o shopping é de propriedade do grupo Iguatemi, da família Jereissati. Antes disso, o empreendimento já foi alvo de ações judiciais por acusações de danos ao patrimônio do bairro e licenciamento irregular. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.