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Entrevista / Torben Schubert

Correio Braziliense
Correio Braziliense
postado em 13/09/2019 04:05
Investimento em ciência não deve parar com crise

;O investimento em ciência e nas universidades gera retornos que vão muito além dos acadêmicos;, ressalta o alemão Torben Schubert, estudioso da economia da ciência, campo que investiga e mede o impacto de instituições de ensino superior e pesquisa. Ele se divide entre as cidades de Karlsruhe, na Alemanha, e Lund, na Suécia, e veio ao Brasil, pela primeira vez, para participar do 2; Fórum & Feira de Internacionalização da Universidade de Brasília (UnB).

Para o especialista, o investimento em ciência aumenta a geração de empregos e o PIB (Produto Interno Bruto) de um país. Portanto, ele defende que, em momento de crise, não se deve parar de investir na área. ;Esse é um forte argumento para sustentar o apoio do governo no ensino superior. Contudo, os efeitos tendem a levar longos períodos para aparecer;, alerta. Bem como os efeitos de investir em ciência, as consequências negativas de não investir também levam décadas para aparecer.




Quais são os critérios para determinar o valor ou impacto na economia da ciência, da pesquisa e das universidades?
Essa é uma questão filosófica até certo ponto. A resposta depende do que você julga como relevante e do que a sociedade julga como relevante. Claro, universidades têm impacto econômico. E o trabalho que temos feito é, principalmente, no sentido de contribuir para determinar e medir esse impacto. Muitos campos da ciência contribuem para educar o público geral. Eu diria que universidades, geralmente, contribuem ativamente para educar pessoas com, diríamos, uma mentalidade aberta, acreditando no progresso acadêmico e científico. E esse valor é enorme, mas não pode ser medido em euros ou dólares ou em qualquer outra moeda.

Em sua palestra, o senhor disse que é complicado determinar áreas de prioridade para investimento. O ministro da Educação, Abraham Weintraub, propôs diminuir os recursos para ramos como filosofia e sociologia nas universidades públicas. A verba seria alocada em cursos que ;geram retorno de fato;, como ;enfermagem, veterinária, engenharia e medicina;. Como o senhor avalia esse tipo de projeto?
Isso é perigoso. Acredito que há consenso, na Alemanha e também na Suécia, onde trabalho, de que o melhor é que a própria ciência regule a si mesma e sua agenda. Quando legisladores e políticos se tornam responsáveis por ;dirigir; agendas científicas, isso é sempre um problema. Não apenas porque eles podem ter vieses e preferências, mas também porque, tipicamente, eles não são as pessoas mais bem informadas para tomar essa decisão.

O Ministério da Educação (MEC) lançou o programa Future-se para facilitar a entrada de verba particular nas universidades públicas por meio de parcerias. Qual a sua avaliação sobre a participação de instituições privadas nas instituições de ensino públicas?
É uma questão difícil. Por um lado, se você, como cientista, colabora com uma empresa, claro que precisará fazer concessões com relação ao que estudar e até ao que divulgar sobre a pesquisa. Por outro lado, esses são sacrifícios e, algumas vezes, eles são mais relevantes que em outras ocasiões. Ao mesmo tempo, se você se fecha com relação à sociedade e com relação às empresas, isso coloca em perigo o entendimento do público no tocante a se e como financiar a ciência. A ciência e os cientistas têm de fazer um esforço de estar aberto a demandas da sociedade.

O que é preciso para que governos e a população ; mesmo quem não frequentou ; valorizem as universidades públicas?
Universidades têm algum potencial e devem se esforçar para serem abertas e conseguirem reagir a certas demandas do público, talvez focando problemas específicos do país onde se situam. Podem ser, por exemplo, questões de saúde, redução da pobreza. Pode ser qualquer tema que seja importante para o país e para as pessoas que, no fim das contas, financiam a educação superior pública. No entanto, isso não é responsabilidade só das universidades ; elas precisam de apoio público para fazer isso. O que eu acho importante, na prática, é que você tenha uma grande parcela das pessoas sendo educadas numa universidade e sendo expostas à metodologia científica. Isso é falar sobre fatos em vez de mitos, usar metodologias que sejam transparentes e replicáveis. Se uma grande parcela da população tiver experimentado o que a metodologia científica significa e o quão poderosa ela é, essas pessoas trarão esses valores para a comunidade. Na Alemanha, um terço dos habitantes chegaram ao ensino superior. Não é o percentual mais alto dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), mas é uma quantidade suficiente para que todo mundo, em todo lugar, conheça muita gente que tenha frequentado essas universidades.

Apesar de a sociedade e o governo reconhecerem o valor da ciência e das universidades, quando há uma crise, essas áreas costumam sofrer cortes. Como evitar isso?
Por um lado, o que é importante é que você tenha argumentos sólidos e isso, quando se fala em política pública, significa também ter números e indicadores econômicos para apresentar. Na minha experiência, é a isso que os responsáveis por decisões políticas tendem a prestar atenção. É mais efetivo do que uma narrativa do tipo: ;Universidades são importantes, fazem grandes coisas e todo mundo sabe disso;. O problema é que, quando o contexto fica muito difícil, você precisa provar isso. Na Alemanha, seria muito difícil um político questionar o valor geral das universidades e sua contribuição. Se um político chegasse a fazer isso, estaria perto de cometer suicídio político.

Como o senhor avalia a cobrança de mensalidades em universidades públicas?
Nos locais onde trabalho, os residentes do país e da União Europeia não pagam mensalidades. Eu, pessoalmente, acredito que pode ser efetivo ter mensalidades, pois isso dá às universidades públicas um orçamento maior sobre o qual elas tenham autonomia para fazer decisões. Para a universidade, seria assim: ;É meu dinheiro e ninguém pode levá-lo embora;. Contudo, ao mesmo tempo, você precisa garantir que as pessoas mais pobres consigam continuar tendo acesso a essas instituições.



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