postado em 03/10/2019 04:12
O plenário do Senado concluiu ontem a votação da reforma da Previdência, em primeiro turno, após a aprovação do texto-base, por 56 votos a 19, na noite de terça-feira. Sem novos cortes, depois da derrota do governo com a reversão da mudança no abono salarial, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6/2019 passa agora para a segunda e última fase de avaliação dos senadores antes de ser promulgada.
O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), pretende pautar a PEC ainda na primeira quinzena de outubro, mas não descarta um atraso no calendário. Para avançar com a proposta, os senadores cobram do governo o cumprimento de alguns compromissos, como a manutenção da partilha dos recursos da cessão onerosa como o Senado definiu, que corre o risco de ser alterada pela Câmara, e a liberação de emendas.
Além disso, a PEC ainda precisa passar por três sessões de discussão antes de ser votada novamente. Como não costuma haver sessão deliberativa às segundas e sextas, a matéria só pode ser pautada na próxima quinta, a não ser que os líderes de partidos façam algum acordo para quebrar esse intervalo. Se não houver entendimento, o segundo turno ficará para a terceira semana de outubro ou depois.
Caso não haja novos cortes, a reforma poderá render uma economia de até R$ 800,3 bilhões aos cofres públicos nos próximos 10 anos. Com a manutenção do abono salarial para quem recebe até dois salários mínimos (R$ 1.996, este ano), como é hoje, em vez de limitar a quem ganha até R$ 1,3 mil, como estava no texto enviado pela Câmara, o impacto ficou R$ 76,4 bilhões menor do que o previsto com a versão anterior.
Apesar de ter sido o único corte feito no plenário do Senado, o abono foi apenas um dos pontos alterados pelos parlamentares desde que a proposta chegou ao Congresso, em fevereiro. Com a PEC original, a equipe econômica tinha a ambição de economizar R$ 1 trilhão em uma década.
O governo lamentou a desidratação, mas reconhece que o prejuízo poderia ter sido maior. Se os senadores tivessem aprovado os destaques que foram rejeitados ontem, o prejuízo chegaria a R$ 277,7 bilhões em 10 anos, contando com a manutenção do abono. Ou seja, a reforma teria o potencial de economia reduzido para R$ 600 bilhões.
O baque foi evitado pelo plenário, ao barrar a emenda que reduziria a idade mínima de aposentadoria das mulheres de 62 para 60 anos ; com impacto de R$ 36,9 bilhões ; e outra que manteria o valor integral da pensão e que custaria R$ 106,8 bilhões. Uma terceira diminuiria a idade mínima para quem trabalha com agentes nocivos à saúde, ao custo de R$ 57,6 bilhões.
Mesmo com a vitória, o presidente Jair Bolsonaro não celebrou as mudanças nas regras previdenciárias. ;Lamento. Tem que aprovar, não tinha como. É uma maneira que nós temos de dar um sinal de que estamos fazendo o dever de casa. Não tem plano B, nem para mim nem para ninguém, se estivessem no meu lugar;, disse ontem a apoiadores, na frente do Palácio da Alvorada.
O mesmo tom foi adotado por Alcolumbre, depois da sessão no plenário. Ele voltou a dizer que a reforma é necessária, mas ;não é uma matéria para se comemorar;. A aprovação significa, para ele, uma postura de ;responsabilidade de se fazer o que o Brasil precisa para equilibrar as contas;.
Análise da notícia
Faltou Rodrigo
Maia no Senado
; Leonardo Cavalcanti
Na noite da última terça-feira, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, convidou parlamentares da oposição ao governo Jair Bolsonaro para um jantar na residência oficial. Poucos minutos antes do evento, o Congresso havia aprovado a medida provisória 885/2019,0 de interesse direto do ministro da Justiça, Sérgio Moro. O texto dá poder à Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad) de leiloar carros, motos, joias e imóveis de traficantes no curso do inquérito ou da ação penal ; ou seja, antes da última sentença. Todos os partidos ; tirando o PSol ; votaram a favor da MP, mostrando que é possível unir parlamentares de legendas contrárias quando a pauta é de interesse comum.
O caso acima é um dos exemplos da capacidade de Maia em comandar a Casa. E se alguém tinha dúvidas da importância do político durante a tramitação do texto da reforma da Previdência na Câmara, a derrota do governo no Senado só reforça a dificuldade do governo em organizar uma base. Ontem, no Congresso, parlamentares lembravam do trabalho de Maia, algumas vezes dando broncas públicas nos principais interlocutores do Palácio do Planalto no Congresso. Por mais que tais atitudes possam ser vistas como arriscada, o próprio resultado da aprovação das mudanças nas regras de aposentadoria fala por si.
A derrota de ontem do governo ocorre no momento que o trabalho do ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, começa a dar resultados. Mas a percepção é que falta, ainda, uma definição do próprio Bolsonaro em jogar com o Congresso. Diga-se que, ontem, Bolsonaro fez agrados em políticos, como Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre. No caso da Previdência, a dificuldade é maior: o capitão reformado nunca teve muita convicção sobre a necessidade de mudanças nas regras. O efeito foi R$ 76 bilhões de prejuízos.