Brasil

Anatomia de um desastre no litoral

Técnicos ouvidos pela CPI do óleo denunciam o despreparo das equipes e a precariedade da vigilância dos mares

postado em 06/12/2019 04:05
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A primeira reunião técnica da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do derramamento de óleo no Nordeste levantou dúvidas sobre diversas ações do governo federal para conter o óleo que contaminou o litoral Nordeste e, nas últimas semanas, chegou ao Sudeste brasileiro, atingindo o Espírito Santo e o Rio de Janeiro. Os especialistas convocados afirmaram que o governo não só demorou para agir e ignorou procedimentos importantes para evitar o agravamento da situação, como demonstrou desconhecimento da validade de imagem de satélites para detectar a origem e o destino do petróleo cru vazado no Oceano Atlântico.

Presidente da CPI, o deputado João Campos (PSB-PE) afirmou, ao fim do encontro, que a apresentação dos especialistas deixou claro que o avanço do óleo pelas praias do Nordeste era mais previsível do que o governo fez crer. ;Fizemos questão de questionar, há previsibilidade do trânsito do óleo nos oceanos baseado no modelo de vento, maré e corrente. A partir do momento que toca a praia, dá pra prever as praias seguintes. E os especialistas disseram que havia sim uma previsibilidade maior que o governo disse que haveria. A gente vai questionar isso nas próximas audiências;, disse.

;Também na visão dos especialistas, o Plano Nacional de Contingenciamento não foi efetivado e tudo será questionado ao governo;, afirmou o parlamentar.

O deputado Rodrigo Agostinho (PSB-PE), presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável concordou com o colega de legenda. ;Fica muito evidente que o governo demorou para agir. Poderia ter contido esse óleo em alto mar. O governo não tem o sistema de vigilância adequado na nossa costa, litoral, zona econômica exclusiva. Ficou claro o nosso total despreparo para enfrentar situações semelhantes, mesmo sendo um dos grandes players do mercado mundial de petróleo com Petrobrás e pré-sal;, criticou.

Agostinho destacou, ainda, a ação dos voluntários e do desmonte do Ministério do Meio Ambiente. ;Quase todo o óleo das praias foi retirado por voluntários, sem os equipamentos de proteção adequados. As poucas informações que a gente tem foram produzidas por universidades federais do Nordeste, que carecem da infraestrutura necessária, que o plano de contingência não funcionou e que o desmonte da área ambiental prejudicou demais toda a situação;, disse.

Um dos depoentes convidados, o engenheiro de pesca e coordenador do Movimento Salve Maracaípe, Daniel Brandt Galvão, destacou que é preciso investigar a possibilidade de um vazamento de poço de petróleo por má vedação. ;Já se especulou navio, barril, a gente acredita que seja um poço do pré-sal. A gente acha que vale a pena, ao menos, investigar, embora já tenha passado muito tempo. Podemos fazer uma reanálise, fazer um pente fino na bacia do pré-sal naquela região de Sergipe, e verificar com navios que estiveram trabalhando na região nos últimos meses;, destacou o estudioso.

Professor de biologia da Universidade Estadual de Pernambuco (UPE), Clemente Coelho Júnior tachou as ações do governo de ;incipientes;. ;Você vê um detalhamento do que deve ser feito ao se acionar o PNC, o que deveria ter sido feito. Vamos ver em um jogo de acerto e erro, que foram poucas ações, muito incipientes e totalmente desarticuladas. A academia está estudando o impacto do meio ambiente. Em termos técnicos, temos um impacto agudo e dimensionado. Mas o impacto crônico demora a ter resultados;, ponderou.

;O recado que fica para a CPI é que temos a maior tragédia do litoral brasileiro, vamos deixar um passivo ambiental gigantesco. Precisamos melhorar e muito, e resgatar as políticas públicas que poderia ter sido acionadas, para não dar essa dimensão enorme à tragédia. Daqui pra frente, a gente vai ter que se reestruturar no Brasil. Principalmente no que tange à área ambiental, que tem sofrido com o descaso do governo federal;, alertou Clemente.

Humberto Alves Barbosa, responsável pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites da Universidade Federal de Alagoas ; Ufal, alertou para a precariedade da vigilância ambiental no litoral brasileiro. "Estamos desprovidos de um sistema de monitoramento que possa detectar ou possa estar olhando o que está acontecendo para que medidas sejam tomadas de uma forma muito rápida, porque em um desastre a ação é fundamental. A rapidez dessa ação determina o sucesso de você evitar um desastre maior", afirmou.

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