Brasil

Advogados e ativistas criticam

Correio Braziliense
postado em 13/01/2020 04:33

A presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABLGBT), Simmy Larrat, disse estar confiante de que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai considerar inconstitucionais as restrições à doação de sangue por homossexuais masculinos. “Eu acredito que o Supremo vai derrubar essas normas, que são extremamente discriminatórias. O STF tem se mostrado imune a esse discurso de ódio que tomou conta do país. Infelizmente, só temos vencido na Justiça, porque o ideal seria que a sociedade abandonasse esse comportamento preconceituoso”, disse.

Larrat acrescenta que a discriminação vai além das normas dos órgãos de saúde, sendo refletida também na qualidade do atendimento prestado pelos profissionais dos hemocentros. “Os homossexuais são tratados de outra forma e sentem claramente o preconceito quando chegam a esses locais”, afirmou. Ela também observa que determinadas práticas sexuais são adotadas não só por homossexuais masculinos, mas também por mulheres, o que confirmaria o caráter discriminatório das normas do Ministério da Saúde e da Anvisa.

“A infecção por HIV entre mulheres casadas tem aumentado. Por que, então, essas restrições para doação de sangue se aplicam apenas aos homossexuais masculinos?”, questionou a ativista, acrescentando que, a exemplo de outros países, o Brasil deveria investir em tecnologia para tornar as doações de sangue mais seguras.

Estatísticas do Ministério da Saúde confirmam que tem aumentado o registro de infecções por HIV entre mulheres heterossexuais. De 2015 a 2018, o número de casos notificados saltou de 9.813 para 10.516. No mesmo período, entre homossexuais masculinos, o aumento foi de 11.579 para 14.596. Houve também crescimento no número de casos entre homens heterossexuais: de 8.202 para 9.599.

Para o advogado João Carlos Velloso, mestre em direito pela Universidade da Califórnia e sócio da Advocacia Velloso, é desproporcional a fixação do período de 12 meses em que o homossexual masculino deve ficar sem fazer sexo para conseguir doar sangue.

“No caso específico, o problema central está na janela imunológica, que é de 30 dias. As normas dos órgãos declaram inaptos a doar sangue os homossexuais que tiveram relações sexuais nos 12 meses antecedentes à doação.  Entretanto, o risco de infecção já seria afastado mesmo se o período de inaptidão fosse significativamente menor como, por exemplo, um ou dois meses”, disse Velloso.

“Portanto, concordo com os ministros do Supremo que já votaram pela procedência da Adin, no sentido de declarar inconstitucionais as atuais normas, pois é desproporcional fixar 12 meses sem relações sexuais para alguém estar apto a doar sangue quando o risco se limita apenas ao prazo da janela imunológica”, concluiu.

Para a advogada Luciana Munhoz, mestre em bioética, “a construção de normativas deve refletir o momento atual de avanço dos conhecimentos científicos e sociais”. Ela considera fundamental que os órgãos de saúde observem o princípio da Não-Estigmatização, previsto na Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos de 2005. “Não cabe ao Estado regulamentar as escolhas sexuais individuais”, disse Munhoz.

Também mestre em bioética, a advogada Thaís Maia considera as normas dos órgãos de saúde discriminatórias, “tendo em vista que prioriza destacar o comportamento sexual dos indivíduos, em vez de considerar a proteção adotada pelos candidatos à doação de sangue, de modo a eliminar potenciais doadores”. Segundo ela, essa política é inconstitucional, “na medida em que desrespeita a autonomia e a liberdade dos cidadãos”. (JV).

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