Brasil

Presidente da Embrapa defende a atuação estratégica da empresa

Presidente classifica empresa como uma ''Arca de Noé'', detentora de um banco com aproximadamente 120 mil amostras de plantas, animais e microrganismos que não podem ficar nas mãos da iniciativa privada

Correio Braziliense
postado em 14/01/2020 06:00

Presidente classifica empresa como uma ''Arca de Noé'', detentora de um banco com aproximadamente 120 mil amostras de plantas, animais e microrganismos que não podem ficar nas mãos da iniciativa privadaO presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Celso Moretti, se confessou aliviado com o fato de o presidente Jair Bolsonaro “felizmente” não incluir a autarquia no rol de empresas que serão privatizadas. Segundo ele, sua área de atuação é estratégica, de segurança nacional, e não pode estar fora das mãos do Estado.


A Embrapa é responsável pela preservação de recursos como as 120 mil amostras de plantas, animais e microrganismos que constituem a “Arca de Noé Brasileira”, segundo Moretti. “É uma questão de segurança nacional que vai garantir o futuro dos meus filhos, meus netos e meus bisnetos. Se a gente tiver uma doença ou uma praga séria na agricultura ou pecuária, e não tivermos o remédio para resolver isso, é lá que a gente vai buscar a diversidade biológica”, explicou, nesta segunda-feira (13/1), em entrevista ao CB Poder, uma parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília.

A caminho dos Emirados Árabes, Moretti considera as parcerias com o setor privado externo essenciais, pois além de captar recursos para investimento em pesquisa, são capazes de abrir portas para empresas privadas brasileiras. A seguir, os principais trechos da entrevista ao programa CB.Poder.


Quando o senhor assumiu, no fim de julho, o presidente Jair Bolsonaro falava de repotencializar a Embrapa. A ministra (Tereza Cristina, da Agricutura) queria alguém que pudesse ser um “trator” na Embrapa. E a FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) pedia um choque de gestão. Qual o balanço que o senhor faz da sua gestão?
Tínhamos 16 escritórios espalhados pelo país e fechamos 14. Várias ações foram incorporadas por unidades já em andamento. Implementamos um processo de aproximação com setor privado e dobramos o número de projetos com esse setor nos últimos cinco meses. É um conjunto de ações que vêm sendo colocadas em andamento e esperamos avançar em 2020.

Que parceria o senhor pode destacar com o setor privado?

A Embrapa assinou de 200 mil a 250 mil contratos com o setor produtivo. Assinamos com uma empresa francesa para estudar a conservação e a produção de maçã no Brasil e até com empresas de proteína animal, grandes produtoras no Brasil.

O senhor vai para os Emirados Árabes nesta semana. Qual é a agenda?
O Brasil saiu da situação de importador de alimentos para um dos maiores exportadores de alimentos, fibras e bioenergia. Para isso, investimos solidamente em pesquisa, e hoje não tem nenhum outro país no cinturão tropical com capacidade para isso. Durante muitos anos ficamos olhando para dentro do Brasil. A ideia é que a Embrapa sirva como uma ponta de lança para levarmos tecnologia de produção tropical, e carregarmos junto o setor privado. Estamos indo para fortalecer a parceria que iniciamos. Tentar captar recursos para investimento na pesquisa da Embrapa e também abrir possibilidades para o setor privado.

O senhor disse que eles (os Emirados Árabes) têm uma preocupação com segurança alimentar para o futuro, coisa que o Brasil não tem. Não é a hora de começar a ter?
É uma preocupação que todos os países têm que ter, porque nada mais é do que garantir alimentos em quantidade e qualidade, no momento adequado. O Brasil está numa situação muito confortável. Da década de 1970 até hoje, o trabalho de pesquisa na agropecuária possibilitou que tivéssemos uma redução de mais de 70% no valor da cesta básica. Hoje, o Brasil alimenta quase 1,4 bilhão de pessoas em todo o globo com a quantidade de alimentos, fibras e bioenergia produzida aqui. Essa é uma preocupação, por exemplo, no Oriente Médio, onde há condições mais drásticas de clima e de solo.

Se fosse eleger um problema futuro do agronegócio, qual seria? E como o equilibrar com o meio ambiente? O governo é muito criticado nessa seara.
Elegeria a sustentabilidade. O Brasil tem feito um trabalho é invejável do ponto de vista da sustentabilidade da produção agropecuária. Preservamos 63% do território. Depois do Código Florestal de 2012, 1/4 do território brasileiro está dentro das propriedades rurais. Não obstante, acho que temos um caminho para avançar nesse processo de sustentabilidade. Na questão do meio ambiente, o Brasil tem uma agricultura que utiliza, em grande medida, o plantio direto. Quer dizer que não remove o solo e não libera gases de Efeito Estufa. Outro ponto que sempre está na agenda é a questão dos agrotóxicos: segundo dados da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), estamos na 44ª de colocação no uso de agrotóxicos. São 3,4 quilos ou litros por hectare. As pessoas perguntam: ‘o Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos?’. Sim, porque é um dos maiores produtores de alimentos. Temos que ver o uso relativo, em quantidade de moléculas por área.

Qual o maior desafio de 2020?

A agricultura digital é um dos maiores. A questão da conectividade é algo que o Brasil ainda precisa avançar a passos mais largos: 75% das propriedades ainda não têm acesso à internet, enquanto 66% do território brasileiro têm acesso à internet, mas, na China, passa de 90%. O Congresso aprovou uma legislação para aumentar a conectividade, e entendo que isso vai ser um dos desafios a serem vencidos em 2020.

O brasileiro pode ficar despreocupado em relação à segurança com defensivos agrícolas?
A legislação brasileira preconiza a avaliação de três órgãos para liberar uma nova molécula no mercado. Passa pelo Ministério da Agricultura, pelo Ibama e pela Anvisa. É um processo minucioso, cuidadoso. O produtor tem a consciência de que o alimento que vai colocar na mesa do consumidor é o alimento que colocaria para sua família consumir.

Pela importância estratégica, há estudo para a privatização da Embrapa ou só a terceirização de algumas atividades?
Felizmente a Embrapa não foi incluída no rol de empresas que serão privatizadas pelo presidente. Acho que foi uma decisão acertada, porque é uma empresa pública que, na sua trajetória de 46 anos, deu muitas contribuições para o agro e ajudou a transformá-lo. Depois da reforma trabalhista, de novembro de 2017, tivemos a possibilidade de terceirizar algumas ações, como a mão de obra de campo e a mão de obra de laboratório.

A privatização poderia prejudicar a área de pesquisa e tecnologia no agronegócio?
Sim. Temos um banco genético que é a “Arca de Noé” brasileira, 120 mil amostras de plantas, animais e microrganismos. É uma questão de segurança nacional que vai garantir o futuro dos meus filhos, dos meus netos e dos meus bisnetos. Se a gente tiver uma doença, ou uma praga séria na agricultura ou na pecuária, e não tivermos o remédio para resolver isso, é lá que a gente vai buscar a diversidade biológica. Estando na mão do privado, pode simplesmente dizer: ‘isso aqui é meu, e eu não vou abrir mão’. É uma questão de segurança nacional, mais do que segurança alimentar. Mandamos 3,4 mil amostras para o principal banco genético do mundo, na Noruega. É estratégico estar na mão do Estado.

Como está o orçamento deste ano?
Garantimos um orçamento para 2020 muito similar ao que tivemos em 2019. Acho que, dadas as condições existentes, é muito positivo.

Quanto tem para pesquisa neste ano?
Em torno de R$ 300 milhões do nosso orçamento são destinados à pesquisa. Esse é o tamanho da nossa carteira.

O Congresso no final aportou quanto mais?
R$ 80 milhões.

Estão garantidos os recursos das pesquisas?
Mais seria melhor. É importante colocar que, apesar de termos recursos do Tesouro, a Embrapa vai atrás de recursos privados e de outros países. Como é o caso da missão aos Emirados Árabes.

* Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi 

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