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Saiba o que fazer caso você tenha tomado a cerveja Belorizontina

Médicos ouvidos pela reportagem explicam como o mono e o dietilenoglicol agem no organismo e o que pode ser alerta de intoxicação

Depois que a Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) confirmou contaminação por dietilenogligol e monoetilenogligol em três lotes da cerveja Belorizontina, produzida pela Backer, a apreensão entre os amantes da bebida aumentou. E as dúvidas se multiplicam: quem ingeriu a bebida e passou mal mas melhorou ou não apresentou nenhum sintoma ainda está em risco? É preciso procurar um médico?

 

Especialistas ouvidos pelo Estado de Minas apontam que as substâncias tendem a ser eliminadas do corpo em até sete horas, o que indica que quem consumiu a bebida há mais tempo já se livrou do composto tóxico. Os sintomas tendem a aparecer em até 48 horas depois da ingestão da cerveja contaminada, explicam. Mas “quem bebeu a cerveja há poucos dias precisa ficar atento”, diz o médico nefrologista Fabrício Augusto Marques Barbosa. E até o fabricante do rótulo apela: “Não bebam a Belorizontina”.

 

“Mal-estar, dor abdominal, diarreia e dor lombar persistentes podem ser sintomas de intoxicação. A pessoa ainda pode ter grande redução na quantidade de produção de urina, o que faz com que fique horas ou até dias sem urinar. Caso identifique esses sintomas, é importante procurar atendimento médico o quanto antes”, alerta.

 

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O nefrologista Vinícius Sardão Colares, diretor da Sociedade Mineira de Nefrologista, explica: “Temos poucos relatos de intoxicação pelo dietilenoglicol. E a grande maioria é relacionada a surtos por contaminação. O que podemos afirmar é que, ao serem ingeridos, os dois causam sintomas muito parecidos no corpo, como a. insuficiência renal.” Mas há diferenças na evolução dos quadros clínicos. O dietilenoglicol (DEG) geralmente leva a paralisia dos nervos do rosto, o que não ocorre no caso do outro composto, e ainda provoca intoxicação hepática, detalha o especialista.

 

Segundo Vinícius Sardão, embora não se saiba exatamente como funciona o mecanismo de toxicidade dessas substâncias dentro das células, estudos em ratos apontam que ambas são eliminadas do corpo em até sete horas após a ingestão. “A substância entra no corpo e logo é quebrada pelo fígado em subcompostos. Esses são eliminados pela urina, num processo que dura cerca de sete horas. Ela é eliminada em um período muito curto. E, por isso, os sintomas se desenvolvem tão rapidamente”, disse o especialista. 

 

Estudos apontam que cinco dias após a ingestão apenas 3% do dietilenoglicol são encontrados no organismo. Apesar do metabolismo rápido, as lesões são graves, pela ação de componentes tóxicos nos órgãos.

 

Os primeiros órgãos atingidos são o fígado e rins. “As lesões se agravam, mesmo depois de as substâncias terem sido eliminadas”, explica. Os sintomas aparecem em até 48 horas. Existem poucos casos com desenvolvimento de sintomas tardios e somente um depois de uma semana da exposição. “Mas isso foge da normalidade”, detalhou.

 

De qualquer forma, quem bebeu a cerveja da Backer há poucos dias e apresenta os sintomas de intoxicação descritos no início desta reportagem deve procurar atendimento médico o quanto antes, recomenda o nefrologista Fabrício Augusto.

 

A principal característica da intoxicação é a persistência dos sintomas. O especialista Vinícius Sardão diferencia a intoxicação da ressaca: “Quando você está de ressaca, você melhora ao longo do dia. Pessoas intoxicadas têm vômitos e náuseas sem melhora ao decorrer do dia”. Um sintoma específico da intoxicação por dietilenoglicol é a alteração na musculatura, principalmente, na região dos olhos. “A pessoa não consegue fechar os olhos, tem dificuldades para piscar. É como se os olhos só ficassem abertos. Também pode haver dificuldade na visão”, explicou. A orientação, nesses casos, é não esperar por mais um dia para procurar o hospital.

 

Ao anunciar a confirmação da presença de dietilenoglicol no sangue de quatro pacientes, em amostras de cervejas Belorizontina e em tanque da fábrica, a Backer, o delegado Tales Bittencourt citou estudo que aponta que a dose tóxica mínima é 0,14 miligrama por quilo de peso corporal e que faixa de letalidade varia entre 1 e 1,63 grama por quilo. Ou seja, há uma variação grande, que depende do organismo de cada pessoa. O médico Fabrício Augusto explica que o índice é estipulado a partir de outros casos de intoxicação no mundo.

 

Fabrício Augusto explica que a velocidade de absorção no corpo pode ser alterada por vários fatores: se a pessoa bebeu a cerveja acompanhada de comida ou de outro tipo álcool, se tem problemas funcionais nos rins e outros ligados a seu estado de saúde. “Depende do metabolismo de cada um. É difícil precisar a quantidade. Mas quanto maior a dose, maior a chance de efeito colateral”, acrescentou o nefrologista Vinícius Sardão.

Na segunda-feira, o Estado de Minas conversou com o advogado Maycon Rothéia, de 34 anos, que se espantou ao ver em sua geladeira cerveja do lote L2 1354, um dos três nos quais perícia da Polícil Civil detectou contaminação. As garrafas foram compradas no início de dezembro. “Comprei num supermercado no Bairro Funcionários, onde moro. Tomei quatro cervejas. Não tenho certeza se todas eram do mesmo lote. Bebi na primeira quinzena do mês passado”, contou. Outras garrafas que estavam em sua casa foram entregues pelo advogado à Vigilância de Sanitária de Belo Horizonte, como recomenda a saúde pública. Mas ficou o medo e o Maycon anunciou que procuraria um médico para fazer exames.

 

Para o nefrologista, um check up é recomendável, mas “não é necessário criar um alarde”. Como já foi explicado, a substância fica por cerca de sete horas no corpo. “Se a pessoa ingeriu, por exemplo, a bebida em meados de dezembro e não desenvolveu nenhum tipo de sintoma, não é um mês depois que eles aparecerão”, concluiu.

 

Outros casos

Em 2009, autoridades de Bangladesh encontraram vestígios do produto químico tóxico em um xarope de paracetamol que teria matado 24 crianças. Em novembro de 2008, bebês começaram a morrer na Nigéria após apresentarem febre e vômitos. As investigações revelaram que todos haviam tomado um medicamento chamado "My Pikin Baby", que continha dietilenoglicol. O envenenamento causou a morte de pelo menos 84 crianças entre dois meses e sete anos. O governo nigeriano localizou o dietilenoglicol em um revendedor de produtos químicos não licenciado, que o vendeu a um fabricante farmacêutico local. A substância também já provocou mortes na Nigéria, Argentina, Espanha e Índia.