Correio Braziliense
postado em 25/01/2020 04:05
Brumadinho, Caetanópolis, Curvelo, Pará de Minas e Paraopeba. Casas fechadas, comércio desativado e ares de comunidades- fantasmas acompanham o rastro de rejeitos de 310 quilômetros deixado na Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba, após o rompimento da Barragem B1, da Mina Córrego do Feijão, da Vale, em Brumadinho (MG). O desprendimento de mais de 10 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro, que hoje completa um ano, matou 270 pessoas. Há 11 corpos desaparecidos.
A tragédia devastou a natureza e as pequenas comunidades de tal forma que muitos preferiram ir embora, seja de áreas urbanas ou rurais, deixando animais e rebanhos à própria sorte, consumindo a água contaminada. Uma realidade que atinge de Brumadinho, onde ocorreu o rompimento, até Curvelo, onde os rejeitos foram detidos pelo lago da Usina Hidrelétrica de Retiro Baixo. Hoje será um dia de homenagem aos mortos e consolo às famílias atingidas em vários pontos do estado.
Na área do rompimento ainda se vê o rombo provocado pela ruptura da Barragem B1 e duas extremidades das ombreiras que apoiavam a estrutura nos montes. Abaixo, o caminho de destruição varreu vegetação, pedras maiores que caminhões e retorceu as estruturas de extração, separação e beneficiamento de minério. “Quando ocorreu o rompimento, os rejeitos não entraram imediatamente na calha do Ribeirão Ferro-Carvão, seguindo até o Rio Paraopeba. Era tanta energia que aquela massa foi se chocando em terrenos mais altos e recuava criando remansos por quase 10 quilômetros até o rio”, explica o tenente-coronel Alysson Malta, comandante das operações do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBBMG) em Brumadinho. As equipes da corporação estão na chamada Base Bravo. Salvaram 195 pessoas e buscam até hoje pelos 11 desaparecidos, condicionando a isso o final da missão.
Nas áreas onde os bombeiros esgotaram as buscas, cerca de 95% dos 270 hectares, a Vale faz obras de contenção de sedimentos para que as águas do ribeirão não levem mais sólidos para o Rio Paraopeba. Mais abaixo, seguindo um dos afluentes do ribeirão, está a primeira comunidade frontalmente atingida, o Bairro Córrego do Feijão, em Brumadinho. Na comunidade de casas simples e típica paz interiorana funcionou uma base do Instituto Médico Legal e em seu cemitério muitas vítimas foram enterradas.
Hoje, o lugarejo até lembra uma cidade-fantasma. Pessoas foram embora, comércio fechou e quem ficou quer ir embora por vários motivos. “Está muito difícil de continuar morando no Córrego do Feijão. A gente lembra dos helicópteros levando corpos de amigos sobre as nossas cabeças sem parar. Tem dia que falta luz. Tem dia que falta água. Uma porção de gente cansou e foi embora. Queria que a Vale comprasse minha casa para eu ir embora também”, comenta a dona de casa Marlene Gonçalves Ferreira, de 56 anos, que quer voltar para Goiás.
Até a professora do Projeto Casa Rosa, Giselle Cristiane Niza Sales, de 37, pensa em ir embora e abandonar a ação que busca trazer mais equilíbrio para a comunidade angustiada por meio de oficinas culturais. “Nunca saiu da minha cabeça a imagem da lama levando embora quem a gente ama. Meu marido chegou a trabalhar duas vezes na mina, imagina se estivesse lá? Quero ir embora. Acabou a alegria do Córrego do Feijão. Sem falar na poeira durante o período de seca, que faz mal para as crianças”, disse.
Na zona rural, várias propriedades atingidas perderam plantações e pastos. Sem poder usar da água subterrânea e da superficial por risco de contaminação, preferiram abandonar as propriedades, deixando cavalos, gado, cães e outros animais livres para consumir da água que verte dos rejeitos.
Tratamento
O leito do Ribeirão Ferro-Carvão desce após as comunidades para os últimos quilômetros até a foz no Rio Paraopeba. Faltando 400 metros para o encontro, um represamento construído pela Vale retém a água que é bombeada para uma estação de tratamento moderna. São vários processos de decantação, separação dos rejeitos por meio de produtos especiais e a retirada mecânica do acumulado. A água que volta ao Rio Paraopeba tem se apresentado abaixo do limite para turbidez (sólidos na água) do Conselho Nacional de Meio Ambiente. Contudo, segundo levantamento da Organização Não Governamental SOS Mata Atlântica, divulgado ontem, não há um trecho sequer do Rio Paraopeba com condições de consumo de suas águas devido à presença de contaminantes dos rejeitos e de metais pesados.
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