Correio Braziliense
postado em 14/02/2020 04:05
O jornalista Léo Veras, dono do site Porã News, foi assassinado ontem com 12 tiros de pistola 9 milímetros, enquanto jantava com a família, em Pedro Juan Caballero, cidade vizinha a Ponta Porã, em Mato Grosso do Sul. Conhecido por ter construído uma carreira denunciando a expansão do crime organizado e do tráfico de drogas na fronteira do Brasil com o Paraguai, a suspeita das autoridades é de que a execução tenha alguma conexão com as reportagens que fazia.
Veras ainda tentou fugir dos criminosos, que corriam no quintal de sua casa. Mas foi atingido nas costas e na cabeça por três homens encapuzados que desceram de um Jeep Cherokee, segundo o procurador Marco Amarilla.
“Foi esse o tiro que o acertou para matar”, explicou. O jornalista, que trabalhou em várias mídias digitais, tinha 15 anos de residência no Paraguai, com mulher e filhos paraguaios. O ataque ocorreu na presença deles e do sogro de Veras. “Por suas características, é um crime encomendado”, acrescentou Amarilla.
Em entrevista a um documentário produzido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Veras confirmou que recebia ameaças dos traficantes de drogas e sabia que seria morto pelo crime organizado. Chegou a confessar que não queria morrer com vários tiros — tal como aconteceu e é a praxe dos assassinatos cometidos por facções criminosas.
O secretário de Justiça e Segurança Pública de Mato Grosso do Sul, Antonio Carlos Videira, afirmou que o jornalista fazia denúncias constantes e publicava reportagens sobre o domínio do Primeiro Comando Capital (PCC) na região. Veras era paraguaio de nascimento, mas também tinha nacionalidade brasileira.
Autoridades dos dois países investigam o ataque. Nos últimos dias, de acordo com amigos e parentes, o jornalista estava triste e chegou a se despedir da mulher. Pessoas próximas afirmam que ele sabia que estava marcado.
“Sua relação com as autoridades e forças policiais era muito boa, mas certamente desagradava o crime”, acrescentou Videira.
Reações
A morte de Veras provocou reações de entidades que representam jornalistas e a imprensa. O presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Marcelo Träsel, informou que a entidade avalia mandar uma equipe para apurar o caso. “As autoridades sabiam que ele era monitorado ou ameaçado. Nós gostaríamos que as autoridades pudessem prevenir, mas, já que não conseguiram, que não deixem impune e cheguem até os responsáveis”, afirmou.
De acordo com Marcelo, em contato com pessoas próximas de Veras, a Abraji recebeu a informação de que ele estava preocupado com a fuga de presos, em Pedro Juan Caballero, há poucos dias. “Estava nervoso com uma fuga de presos, preocupado com isso porque achava que tivesse algum desafeto para se vingar dele”, completou Träsel.
Por nota, a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) também condenou o episódio e ressaltou as ameaças sofridas pelo profissional. “Em mais de uma ocasião, Veras relatou ter recebido ameaças de morte, em razão de seu trabalho jornalístico. As investigações sobre seu assassinato levam em consideração as ameaças frequentes, que indicam o exercício profissional do Jornalismo como motivação do crime. O Sindicato dos Jornalistas do Paraguai, em nota, denunciou que ‘grupos de criminosos tentam apagar a voz de jornalistas mediante as balas e a violência, com a cumplicidade de um Estado totalmente infiltrado pela máfia e pela narcopolítica”, criticou.
A Associação Interamericana de Imprensa (SIP) condenou o incidente em uma declaração e solicitou às autoridades do Paraguai e do Brasil “que trabalhem de maneira coordenada, exaustiva e urgente para descobrir a verdade, julgar e condenar os assassinos”.
Em uma série de reportagens, em 2017, o Correio alertou para a expansão do PCC na fronteira entre Brasil e Paraguai. Entre várias denúncias, mostrou que a organização criminosa “comprou” militares paraguaios para servirem de “mula”, sem serem detidos pelas autoridades brasileiras. Outro capítulo apontou que o PCC firmou “parceria” com o Hezbollah para o envio de drogas ao Oriente Médio e à Europa.
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