Correio Braziliense
postado em 06/03/2020 04:06
Subiu para 28 o número de mortes provocadas pelas chuvas fortes que atingiram a Baixada Santista. Os bombeiros trabalham nas buscas por desaparecidos em Santos, São Vicente e no Guarujá. A informação sobre as mortes foi divulgada ontem, numa rede social do Corpo de Bombeiros. O número de desaparecidos ainda não foi divulgado pela corporação. O último balanço da Defesa Civil informa que 42 pessoas estão desaparecidas.
A cidade mais atingida foi o Guarujá, que concentra o maior número de mortes. Santos e São Vicente também têm mortos e desaparecidos. De acordo com os bombeiros, o Guarujá tem até agora 23 mortos. Em Santos, foram três mortes confirmadas e, em São Vicente, duas.
Dados do Núcleo de Gerenciamento de Emergência da Defesa Civil do Estado de São Paulo indicam que, até as 4h da manhã de terça-feira, o acumulado de chuvas nas 12 horas anteriores no Guarujá foi de 282 mm; em Santos, de 218 mm; em Praia Grande, 170 mm; e em São Vicente, 169 mm.
Pesadelo
Os relatos dos sobreviventes da tragédia são dramáticos, como o do recauchutador Raphael Soares, de 22 anos. Ele lembra, a todo momento, dos gritos por socorro que ouviu na madrugada de segunda-feira. Com as próprias mãos, pedaços de madeira e o que mais encontrou pela frente, ele e mais de dez vizinhos foram os primeiros a resgatar vítimas dos deslizamentos na Barreira João Guarda, no Guarujá (SP), o local que mais concentrou vítimas das chuvas na Baixada Santista.
Ele lembra que estava tirando a água que estava na sua própria casa –– “na rua, chegava até a cintura” –– no momento que ouviu um barulho, parecido com um trovão. Um vizinho foi conferir o que ocorreu e voltou correndo, relatando que uma casa tinha caído.
“Falamos: ‘vamos subir’. Quando a gente olhou não era uma casa, nem duas: era tudo pedra, lama. Tinha ali mais de 70 casas”, estima. “A gente não tinha a dimensão do que era. Achamos que uma casa tinha caído e, quando vimos o estrago, ficamos sem reação. Foram cinco minutos de choque. A gente escutou um amigo nosso gritando ‘socorro, socorro, me ajuda, minha mulher, minha filha’”, conta. “A gente ajudou quem a gente enxergava. Quebrou telha no soco. Teve muita coisa que a gente fez que nunca fez na nossa vida”.
Desde o deslizamento, Raphael calcula ter conseguido dormir cerca de quatro horas e teve de deixar a casa temporariamente para se alojar na Escola Municipal Professora Dirce Valério Araújo.
Já o pedreiro Erick Araújo, de 20 anos, ajudou no resgate na Barreira mesmo com o pé fraturado, que agora está ainda mais inchado. “Só deu tempo de colocar um tênis e subir. Nunca pensei que um bagulho desses aconteceria aqui. Perdi até o meu primo. Como a gente iria abandonar quem a gente conhecia?”
Também na Barreira, o mecânico Jeferson do Nascimento Nogueira, de 26 anos, por ser mais baixo e pequeno, conseguiu entrar em um buraco para tirar um bebê de 3 meses. “Estava coberto de barro. Não tenho palavras. Foi Deus usando as nossas mãos”.
Morador do Morro do Macaco Molhado, também no Guarujá, o atendente de quiosque Wellington Sant’Ana, de 41 anos, também saiu de casa ao ouvir o chamado da vizinha Tathiana Gomes, de 25 anos, que acabou morrendo soterrada junto do filho Arthur, de 10 meses. “Cavamos, tiramos pedra, acabamos encontrando o bebê”.
Após ajudar a retirar o corpo, foi para casa e não encontrou a esposa e os filhos, deslocando-se para procurá-los na sogra. Após encontrar a família, decidiu voltar para dormir na própria residência sozinho, na encosta do morro.
Também abrigado na Escola Dirce Valério Garcia, Wellington está preocupado com a falta de moradia definitiva para a família, que inclui crianças de 9 meses e 3 e 4 anos. “Perdemos tudo, estamos esperando a ajuda vir de algum lugar. Como vai ficar agora com as aulas? Não temos lugar ficar, não temos nada, nem documento. Deixamos tudo para trás”.
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