Brasil

Profissionais de saúde do país também relatam medo diante da pandemia

Homenageados pela população ao redor do mundo, profissionais de saúde do país relatam desgaste e apreensão diante da pandemia

Correio Braziliense
postado em 24/03/2020 06:00

Profissionais do Centro de Saúde Capoeiras, em Florianópolis: principal forma de colaborar é manter o isolamento socialO mundo vive uma guerra com um inimigo comum e invisível. E os principais soldados contra o novo coronavírus (Covid-19) são os profissionais da área da saúde. “Nós somos o front dessa batalha”, afirma a presidente da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal (SIDF), Heloisa Costa Ravagnani, se referindo a médicos, enfermeiros, técnicos, entre outros.

Apesar de serem corajosos e heroicos, eles também são seres humanos e compartilham da enorme sensação de medo diante dessa pandemia. “Particularmente, vivemos um momento de estresse tão grande que sabemos que temos de ser fortes lá fora, mas a carga de trabalho triplicou, a minha e a de todos os profissionais da saúde, e estamos completamente desgastados emocionalmente”, desabafa a médica.

A previsão, segundo o Ministério da Saúde, é que ocorra uma "disparada" dos casos do novo coronavírus no Brasil em abril com queda somente em setembro. Para agradecer quem ajuda a salvar vidas, a população brasileira aplaude os profissionais da saúde nas janelas de casas e apartamentos, por volta das 20h. A iniciativa foi motivada por campanha nas redes sociais embalada pela hashtag #AplausosNaJanela.


 “A nossa percepção era de que a população não reconhecia o nosso trabalho, achava que era obrigação. Vínhamos de uma relação ruidosa com a população por uma série de desgastes com o sistema de saúde público”, comenta Heloisa Ravagnani.

“É emocionante ver esse reconhecimento. Traz uma sensação de união, uma recompensa que nos incentiva a continuar nessa batalha”, completa a infectologista.


Vulnerabilidade


São poucas as informações sobre o novo coronavírus, apesar de haver pesquisas por todo o mundo em busca de respostas. Sabe-se que, de forma geral, as chances de desenvolver uma doença viral e com sintomas mais intensos são maiores quanto maior for a carga viral a qual se for exposto. A classe da saúde, portanto, está nesse grupo.

“Somos muito mais expostos e tão vulneráveis quanto qualquer um. Nós também temos nossos medos, nossos pais idosos, filhos pequenos”, explica a infectologista Heloisa Costa Ravagnani. Hospitais em Brasília, Rio e São Paulo já registraram infecções da Covid-19 entre seus profissionais de saúde.

Na Itália, foi criado um site em homenagem aos “mortos em combate”. O país havia perdido 17 médicos pela Covid-19 até a última sexta-feira e contabilizado 2.629 profissionais da saúde contaminados até terça passada. Além do reconhecimento e das homenagens, a principal forma de colaborar  é manter o isolamento social.

“O isolamento é fundamental para darmos conta da demanda. Na hora que virar um caos, os casos vão subir, inclusive, entre os profissionais de saúde”, alerta a infectologista. Com o intuito de fortalecer a recomendação, os profissionais de saúde de vários países compartilharam fotos com a frase “Nós estamos aqui por você, fique em casa por nós".

A pediatra Vanessa Corvino, que atende na emergência do Hospital Regional de Planaltina e do Hospital Daher, no DF, não esconde o receio maior  por também ser diabética. “A gente fica mais apreensiva até porque a nossa carga de informações ruins é maior do que do restante da população. Mesmo sabendo que os grupos de risco são pessoas mais idosas, há vários relatos de médicos jovens que ficaram doentes”, comenta a médica de 29 anos.

 

 

"O Bolsonaro apareceu na coletiva com a máscara N95, mas eu não tenho”, diz médico

 

Homenageados pela população ao redor do mundo, profissionais de saúde do país relatam desgaste e apreensão diante da pandemia“A gente dorme e acorda com a sensação que está em um pesadelo”, descreve André Costa Dias, médico da família e comunidade do Centro de Saúde Capoeiras, em Florianópolis. “Entendo que não temos os recursos todos, mas estamos com medo. Eu não tenho nem a máscara N95 - a mais indicada aos profissionais de saúde por evitar o contágio de gotículas. Usamos uma máscara mais simples. O Bolsonaro apareceu na coletiva com a N95, mas eu não tenho”, reclama.

 

O médico André detalha a dura rotina que ele e a equipe enfrentam na comunidade situada em uma área de vulnerabilidade social, que contava com metade dos profissionais necessários. Com a chegada da pandemia, as coisas se complicaram. As consultas eletivas foram canceladas para dar conta dos atendimentos relacionados ao novo coronavírus.

 

O mais grave, segundo ele, é a falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para os profissionais de saúde, durante os atendimentos. Para os médicos que lidam com pacientes com suspeitas ou confirmação da Covid-19, é recomendado usar máscara, luvas, óculos de proteção e capote (avental), além de fazer a higienização das mãos com frequência, ou seja, lavar com sabão ou álcool em gel sempre, antes e depois da consulta com cada paciente.

 

“Claro que os postos de saúde têm de estar do lado da população, mas o mínimo é ter os Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para todos os profissionais de saúde”, cobra André. Segundo o médico, o ideal seria usar um EPI para cada paciente que busque por atendimento relacionado ao novo coronavírus, por ser descartável. “Mas usamos o mesmo EPI o dia inteiro, porque sabemos que vai faltar”, lamenta.

 

André agradece os aplausos da população nas janelas, mas aproveita para mandar um recado. “A atitude é legal para caramba. Mas sabemos que as condições nos postos de saúde vão continuar as mesmas, isso não pode ser esquecido. O mesmo pessoal que bate palmas aos profissionais de saúde tem que lembrar de cobrar por mais investimento no SUS (Sistema Único de Saúde) no futuro.”

 

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags