Correio Braziliense
postado em 25/03/2020 04:35
O novo coronavírus obrigou brasileiros a ficarem dentro de casa para conter a pandemia que infecta um número crescente da população. Mas há quem não consiga se isolar, pelo menos não no país. Brasilienses que viajaram para fora antes das medidas restritivas impostas pela Covid-19 lutam para retornar. De longe, enfrentam o medo pela doença e a incerteza pelo que pode acontecer nos próximos dias.
É a realidade do casal Gilberto Oliveira Netto, 61 anos, e Elaine Vitorino Fernandes, 56. Moradores do Lago Sul, eles viajaram à ilha da Polinésia Francesa para comemorar aniversário duplo. Ambos nasceram em 11 de março. A volta estava marcada para ontem, mas o voo foi cancelado e não há previsão de retorno ao Brasil. “Somos um grupo com cerca de 50 pessoas, entre brasileiros, argentinos, uruguaios e outros, que chegou ao Taiti via Chile e Ilha de Páscoa. Com o fechamento da fronteira pelo Chile, nosso voo foi cancelado”, diz o servidor público.
Uma gerente de companhia aérea informou ao casal que estava tentando conseguir um voo para a próxima sexta-feira ou para sábado. “Mas ela disse que tinham que negociar com o governo do Chile. Depois, nos passou que não tinham conseguido autorização e que não havia outra alternativa”.
Gilberto e Elaine estão hospedados em um apartamento de aluguel por aplicativo e convivem com uma realidade bem diferente da que esperavam quando agendaram a viagem. O governo local do Taiti decretou a necessidade de uma autorização especial para que a população saia de casa e barreiras policiais fazem bloqueio em alguns locais. “Temos total consciência de que o Chile está no direito de proibir a entrada de estrangeiros no país, mas permitir o trânsito, assim como as escalas de voos com destino a outros locais, é uma necessidade humanitária”, avalia.
Os pais e os três filhos do casal estão em Brasília. “Temos conversado bastante com nossa família, que está bem, e isso nos acalma. Mas o sentimento agora é de uma angústia muito grande por não poder fazer nada e de revolta pela falta de respostas da companhia aérea”, desabafa.
Confinado no navio
Também há quem passe o isolamento em alto mar. O especialista em segurança pública Leonardo Sant’Anna, 50, embarcou em um cruzeiro em 5 de março para um projeto que organiza há 14 anos, no qual troca experiências sobre a área de atuação em diversos países. Essa edição, no entanto, está sendo marcada pela dúvida. “Depois do primeiro porto, em Omã, nós já começamos a ter uma série de incertezas. Passamos pelo Mar Vermelho e, nesse momento, tomamos conhecimento do fechamento total das fronteiras, principalmente da Europa. Então foram 13 dias completos de navegação, ininterruptos, confinado no navio”, explica.
Leonardo conviveu com muitas mudanças. As fronteiras não eram fechadas simultaneamente. “A cada instante nos falavam um novo itinerário, uma nova parada. Até o momento em que disseram que a gente não pararia em nenhum ponto, há cerca de seis dias”, lembra o morador de Brasília.
A primeira sensação foi de frustração pelos planos incompletos. A dificuldade de comunicação com a família também contribui para a angústia. “O medo aumenta pela pandemia e por outros motivos. E a gente acaba transferindo parte disso para os familiares. Quem está nos aguardando permanece em uma condição de incerteza muito grande, porque os dados sobre o coronavírus vão chegando de maneira genérica, então não sabem o que está acontecendo com a gente. É um medo duplo, de quem está aqui e de quem está no Brasil”, considera.
Apesar da situação, ele mantém a esperança de voltar a pisar firme na capital em breve, encontrando familiares e amigos. “Vamos sair dessa”, crê.
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