Correio Braziliense
postado em 10/04/2020 04:03
Ainda recente, a Covid-19 fez com que pesquisadores de todo o mundo partissem em busca de um tratamento efetivo contra a pandemia. No Brasil, há uma série de debates sobre a real eficácia de um medicamento específico: a cloroquina. A fim de estudar a fundo as possibilidades de tratamento da droga, hospitais de referência no Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (Proadi-SUS) se uniram para formar a Coalizão Covid Brasil, que avaliará opções de medicações para pacientes infectados com o novo coronavírus. Em uma das pesquisas, o foco será tratar casos leves com hidroxicloroquina, alternativa defendida nos discursos do presidente Jair Bolsonaro. O prefeito de São Paulo, Bruno Covas, autorizou, ontem, o uso da cloroquina na rede municipal de saúde.
O objetivo dos estudos realizados pela Coalizão Covid Brasil é verificar se o uso da cloroquina pode, de fato, melhorar o quadro clínico do paciente infectado. A pesquisa será aplicada em 1,3 mil pacientes positivos para a Covid-19 e que fazem parte do grupo de risco. Metade do grupo receberá o medicamento e a outra metade, não, de forma a conseguir mensurar o real efeito da substância. O diretor do Centro Internacional de Pesquisa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Álvaro Avezum, explica que a medicina ainda não tem informação suficiente para recomendar ou não o uso de hidroxicloroquina no tratamento contra o novo coronavírus. “Hoje, nós temos essa dúvida. Quando você tem dúvida, você conduz estudos”.
Sob pressão
O médico Luiz Vicente Rizzo, diretor superintendente de pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein, afirmou, ontem, que as instituições têm sofrido pressão para ampliar o uso da hidroxocloroquina em pacientes com Covid-19. “Estamos na época da medicina BBB, feita por votação. Medicina e pesquisa de rede social. Você não consegue mais não dar cloroquina para um paciente meio grave. A família pressiona e, se você não der, no dia seguinte você não é mais o médico”, disse, em entrevista à Folha de S.Paulo.
Também ontem, o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, anunciou que a Secretaria Municipal da Saúde da cidade incluirá a droga como tratamento nos hospitais. Ele afirmou que o medicamento poderá ser indicado se houver prescrição médica e se o paciente concordar com o tratamento. O remédio foi incluído no protocolo oficial da Secretaria Municipal de Saúde.
O grupo Coalizão Covid Brasil é formado por especialistas dos hospitais Oswaldo Cruz, Albert Einstein, Sírio-Libanês, HCor e Moinhos de Vento.
*Estagiária sob a supervisão de Andreia Castro
Três perguntas para
Álvaro Avezum, cardiologista, diretor do Centro Internacional de Pesquisa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e um dos coordenadores dos estudos da Coalizão Covid Brasil
Já existe estudo científico que comprove ou refute os benefícios da hidroxicloroquina?
Neste momento, nós estamos no meio de uma pandemia e temos casos que internam, casos que vão para a UTI (Unidade de Tratamento Intensivo), casos que vão para a ventilação mecânica e alguns casos com evolução desfavorável. Então, temos, no momento, estudos que chamamos de Estudos Mecanísticos ou de pesquisa básica. Essa pesquisa não confirma se nós devemos ou não utilizar hidroxicloroquina ou azitromicina. Na melhor das hipóteses, mostra que algum resultado preliminar que aponta para benefícios, mas não confirma.
É possível tratar pacientes com base nos estudos existentes?
Não. Temos incerteza quanto à eficácia e segurança das intervenções. Eu não estou falando só de hidroxicloroquina e de azitromicina, todas as propostas do que deve funcionar estão sendo testadas em vários países e, neste aspecto, o Brasil tem pioneirismo. Nossa pesquisa da Coalizão Covid Brasil envolve seis estruturas hospitalares e está, de maneira abrangente, avaliando pacientes internados, pacientes internados em UTI, pacientes internados em UTI e que estão evoluindo no respirador e pacientes mais graves. Além disso, há o projeto para pacientes que não estão hospitalizados, que deve ser iniciado no início da próxima semana. São pacientes que têm a suspeita forte, ou a confirmação, mas não tem gravidade para justificar uma internação. É isso que a nossa pesquisa vai avaliar com hidroxicloroquina.
O que pode ser feito enquanto não há posicionamento definitivo da sociedade médica?
Hoje, não dá para ter uma recomendação clara de usar ou não usar, nós não temos dados para uma recomendação rotineira. Precisamos do estudo. Porém, decisão médica é uma situação na qual tem um médico e um paciente, que vai levar em conta o quadro clínico desse paciente, a conduta, a literatura disponível e, obviamente, uma conversa com a família. Isso é uma decisão médica e a decisão médica é individual. Ela leva em conta todos esses fatores, mas não pode deixar de levar em conta, também, o nível de evidência científica até o momento. Então, a recomendação hoje é: precisamos terminar rápido essa pesquisa para dizer à população, à classe médica e ao governo se usar ou não usar. No momento, aguardem o resultado da pesquisa.
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