Brasil

Segunda onda de contágio causa temor e mobiliza especialistas

Avanço da infecção após o estágio inicial e possível repetição de casos de pacientes com a Covid-19 preocupam especialistas. Enquanto estudos não apresentam conclusões, recomendação é para manter o distanciamento social

Correio Braziliense
postado em 20/04/2020 06:00

O trânsito de pessoas é apontado como o principal fator de risco para o aumento da ocorrência da doençaEnquanto alguns países se fecham para achatar a curva de casos do novo coronavírus, outros retomam a rotina que viviam antes do surgimento da doença. No entanto, nenhum deles está livre da Covid-19. Sem vacina e medicamento com eficácia comprovada, nações que superaram a primeira onda de contágio temem enfrentar uma segunda. Especialistas ouvidos pelo Correio relacionam esse desdobramento da epidemia com o fim do isolamento social, a abertura de fronteiras e a falta de conhecimento das características do vírus — como o sistema imunológico reage a ele. De acordo com infectologistas, o Brasil, apesar de ainda aguardar o primeiro pico de casos da doença, não está a salvo de um segundo estágio.

 

Valéria Paes, infectologista e integrante da diretoria da Sociedade de Infectologia do Distrito Federal, explica que a partir do momento em que se relaxam as medidas, automaticamente, começam a acontecer novos casos. “Alguns países estão tentando voltar à vida ‘normal’. Nessa tentativa, passam por esse desafio”, comenta. A especialista acrescenta que a nova onda de infecções pode se originar também com a abertura de fronteiras.

 

Werciley Junior, coordenador da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do grupo Santa Lúcia, explica que a primeira onda pode também ser conhecida como etapa de massa, pois, se não fosse controlada, infectaria todo mundo. “Quando se faz uma medida como o isolamento, restringe-se a evolução dessa onda e a intensidade dela. No entanto, não se elimina o vírus, mas se diminui a capacidade de propagação dele. Quando se libera as pessoas do isolamento, tem-se uma segunda onda”, explica. O médico esclarece que, como todos são suscetíveis ao vírus, a segunda onda contaminaria as pessoas poupadas na primeira.

 

A China, epicentro da Covid-19, é um dos exemplos de países que se preocupam com uma nova onda de contágio. A segunda leva de infectados pode ser reflexo da abertura de fronteiras somada ao relaxamento das medidas de contenção. Em 19 de março, o país asiático não registrou nenhum novo caso local da Covid-19. No entanto, verificaram-se 34 ocorrências de infectados que vieram do exterior.

 

Coreia do Sul e Japão também voltaram a registrar novos casos. A ilha japonesa de Hokkaido é um exemplo. Após ver o número de casos cair, a região suspendeu o estado de emergência e, 26 dias após a medida, teve de retomar o alerta por causa da nova onda de contágio.

 

Imunidade

 

O infectologista Leandro Machado acredita que um dos pontos centrais do problema é a falta de conhecimento sobre a reação do sistema imunológico dos infectados diante do vírus. “Não sabemos o tempo de imunidade de quem se infectou. Não sabemos se o vírus causa uma imunidade permanente ou uma imunidade prolongada. A gripe, por exemplo, tem uma mutação no vírus, então a gente acaba tendo de se vacinar todo ano”, explica.

 

De acordo com os especialistas, acredita-se, até o momento, que uma pessoa que entrou em contato com o novo coronavírus não se contaminará uma segunda vez. No entanto, isso pode mudar, pois o conhecimento sobre a doença ainda é novo e incerto. “Temos que lembrar que estamos analisando a doença há quatro meses, um período curto. Nesse início, ainda não temos comprovação de que uma pessoa infectada pode se contaminar novamente. Mas, às vezes, esse paciente infectado anteriormente pode contrair o vírus depois de um ano ou um período mais longo, que ainda não estudamos”, ressalta. 

 

Liberação gradual para retomar atividades

 

Com tantas incertezas e sem uma solução farmacológica, uma das saídas é a liberação escalonada, na qual as pessoas voltam a se expor lentamente, ganhando, aos poucos, proteção contra a infecção. O infectologista Werciley Junior explica que, se todos voltarem à rotina de uma vez, poderemos ver o sobreuso do sistema de saúde. “A ideia de fazer o isolamento é justamente evitar sobrecarregar esse sistema. Se voltarmos todos de uma vez, isso pode acontecer”, avalia. O médico explica que seria necessário fazer uma imunização da população de forma lenta. Como a infecção não é tão leve quanto outras, não é possível que todos se contaminem ao mesmo tempo e se imunizem dessa forma.

 

Para ajudar a frear uma possível segunda onda de casos, máscaras têm sido recomendadas. Apesar de a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmar que o “uso de máscaras não é necessário para pessoas que não apresentem sintomas respiratórios”, alguns países têm aconselhado a utilização do equipamento de proteção individual. O Brasil é um deles. O Ministério da Saúde incentivou a fabricação de máscaras de pano para que as pessoas possam reutilizar. Alguns estados e municípios do país tornaram obrigatória a proteção facial nas ruas.

 

Pesquisadores acreditam que o mundo conviverá com o vírus durante uma longa fase. Alguns defendem que as medidas de distanciamento social sejam adotadas de forma intermitentemente até 2022. A infectologista Valéria Paes ressalta que, de qualquer forma, sempre será necessário reforçar as mesmas medidas de prevenção. “São aprendizados que devem permanecer. Devem ficar cristalizados na cultura de todos. Lavar sempre as mãos, ter álcool em gel na bolsa. Se estiver doente, não visitar pessoas idosas, não ir trabalhar.” (MEC). 

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