Brasil

Liberada, mas com restrição

Conselho Federal de Medicina diz a Bolsonaro que não há evidência de benefício da hidroxicloroquina, mas autoriza prescrição por médicos em casos leves da Covid-19. Substância não poderá ser utilizada de forma preventiva e profissionais deverão explicar riscos

Correio Braziliense
postado em 24/04/2020 04:03
Hidroxicloroquina não ganhou recomendação do Conselho de Medicina. No entanto, órgão regulador permitiu receita em 3 casos


Mesmo sob os holofotes e incorporada ao vocabulário dos brasileiros, a hidroxicloroquina não ganhou a recomendação do Conselho Federal de Medicina (CFM) para compor o tratamento de pacientes internados com Covid-19. O órgão disse “não haver evidências científicas” para protocolar o uso, mas liberou a substância em condições específicas. A atualização foi discutida, ontem, em reunião com o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Nelson Teich, no Palácio do Planalto.

O presidente do CFM, Mauro Luiz de Britto, explicou que, apesar de ser uma droga amplamente utilizada para tratamento de outras doenças há 70 anos, não existe, no caso da Covid-19, estudo randomizado, ou seja, quando se analisa a eficiência do medicamento comparando um grupo que fez uso dele e outro que não fez. “O que estamos fazendo é dar ao médico brasileiro o direito de, junto com seu paciente, em decisão compartilhada com seu paciente, utilizar essa droga. É uma autorização. Não é recomendação”, disse Britto.

Esta decisão partiu de estudos observacionais que, apesar de não terem alto valor científico, servem como base em momentos de emergência de saúde, como é o caso da pandemia. “A opção foi dar um pouco mais de valor ao aspecto observacional de vários médicos sérios, que têm usado essa droga e relatado bons resultados. Em outra situação, o CFM não liberaria o uso da droga, a não ser em caráter experimental”, explicou.

Antes, o Ministério da Saúde já havia emitido uma orientação, focando apenas nos casos mais graves de infectados pelo novo coronavírus. Agora, a substância foi liberada pelo CFM mediante três situações específicas. Quando o paciente está em estado grave, respirando por aparelhos em uma UTI e já com lesão pulmonar identificada. Também está permitida a aplicação em pacientes leves, desde que descartada a possibilidade do paciente estar infectado por influenza A ou B, dengue, ou H1N1. E, como última alternativa, a aplicação em pacientes com sintomas mais severos de Covid-19, quando o doente procura o hospital.

Nos três casos, a autorização do paciente ou de familiares é obrigatória. “É uma decisão compartilhada e o médico é obrigado a explicar para o paciente que não existe nenhuma evidência de benefício do uso da droga e que a droga pode também ter efeitos colaterais importantes”, disse Britto.

Em coletiva de imprensa sobre as atualizações de ações de combate ao novo coronavírus, o ministro Nelson Teich reiterou a fala do presidente do CFM. “A recomendação vai acontecer –– seja com a hidroxicloroquina, seja com qualquer outro medicamento –– no dia que a gente tiver uma evidência científica clara de que (o medicamento) comprovadamente funciona”, garantiu.

O uso da hidroxicloroquina foi defendido publicamente pelo presidente Bolsonaro como tratamento para a Covid-19 e alternativa para justificar a flexibilização de medidas de contenção social. A cloroquina é usada para tratar doenças como malária, lúpus e artrite. O medicamento não pode ser manipulado sem indicação médica e precisa ter a dosagem específica para cada caso. Sem isso, os efeitos colaterais podem prejudicar o organismo e até levar à morte.

Pesquisa
Mais de 500 ensaios clínicos estão sendo estudados atualmente na tentativa de achar um tratamento para o novo vírus. Grupos de pesquisadores brasileiros têm unido esforços para avançar nos estudos que certifiquem a eficácia do uso da medicação. Uma das iniciativas que estudam alternativas de tratamentos contra o coronavírus é a Coalizão Covid Brasil.

Hospitais de referência que incorporam o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (Proadi-SUS) tocam cinco projetos de pesquisa, sendo três para avaliar pacientes em alas hospitalares e unidades de terapia intensiva, um para avaliar o seguimento um ano após a alta e um para avaliar pacientes não hospitalizados com diagnóstico positivo para a doença.

Na pesquisa voltada à análise dos efeitos da hidroxicloroquina, o foco é tratar casos leves com a substância, verificando se o uso interfere no quadro clínico com o intuito de reduzir a internação. São monitorados 1,3 mil pacientes: metade receberá o medicamento e a outra metade, não, de forma a conseguir mensurar o real efeito da substância.

A estimativa do Conselho de Medicina é de que em dois meses o mundo tenha respostas mais sólidas sobre o que funciona para combater a doença.


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