Brasil

''Vírus é mais veloz do que testagem'', diz Emerson Gasparetto

Confira entrevista com o vice-presidente da área médica da Dasa

Correio Braziliense
postado em 04/05/2020 06:01


Qual o impacto do número de diagnósticos da Covid-19?

Hoje, a gente não consegue ter dados tão apurados da rapidez e da regionalidade da evolução da doença. Temos a questão de subnotificação, e o Ministério da Saúde tem sido muito claro em relação a isso. Se eu começo a ter uma região do país com muito diagnóstico, eu sou mais agressivo no isolamento dessa região para conter essa escalada, porque o crescimento da doença é exponencial. Se a gente vê alguns locais que estavam começando a crescer muito rápido, onde o isolamento foi efetivo, a curva se abrandou. Então o teste é a única ferramenta que eu tenho, hoje, para saber se tem mais ou menos doente, onde ele está, que perfil esse doente tem, se a doença é mais letal em A, B, C ou D.


Ou seja, antes de se falar em afrouxamento de isolamento, é necessário fazer mais testes?

Saiba Mais

Exato, através do diagnóstico. Isso estou falando nesse momento, lembrando que numa epidemia ou numa pandemia são fases, e que em cada etapa da progressão da doença, a decisão é uma. Vai ter um momento que fazer o diagnóstico não vai ser o mais relevante, o mais relevante vai ser avaliar a imunidade da população como um todo. Para frente, precisaremos entender se já não temos um percentual razoável da população que foi exposta ao vírus e tem uma imunidade. Esses pacientes têm um risco praticamente ínfimo de voltar a ter infecção, são basicamente imunes. Estamos na fase de fazer diagnóstico e evitar a escalada da curva. Ainda estamos na base da montanha e a gente tem tido sucesso, com algumas exceções, em alongar essa base da montanha.

O que pode atrapalhar?

Além do tamanho continental do Brasil, nós temos disparidades socioeconômicas. A doença chegou nas classes mais altas, que eram as pessoas que tiveram viagem ao exterior ou contato com pessoas que tiveram viagem ao exterior. Quando iniciamos a quarentena em alguns locais, obviamente, essa é a classe que consegue mais facilmente respeitar a quarentena. Uma coisa que tem que ter muito cuidado é que tem dois países diferentes aí dentro. E se a gente tiver um afrouxamento descontrolado do isolamento e essa doença chegar de forma agressiva nas comunidades, onde se tem uma concentração populacional maior ou que tem mais habitantes por casa, você tem sim um risco de crescimento muito rápido da doença nesses locais. Então, esse ponto socioeconômico é relevante. É a população que mais sofre com isolamento, porque às vezes tem um emprego informal ou ate perdeu o emprego, é a população que também potencialmente mais vai sofrer se for exposta à doença de forma exponencial. Se a doença chegar nessas comunidades de forma muito forte, ela vai fazer uma curva exponencial, porque o risco de contágio é maior.


De que forma a iniciativa privada e a independente conversam com o SUS?

Temos visto muita oferta de ajuda. Iniciativas surgindo de empresas privadas, de famílias apoiando financeiramente o combate à crise. É impressionante como a gente tem visto iniciativas bacanas da saúde suplementar e entidades, da sociedade como um todo, do Brasil apoiando o SUS. Há hospital de campanha, na maioria das capitais, em parceria com hospitais privados ou com grupos e entidades de saúde privadas. A gente, por exemplo, montou junto com o Governo do Distrito Federal uma expansão de leitos e CTI em Brasília. A Dasa tem uma responsabilidade como empresa em apoiar o governo nesse momento. Não é um desafio fácil. 

Há outras iniciativas?

A gente tem uma capacidade de fazer 4 mil exames por dia. Estamos montando com o governo um laboratório para fazer de 30 a 50 mil exames por dia. O governo tem maior facilidade em ter acesso a esses equipamentos, a trazer esses equipamentos para o Brasil. E a Dasa tem facilidade maior em ter time para operar esses equipamentos e montar rapidamente a infraestrutura e o know-how técnico. Essa parceria mostra o que cada um pode fazer de melhor. Se a gente olhar qual é a capacidade atual do governo, do SUS, de processamento de exames e para quanto vai, geraremos muito lucro para a sociedade. No final desse projeto, esses equipamentos do governo vão ser destinados para entidades, laboratórios do governo. Ou esse laboratório pode até ser o embrião do Center of Diseases Control brasileiro, CDC brasileiro, que hoje não é uma realidade no país.


Somos dependentes de outros países. Esse momento vai nos levar a rever essa estratégia?

Sim. É muito difícil dizer que esse é o momento para pensar nisso, temos um inverno longo para passar ainda, mas, sem dúvida, não acho que é o Brasil. A população do planeta como um todo viu o caminho que a gente estava indo, da concentração da produção de alguns itens essenciais em alguns países. E, agora, a gente está na situação que a gente está. A gente tinha um carregamento muito grande de exames de sorologia que estava para chegar e que, por questões de testes falsos na China, o país segurou a exportação. De forma geral, os testes de sorologia foram afetados. E a gente não tem outra opção. As outras produções vêm do EUA e, provavelmente, não teremos acesso até o início de junho. É uma realidade, mas agora não há muito o que fazer. Os países vão repensar a sua estratégia de produção e logística de itens essenciais, e a saúde é uma área essencial, sem dúvida.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags