Brasil

Brasil continua indicando cloroquina, mesmo após OMS interromper estudos

O Ministério da Saúde afirmou que o protocolo para uso precoce da substância não será modificado e que estudo desaconselhando prescrição, publicado na revista científica The Lancet, não serve de parâmetro

A indicação para o uso de cloroquina e hidroxicloroquina no tratamento de infectados pelo coronavírus, incluindo casos leves, continua valendo no Brasil mesmo após Organização Mundial da Saúde interromper os estudos sobre as substâncias. Segundo o Ministério da Saúde, a publicação feita na revista científica The Lancet, desaconselhando a prescrição após avaliar os efeitos em 96 mil pacientes, não serve de parâmetro. 

"Não se trata de ensaio clínico, é apenas um banco de dados coletados de vários países. Isso não entra no critério de estudo metodologicamente aceitável para servir de referência para nenhum país no mundo, nem para o Brasil", afirmou a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Mayra Pinheiro, completando que, sem padrões como dosagem, tempo de utilização e avaliação de outros medicamentos usados no tratamento, os dados apresentados pelo The Lancet "nos faz refutar qualquer possibilidade de citar esse estudo como referência para o Brasil recuar na sua orientação de respeitar autonomia médica."

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O estudo, publicado na sexta-feira (22/05), observou 96.032 pacientes internados em 671 hospitais de seis continentes, e mostrou que as pessoas tratadas com os medicamentos apresentavam maior risco de morte quando comparadas àquelas que não receberam a substância. A idade média dos pacientes, internados entre 20 de dezembro de 2019 e 14 de abril de 2020, é de 53,8 anos. 

"Nós fomos incapazes de confirmar qualquer benefício da cloroquina ou da hidroxicloroquina em resultados de internação pela covid-19. Ambas as drogas foram associadas à diminuição de sobrevivência dos pacientes internados e a um aumento da frequência de arritmia ventricular quando usadas no tratamento da covid-19", conclui o estudo liderado pelo professor Mandeep Mehra, da Escola de Medicina de Harvard.

Após a divulgação da revista, a Organização Mundial de Saúde (OMS), decidiu paralisar um estudo sobre o uso da hidroxicloroquina para pacientes com coronavírus. Segundo o diretor-geral, Tedros Adhanom Ghebreyesus, haverá agora uma avaliação sobre o medicamento, para se decidir se os testes serão retomados ou devem ser interrompidos de modo permanente.

"O Grupo Executivo (da OMS) implementou uma pausa temporária no braço com hidroxicloroquina dentro do Solidarity Trial, enquanto os dados são revisados pelo Conselho de Monitoramento da Segurança dos Dados", informou Ghebreyesus em coletiva de imprensa desta segunda-feira (25/05). 

Questionada sobre uma possível reavaliação do Ministério da Saúde, considerando a nova posição da OMS, a secretária Mayra foi enfática: "Estamos muito tranquilos a despeito de qualquer instituição, entidade internacional cancelar o seus estudos sobre a medicação, estudos de segurança. Nós seguimos acompanhando todos os estudos no mundo. Já temos um banco de informação de 216 protocolos sendo usados no mundo em países como Turquia, Estados Unidos, Índia inclusive para uso profilático. Nós fizemos orientação para o uso precoce", disse. 

Segundo Mayra, o posicionamento da pasta segue a orientação do Conselho Federal de Medicina (CFM) e é guiado pelos princípios bioéticos como, por exemplo, "dar autonomia para que os pacientes possam assinar um termo de consentimento livre", com direito de optar por uma terapêutica que já foi usada no Brasil e que, segundo a secretária, é conhecida, tem baixo preço e deve ser acessível em todo o território.  

"Precisa-se respeitar o princípio da justiça, que é o que garante a equidade do SUS. Ainda, o princípio da não maleficência, quando assumimos a nossa capacidade, como órgão orientador, de orientar uma dose que garantir a segurança na prescrição médica. E no caso da beneficência, que também é o princípio bioético, a nossa capacidade de dar ao paciente o direito que é do SUS de fornecer medicação para todas as pessoas que assim desejarem", explicou a secretária. Ela, no entanto, não descartou a possibilidade de se voltar atrás, caso seja comprovado o efeito negativo das substâncias.