O Brasil disparou na liderança incômoda em destruição do meio ambiente. No ano passado, foi responsável por um terço da devastação de florestas virgens no mundo, segundo relatório divulgado pelo Global Forest Watch (GFW), organização que mantém uma plataforma on-line de monitoramento de florestas. Para especialistas, além dos riscos para o planeta, isso destrói mais a já combalida imagem do país no exterior, sobretudo, no que tange a políticas ambientais.
De acordo com o relatório, de janeiro a dezembro de 2019, o Brasil perdeu cerca de 1,3 milhão de hectares (13.610 km²) de floresta tropical virgem, enquanto, no mundo, foram perdidos 3,8 milhões de hectares. A área devastada no país por queimadas ou desmatamento é maior do que a cidade de Sidney, na Austrália, que tem 12.368 km². Segundo o GFW, que usa dados da Nasa, do Google, do Serviço Geológico dos Estados Unidos e da Universidade de Maryland (EUA), 95% da perda ocorreram na Amazônia.
Em segundo e terceiro lugares, a República Democrática do Congo e a Indonésia tiveram reduções de 475,2 mil hectares e 323,6 mil hectares, respectivamente. Por conta de incêndios que ocorreram em agosto de 2019 em áreas de alta biodiversidade, a Bolívia está em quarto lugar na lista, com perda de 290,4 mil hectares.
Os dados oficiais do governo, apurados pelo Projeto Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite (Prodes), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), indicam que, em 2019, foram desmatados 9.762 km² de floresta amazônica, um aumento de 30% frente ao desmatamento do ano anterior, de 7.536 km².
Segundo Rômulo Batista, porta-voz da campanha de Amazônia do Greenpeace, é preciso apontar as diferenças entre os dois sistemas. “O Prodes usa o período entre agosto e julho e o relatório do GFW é de janeiro a dezembro. O tamanho da degradação que os dois sistemas observam também é diferente. Os dois sistemas são complementares”, ressaltou. O Prodes mede o corte raso e o GFW soma a isso a degradação florestal, incluindo o que é chamado brocar, a abertura feita para entrar na mata. “Portanto, mede um espectro de perturbações muito maior do que o corte raso”, comparou.
Ciclo da água
A devastação da Amazônia pode levar à quebra do ciclo da água, alertou Batista. “A floresta tem uma capacidade enorme de bombear água do solo para a atmosfera. Essa umidade é um grande termostato para o clima mundial. No Brasil, é responsável por rios voadores, massas de nuvens que irrigam toda a produção do Centro-Oeste e Sudeste brasileiro”, detalhou. “Seja em que sistema for, há aumento do desmatamento. O que comprova que a política ambiental deste governo é anti-meio ambiente”, sustentou.
Segundo o professor do Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília (UnB) José Francisco Gonçalves Júnior, o termo “florestas virgens” indica que não há qualquer tipo de presença humana ou influência de degradação ambiental ou poluição. “O fato de estar na zona tropical é um indicativo da elevada diversidade de espécies, genética, habitats com processos ecológicos complexos”, explicou. “A devastação pode levar ao desaparecimento da biodiversidade; algumas diversidades ainda não descritas devido à velocidade com que são degradadas em relação ao tempo e recursos para a comunidade científica estudá-las”, assinalou.
Para Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, o dado é mais um motivo para depreciar a imagem do país no exterior. “O Brasil deveria estar cuidando do patrimônio. É nosso, mas afeta o planeta inteiro. Isso é péssimo para as mudanças climáticas”, lamentou. Astrini também alertou para o perigo à saúde, sobretudo, em um momento de pandemia. “A devastação da Amazônia é um risco muito grande para a saúde do planeta. É o lugar mais rico em vida, com imenso estoque de vírus. Quanto mais a gente avança na floresta, maior o risco de ter novas zoonoses”, destacou.
Na opinião do deputado Alessandro Molon (PSB/RJ), da Frente Parlamentar Ambientalista, os dados podem afetar as exportações dos produtos brasileiros para o exterior. “Tudo o que esse governo tem conseguido fazer é envergonhar o Brasil. Daqui a pouco, o produto brasileiro será sinônimo de destruição da Amazônia. E isso é o que de pior pode nos acontecer”, lastimou.Procurado, o Ministério do Meio Ambiente não respondeu.
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