Marisa Wanzeller*
postado em 05/06/2020 20:20

As taxas de desperdício ao longo da distribuição da água significa que para cada 100 litros de água captada, tratada e potável, 38 litros não chegam oficialmente a ninguém. De acordo com os índices divulgados, as perdas nos sistemas de distribuição brasileiros estão piorando com o passar dos anos. Em 2014, o país registrou perda de 36,7%, quatro anos depois, o indicador subiu 1,75 ponto percentual, chegando a 38,45%. A redução dessas taxas permitiria que mais pessoas tivessem acesso ao recurso, já que, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 31,1 milhões de brasileiros não têm acesso a água fornecida por meio da rede geral de abastecimento.
A falta de acesso à água tratada também reflete na saúde de grande parte população brasileira que, ao mesmo tempo que enfrenta uma pandemia, não tem recursos para a higienização correta, conforme recomendado pelas autoridades médicas. ;Os brasileiros sem acesso à água estão justamente nas áreas mais vulneráveis, nas favelas, nos semiáridos, na área rural. São pessoas que já ficariam doentes naturalmente pelo esgoto que corre a céu aberto;, pontua Édison Carlos, presidente executivo do Instituto Trata Brasil.
A pesquisa, que tem como base os dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), constatou perda de 6,5 bilhões de m; no ano de 2018 (ano base para o estudo), o que equivale a 7,1 mil piscinas olímpicas por dia. Isso significou perda de R$12 bilhões dos recursos investidos em saneamento básico no Brasil. Segunda a análise de cenários desenvolvida pelo Instituto, caso o país reduzisse a perda de água para 20%, teria um ganho líquido de R$30,9 bilhões.
De acordo com Édson Carlos, o desperdício de água ao longo da distribuição impacta o país em pelo menos três frentes, são elas ambientais, econômicas e sociais. Primeiro, requer a retirada de mais água da natureza para cobrir a ineficiência da distribuição, mesmo em momentos de crise hídricas como passaram as regiões Sudeste, Nordeste e Sul do país. Além disso, o custo de transformação da água in natura em água potável, que envolve energia elétrica, produtos químicos e funcionários, por exemplo, não é suprido pela tarifa cobrada do consumidor final. Por fim, os problemas sociais, referentes às periferias do país.
O diretor-presidente da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal Adasa), Paulo Salles, reforçou, na última quarta-feira (3) em um encontro virtual, que a pandemia escancarou a desigualdade social brasileira, inclusive no acesso à água. ;Temos que encontrar novas abordagens para velhos problemas como a diarréia e a dengue;, pontuou o diretor.
O Instituto Trata Brasil afirma que 100 milhões de pessoas vivem em localidades sem acesso à coleta dos esgotos, estando vulneráveis em relação a doenças como diarreia, leptospirose, dengue, malária e esquistossomose que comprometem o sistema imunológico e, sobretudo, o desenvolvimento de crianças. Em 2018, números do DATASUS mostram que o país contabilizou mais de 233 mil internações por doenças de veiculação hídrica, sendo quase 50% em crianças de 0 a 5 anos.
Distrito Federal
A Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb) mantém uma taxa de perda de água abaixo da média nacional. Em 2016, antes da crise hídrica vivenciada no DF, o índice era de 35,21%, baixando para 34,49% em 2018, ano base do estudo realizado pela Trata Brasil. Em 2019, a Caesb diminuiu essa taxa para 32,1%. De acordo com Paulo Salles, a companhia realizou ações com foco de diminuir essa média, dentre elas, a troca de hidrômetros velhos. Ainda assim, o volume de água desperdiçado chega a mais de 155 milhões de litros por dia, o que bastaria para atender 1.167.408 pessoas diariamente, tendo em vista o consumo médio de 140 litros por habitante.
O diretor-presidente da Adasa coloca que a perda na distribuição se dá em dois tipos. ;Uma é perda real, é água que sai por vazamento, é água que se perde nos ramais e nos próprios reservatórios. Têm ainda as perdas aparentes, a água que eles retiraram, eles entregaram, mas eles não conseguiram faturar. Ou seja, essas perdas incluem outros problemas, ligações clandestinas, fraudes no hidrômetro;, comenta. Da taxa de perda de água da Caesb, de acordo com Salles, apenas 23% equivale à perda real, a companhia trabalha para que essa taxa caia ainda mais.
[SAIBAMAIS]Paulo Salles complementa que em meio a pandemia a Caesb tem feito ;vista grossa; para a população que vive de ligações clandestinas de água, ;já que são áreas que não tem como tirar as pessoas e levar para outro lugar; e a população não poderia ficar sem acesso ao recurso nesse momento. ;Não tem ninguém sem água, ninguém consegue sobreviver em um lugar que não tem água. Quem não tem água, está perto de uma área que tem água e faz ligação clandestina. A Caesb tem um programa de combate às ligações clandestinas, nesse período de emergência eles não estão fazendo essas ações;, fala o presidente.
Assim, a falta de água tem ligação direta com as periferias do Distrito Federal. ;São áreas recentes, têm também áreas em processo de regularização, por exemplo o Sol Nascente que é uma extensão da Ceilândia; e que recentemente virou uma Região Administrativa. ;Não tem dúvida de que os mais pobres são os mais vulneráveis;, afirma Salles que reforça a importância do uso racional de água. ;Neste momento nós estamos com o reservatório a 100%, mas vem aí a seca e a gente não sabe como vai ser o fim do ano;.
* Estagiária sob supervisão de Vicente Nunes
* Estagiária sob supervisão de Vicente Nunes