Correio Braziliense
postado em 05/07/2020 04:04
A cura da síndrome da imunodeficiência adquirida (Aids) pode estar mais perto do que se imagina. A Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) realizou o primeiro estudo, em escala global, para testar um supertratamento em indivíduos cronicamente infectados pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). A pesquisa está sendo coordenada pelo infectologista Ricardo Sobhie Diaz, diretor do Laboratório de Retrovirologia do Departamento de Medicina da Escola Paulista de Medicina (EPM/ Unifesp).
A pesquisa contou com a participação de 30 voluntários que possuem carga viral indetectável, sob tratamento padrão, conforme o que é atualmente preconizado: a combinação de três tipos de antirretrovirais, mais conhecida como “coquetel”. Os voluntários foram divididos em seis subgrupos, recebendo, cada um deles, diferentes combinações de remédios, além do próprio “coquetel”.
Diaz e sua equipe vêm trabalhando em duas frentes para a cura da doença: uma utilizando medicamentos e substâncias que matam o vírus no momento da replicação e eliminam as células em que o HIV fica adormecido (latência); e a outra, desenvolvendo uma vacina que leva o sistema imunológico a reagir e eliminar as células infectadas nas quais o fármaco não é capaz de chegar.
Os integrantes do subgrupo que apresentaram melhores resultados receberam mais dois antirretrovirais: o dolutegravir, a droga mais forte atualmente disponível no mercado; e o maraviroc, substância que força o vírus, antes escondido, a aparecer.
Também foram incluídas outras duas substâncias que potencializam o efeito dos medicamentos: a nicotinamida — uma das duas formas da vitamina B3, que mostrou ser capaz de impedir que o HIV se escondesse nas células; e a auranofina — um antirreumático, também conhecido como sal de ouro, que deixou de ser utilizado há muitos anos para tratar a artrite e outras doenças reumatológicas. A auranofina revelou potencial para encontrar a célula infectada e levá-la ao suicídio.
Mas, apesar da descoberta dessas substâncias (a nicotinamida e a auranofina) para a redução expressiva da carga viral, ainda seria necessário algo que ajudasse a imunidade dos pacientes contra o vírus. Dessa maneira, os pesquisadores desenvolveram uma vacina de células dendríticas — importantes unidades funcionais no sistema imunológico — que conseguiu ensinar o organismo do paciente a encontrar as células infectadas e destruir uma a uma, eliminando completamente o vírus HIV.
Segundo Diaz, as células dendríticas têm função de capturar micro-organismos prejudiciais ao organismo para, em seguida, apresentá-los aos linfócitos T CD8, que aprendem a encontrar e a matar o HIV presente em regiões do corpo — chamadas pelos especialistas de “santuários” — aonde os antirretrovirais não chegam ou, quando chegam, atuam de forma muito modesta, como cérebro, intestinos, ovários e testículos.
Seis dos pacientes participantes receberam o supertratamento, mas ainda aguardam os resultados finais da terceira dose da vacina. “Somente após as análises de sangue e das biópsias do intestino reto desses pacientes vacinados é que partiremos para o desafio final: suspender todos os medicamentos de um deles e acompanhar como seu organismo irá reagir ao longo dos meses ou, até mesmo, dos anos”, conclui Diaz. “Caso o tempo nos mostre que o vírus não voltou, aí sim, poderemos falar em cura.”
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