Brasil

Einstein afasta médica

Nise Yamaguchi comparou combate à pandemia ao Holocausto e hospital decidiu suspender profissional enquanto analisa comentário sobre judeus. Oncologista alega perseguição por defender uso da hidroxicloroquina

Correio Braziliense
postado em 12/07/2020 04:12
Médica foi cotada para ocupar vaga na pasta de Saúde, após saída de Nelson Teich
 
Uma analogia entre a pandemia de covid-19 no Brasil e o nazismo motivou o Hospital Israelita Albert Einstein a afastar uma das médicas mais comentadas nos últimos meses pelos posicionamentos na contramão das evidências científicas reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A imunologista e oncologista Nise Yamaguchi, considerada uma das principais defensoras da hidroxicloroquina e cotada mais de uma vez para assumir o Ministério da Saúde no governo Bolsonaro, não pode atender a novos pacientes na instituição paulistana até a conclusão das análises do comitê de ética do hospital sobre a declaração “insólita” da pesquisadora sobre vítimas do Holocausto, como definiu a direção.

As apurações começam amanhã e têm como base um comentário feito durante uma entrevista de Nise concedida à TV Brasil. Na ocasião, a médica fez uma analogia entre o pânico da população frente à pandemia e a situação dos judeus à época do Holocausto. “O medo é prejudicial para tudo. Em primeiro lugar, te paralisa, te deixa como massa de manobra. Qualquer pessoa, você pega... Você acha que alguns poucos militares nazistas conseguiriam controlar aquela massa de rebanho de judeus famintos se não submetessem diariamente a humilhações, humilhações e humilhações, tirando deles todas as iniciativas?”, comparou. 

A reflexão repercutiu negativamente dentro da instituição, que é idealizada pela comunidade judaica. Na avaliação do presidente do hospital, Sidney Klajner, houve a banalização da história de sofrimento causada pelos nazistas. “Isso para nós é algo que jamais pode acontecer: uma banalização (da história) em que 6 milhões de judeus que morreram e que a gente convive com várias vítimas, vários sobreviventes e muitos deles fundadores do hospital”, explicou Klajner, em entrevista ao Correio.

Ele ressaltou, ainda, que não houve qualquer correlação do afastamento da médica com a indicação de hidroxicloroquina para pacientes com covid-19. “Isso não tem nada a ver com o posicionamento dela na prescrição de cloroquina ou qualquer tipo de medicação. Existe um princípio de autonomia médica e o Einstein respeita esse princípio, apesar de haver uma recomendação no hospital para que a cloroquina não seja utilizada por conta das recomendações que se baseiam em evidências científicas”, explicou.

A imunologista levantou a questão ao tornar o assunto público, recorrendo à imprensa para expressar a opinião. Em entrevista ao SBT Brasil, na sexta-feira, Yamaguchi contou sobre o afastamento e declarou ter sido informada que “não poderia estar prescrevendo e nem atendendo aos meus pacientes que já estão internados”. Ela ainda afirmou que a medida foi adotada devido ao posicionamento no uso de remédios à base cloroquina e usou o termo “denegrir” para justificar a resposta. “Eles acreditam que a minha fala em prol da hidroxicloroquina não tem fundo científico, denigre o hospital, porque todo mundo relaciona a minha presença à imagem do hospital.”

Nas redes sociais, palavras de apoio à médica foram publicadas por defensores do governo Bolsonaro e políticos. “Minha solidariedade à dra. Nise Yamaguchi. Como nas universidades públicas brasileiras, também na medicina, a autonomia e a liberdade só valem para concordar com a maioria”, postou a deputada estadual de São Paulo e jurista Janaina Paschoal (PSL).

Repúdio 

Diante da repercussão do caso, o Albert Einstein emitiu uma nota revelando que não esperava que o fato viesse a público durante a averiguação da fala em relação à comunidade judaica. “A expectativa do hospital é a de que o incidente tenha a melhor e mais célere resolução, de modo a arredar dúvidas e remover desconfortos”.

Além do hospital, entidades representativas da comunidade judaica emitirão nota de repúdio contra a colocação de Nise, como apurou a reportagem. Como sábado é um dia de descanso na religião, os comentários devem ser divulgados hoje. 

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