A pandemia do novo coronavírus abriu a discussão sobre um conceito até então desconhecido fora da comunidade científica: a “imunidade de rebanho”. Trata-se de uma definição veterinária utilizada quando a maioria dos indivíduos está imunizada contra uma doença, o que acaba protegendo os demais. Mas, mesmo ultrapassando a marca de dois milhões de infectados, o Brasil está longe de obter a “imunidade de rebanho” e não é bom forçar para que se chegue a ela. Especialistas alertam para o risco de se pensar que algo assim seria conseguido abandonando as medidas de defesa contra a covid-19. Afirmam que o resultado seria uma disparada no número de mortes. Além disso, tal conceito não tem eficácia comprovada.
“Essa imunidade é transmitida via contato de pessoas que tiveram a doença e criaram os anticorpos, que é transmitido para as demais quando estão juntas, e mesmo para quem não teve a doença”, explica o clínico-geral Marcos Pontes.
Má aposta
Médico epidemiologista e professor da Universidade de Brasília (UnB), Jonas Brant reforça que o risco de se partir para a “imunização de rebanho” é um risco alto. “Estamos muito longe dessa realidade. Não é uma boa aposta, pois, além de termos poucos estados com uma taxa tão alta de contaminação, o número de mortes seria muito elevado”, alerta o especialista, que informa que os modelos matemáticos sugerem que seriam preciso 70% da população imunizada para a covid-19.
“Para alcançar essa imunidade, estima-se que pelo menos entre 50 e 80% da população precisa estar imune ou ser, de fato, exposta ao vírus. Uma pesquisa realizada por uma universidade de prestígio no Brasil encontrou em Manaus, por exemplo, 14% de prevalência de anticorpos, que não é suficiente para a ‘imunidade do rebanho’”, explicou.
Na última terça-feira, o diretor do Departamento de Doenças Transmissíveis da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), Marcos Espinal, afirmou que não há evidências de que o Brasil ou qualquer área do país tenha conseguido alcançar a “imunidade de rebanho”. Ele reforçou que não recomenda que países tentem obtê-la, já que a perda de vidas seria maciça. Como a infecção não é tão leve quanto outras, não é possível que todos se contaminem ao mesmo tempo e se imunizem da mesma forma. Essa ideia poderia sobrecarregar o sistema de saúde.
Brant também salienta que ainda não se sabe se a covid-19 gera imunidade em quem contraiu a doença. “Temos visto alguns relatos de pessoas que se infectaram mais de uma vez, mas ainda são casos isolados. É preciso saber mais sobre essas ocorrências, que ainda são poucas”, destacou.
O médico alerta, ainda, que a covid-19 pode se tornar uma doença sazonal. “Outros coronavírus já mostraram que têm uma imunidade temporária, de quatro a seis meses. Isso pode fazer com que comecemos a ter uma doença sazonal. É provável que tenhamos que aprender a lidar com esse vírus”, observou.
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