Cidades

Arruda prepara Brasília para os 50 anos

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postado em 20/04/2008 23:39
Comemorar os 48 anos de Brasília é mais do que festejar a concretização do sonho de Juscelino Kubitschek. Durante as 18 horas de festa marcadas para hoje na Esplanada dos Ministérios, os brasilienses vão celebrar também o desenvolvimento de um novo Brasil, iniciado com a inauguração da nova capital da República em 1960. É assim que o governador José Roberto Arruda define a importância de preparar o aniversário de 50 anos de Brasília. "Estaremos comemorando os 50 anos de um novo país", resume o chefe do Executivo local.

Em entrevista exclusiva ao Correio, Arruda traça um histórico dos primeiros 450 anos do Brasil e fala da inauguração de Brasília como um divisor de águas. "Juscelino Kubitschek veio e o Brasil saiu do litoral para o interior; o emprego saiu do cabo da enxada e foi para a máquina", comparou. Apesar de citar o passado, o governador alerta que é preciso olhar para a frente. Segundo ele, todos os brasileiros devem estar preparados para a revolução tecnológica que se inicia. "Uma parte da população vai se incluir no trem do futuro. Outra vai esperar o seu tempo de vida acabar e não vai entender a mudança."

Depois de declarar que seu governo começaria de fato depois de 21 de abril, José Roberto Arruda falou sobre os desafios que precisará enfrentar para manter a qualidade de vida na cidade planejada e dona do título de Patrimônio Cultural da Humanidade. "Estamos fazendo uma revolução que, se não for interrompida nos próximos 20 anos, faz com que Brasília pegue um atalho em direção ao futuro do país."

"Em 20 dias inauguramos mais de 100 obras e será assim até o final de abril", afirmou o governador José Roberto Arruda enquanto apresentava mais dois de seus empreendimentos nesse domingo. Logo pela manhã, esteve na festa de abertura dos 6km ciclovia de Itapõa, um investimento de R$ 600 mil. A iluminação ao longo da pista e as 13 paradas de ônibus também são novas e fazem parte das melhorias que chegam à cidade de 85 mil habitantes.

Logo em seguida, desembarcou de seu helicóptero em Sobradinho II. Ali, os moradores da AR 19 receberam uma quadra de esportes e um parquinho infantil. Já na AR 01, a comunidade estava empolgada com a reabertura do Ginásio de Esportes da cidade. Antes depredado, o ginásio recebeu nova cobertura, banheiros, vestiários, o piso foi reformado e pintado. Ao todo, a obra somoy 80 mil reais. "Esse dinheiro não é do governo, é do povo que paga seus impostos. Na verdade, somos empregados da população que investe seu dinheiro em melhorias", discursou Arruda.


ANIVERSÁRIO DE BRASÍLIA

Não estamos comemorando apenas o aniversário de 48 anos de Brasília. Estamos celebrando os 50 anos de um novo país. Nos primeiros 450 anos, o Brasil era um país agrícola, litorâneo, culturalmente muito pobre. Era uma aglomeração de pessoas sem um sentimento de nacionalidade. Daí veio Juscelino Kubitschek. E o Brasil teve uma revolução urbana, saiu da roça e veio para a cidade, saiu do litoral e veio para o interior. O emprego saiu do cabo da enxada e foi para a máquina. Agora, o Brasil terminou o ciclo iniciado com a Revolução Industrial (iniciada na Inglaterra, em meados do século 18). Eu acho que o Brasil vai passar por uma grande mudança, como ocorreu nos anos de 1950. Um novo ciclo vai nascer.

QUALIDADE DE VIDA

Não se pode olhar Brasília nem o Brasil pelo espelho retrovisor. Sexta-feira passada eu fui caminhar na expansão de Samambaia e fiquei abismado com o número de carros estacionados na porta das casas. Tem mais carro na rua do que apartamento nos prédios. É preciso olhar para a frente. A gente fala de infra-estrutura e logo pensa em estrada e viaduto. Infra-estrutura daqui para frente é fibra ótica, wireless (tecnologia que permite a conexão entre diferentes pontos sem a necessidade de cabos), tecnologia, educação. Estamos falando de outro país, de outro mundo e, portanto, de outra cidade.

COPA 2014

Vencemos o primeiro round para colocar Brasília entre as 12 cidades. O desafio agora é melhorar nossa infra-estrutura. A gente inaugura o novo estádio do Gama dentro de 90 dias. A licitação do VLT (Veículo Leve Sobre Trilhos), que vai sair do aeroporto, passar pela W3 até o centro da cidade, já está na rua. E também já está na rua o edital da PPP (Parceria Público Privada) para a reconstrução do Mané Garrincha, que também é um outro conceito de estádio. Nas grandes capitais do mundo não se constrói mais estádio de futebol. Se constrói uma arena multiuso onde de vez em quando tem jogo de futebol. Mas que também tem shows, escolas, restaurantes. Eu me arrisco a dizer que o primeiro projeto de simplesmente fechar os anéis do Mané Garrincha, aproveitando o que existe, vai ser ultrapassado pela idéia de jogar tudo no chão e fazer tudo novo.

OCUPAÇÃO IRREGULAR

A cidade se expandiu horizontalmente e sem planejamento, o que é um grande equívoco. Até 20 anos atrás, quando você pousava em Brasília, olhava da janelinha do avião e via claramente, pelas luzes à noite, o Eixo Monumental e as duas asas, ou seja, o avião de Lucio Costa. Via também algumas manchas de luzes que dava para identificar como Guará, Taguatinga, Sobradinho. Hoje, quando você pousa em Brasília, vê uma grande mancha disforme iluminada. Essa imagem mostra o que foi a deformação urbana e o crescimento desorganizado da cidade. O crescimento horizontal dificulta enormemente a transportabilidade e faz com que a infra-estrutura urbana seja extremamente cara. Eu fui obrigado a tomar medidas muito duras no início do meu governo por absoluta necessidade. Eu tive que meter o pé no freio. Estamos limpando a cidade. Eu sei que eu joguei duro. Em alguns casos a dose pode ter sido forte, mas ou eu fazia isso no primeiro momento, botava Brasília no caminho da legalidade, ou já era. A cidade estava viciada. Ninguém achava que estava errado.

SEGURANÇA PÚBLICA

Retroceder o mal que foi feito leva tempo. Primeiro, pensando a longo prazo, o caminho é a educação integral. Quanto mais o menino estiver o dia inteiro na escola, menos cadeia eu vou ter no futuro. Investir em tecnologia, em qualificação profissional, tudo isso é fundamental. E no curto prazo? A nossa teoria, aqui em Brasília, era de grandes quartéis. Eu não construí nenhum quartel e ainda ocupei um com o Buritinga (o Centro Administrativo do GDF, em Taguatinga). O que vou fazer agora é a entrega dos primeiros 10 postos policiais, que é o caminho inverso. Até o final do governo vamos construir 300 postos. Com isso estou tirando o soldado do quartel para colocá-lo mais próximo da comunidade.

EMPREGO

O grande problema de Brasília não é emprego, é empregabilidade. Dou um exemplo. Na obra do Hospital de Santa Maria, em um determinado momento, a gente precisava de 30 armadores, que é um emprego relativamente simples, armador de ferro. Apareceram 600 candidatos e apenas cinco foram escolhidos. A empresa teve que buscar armadores fora de Brasília. Quando veio a Revolução Industrial, parte das pessoas que trabalhava na roça se qualificou e foi para as indústrias. Uma outra parte morreu na roça banguela. Essa nova revolução é isso. Uma parte desta população vai ser incluída no trem do futuro pela educação, pela qualificação profissional. E tem uma parte que vai esperar o seu tempo de vida acabar e não vai entender a mudança. Depende mais da pessoa do que do estado. Mesmo assim, estou recriando a Secretaria de Trabalho, fazendo uma parceria com o governo federal para investir em qualificação e mão-de-obra. Estou com 3 mil alunos do ensino médio fazendo cursos técnicos com duração de dois anos no sistema Sesc, Senai, Senac, pagos pelo governo. Estou com 48 centros do DF Digital para fazer inclusão digital.

SAÚDE

A saúde pública brasileira hoje quebrou. Em Brasília nós ainda estamos conseguindo ter um modelo razoavelmente melhor do que o de outros estados. Mas o modelo quebrou no Brasil inteiro. Você tem, por exemplo, 4 mil médicos na rede pública de saúde. Eu os convido a encontrar 40, portanto 1%, que se dedique apenas à saúde pública. A grande maioria trabalha também nas suas clínicas, nos hospitais particulares. O modelo do médico estatutário já era. O que tem de novo é a proposta do ministro (José Gomes) Temporão, com a qual eu concordo plenamente, e que nós vamos testar no Hospital de Santa Maria. São as organizações sociais, como o Sarah Kubitschek. Hospitais gerenciados por contratos de gestão feitos por organizações sociais que mantêm servidores da saúde em tempo integral com dedicação exclusiva e salários dignos. O maior crime que se cometeu contra a saúde pública em Brasília foi a extinção da Fundação Hospitalar, que dava flexibilidade à gestão dos hospitais. Hoje, só para comprarmos algodão, temos que fazer uma licitação em uma central de compras. As coisas funcionavam na própria unidade hospitalar. A classe média usava hospital público. E, se você queria um quarto além da enfermaria, pagava o diferencial. Esse dinheiro a mais melhorava o sistema de saúde. Isso ficou proibido, você tirou a classe média da saúde pública e houve a decadência geral do sistema.

EDUCAÇÃO

Estou fazendo algumas experiências. O ensino integral já está em 103 escolas e, em qualquer uma delas que você visitar, vai achar mil defeitos. Mas uma coisa é fundamental: o aluno está chegando às 7h e saindo depois de 16h, com almoço. Não tem refeitório nem prato. As crianças comem em um pratinho de plástico na carteira onde estuda. Mas está almoçando e não está na rua aprendendo besteira. Eu diria que, nesses 15 meses de governo, o maior avanço que fizemos foi na educação. Passamos a escolher diretores por um processo democrático que, primeiro, envolveu prova de títulos, prova escrita na universidade e consulta à comunidade. Eu não nomeei nenhum diretor, todos foram escolhidos pela comunidade escolar. Paramos de chamar os professores temporários que normalmente eram pessoas ligadas a apadrinhamento político e contratamos mais de 1,5 mil professores concursados. Estamos com um programa de aceleração escolar para diminuir a defasagem idade/série como nunca se fez antes. Contratamos a Fundação Roberto Marinho, contratamos a Fundação Ayrton Senna e estamos quebrando paradigmas, brigando com o corporativismo e dizendo para um aluno de 18 anos que estava na 8; série: "Acorda, não dá mais para ficar assim". Estamos fazendo uma revolução que, se não for interrompida nos próximos 20 anos, fará com que Brasília pegue um atalho em direção ao futuro. Esse foi o grande avanço nesses 15 meses. É a única área que tenho dois secretários.

PROFESSORES

Eu negociei com os professores um plano de cargos e salários e dei mais do que eles imaginavam. Vamos gastar, este ano, R$ 400 milhões a mais com o plano de cargos e salários para os professores. É claro que eu preciso dos professores motivados. Essa é uma vantagem de Brasília. Temos um excelente corpo de professores. A escola classificada em quinto lugar no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) é uma escola rural de Planaltina onde as crianças vão para a escola a cavalo e de chinelo de dedo. Em 15 minutos você vai ver qual a diferença: a cara do diretor. Eu tenho ido almoçar nessas escolas de educação integral e quem está servindo o suco para os meninos são as professoras que podiam ter ido para casa, cuidar dos seus filhos. Mas ficam na escola por amor à camisa.

REELEIÇÃO

Eu tenho um mandato e quero cumpri-lo integralmente. O fato de não conseguir fazer tudo que desejaria não significa que o mandato não seja bem aproveitado. Aqueles que me sucederem ao longo do tempo vão criar os seus próprios estilos, mas determinadas sementes que estamos plantando não serão modificadas. Ninguém vai acabar com a escola integral, com os postos policiais. Eu não acredito que ninguém mais tenha coragem de criar um Instituto Candango de Solidariedade, que foi extinto em 2007, e colocar 14 mil funcionários sem concurso. Eu acho que nós fizemos uma mudança cultural importante e ela vai gerar resultados não apenas no meu governo, mas naqueles que me sucederem. A reeleição é mera conseqüência. O que posso dizer é o seguinte: eu tenho uma enorme esperança no futuro Brasil. A Brasília de 50 anos vai ser uma cidade mais madura, mais consciente e vai estar um pouco mais na vibe (vibração) do Brasil novo. Não quero Brasília com 50 anos olhando para trás. Vamos fazer as homenagens a JK e aos pioneiros, mas a Brasília de 50 anos tem que estar preparada para olhar para o futuro. Porque Brasília quando foi construída nos anos 50 estava à frente do seu tempo. E nesses 50 anos, foi ficando com o freio de mão puxado, igual às outras cidades. Nós queremos recolocar Brasília na vanguarda. Acho que a minha posição pessoal não tem a menor importância perto da dimensão da mudança que o Brasil está vivendo.

CRISE NA UnB

Acho que o modelo de administração pública faliu. O país dos Ibamas, dos burocratas, é um país fadado a estagnação. Pessoas passam pela UnB, se decepcionam e vão estudar em outro lugar. A UnB está olhando para trás, é uma universidade retrógrada que parou no tempo. O Timothy vinha sendo um bom reitor. Estava trazendo a universidade para as cidades satélites. E por causa de uma lixeira, de uma reforma de um apartamento acontece tudo isso. É um país, coitado do nosso país, olhando para o umbigo. Ele poderia até ser criticado por não ter feito um centro tecnológico, por ter demorado a levar a universidade para a Ceilândia. Não pelo valor da lixeira. Que pobreza de espírito! Isso é a nossa universidade. Alguém está discutindo o tamanho do apartamento do reitor da universidade de Pequim? Na universidade americana, Harvard por exemplo, 90% dos recursos são privados. Nosso ensino superior vai ter que ser repensado totalmente. Do jeito que está, custa caro e produz pouco.

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