Cidades

Flanelinhas: Os donos do pedaço

Vagas em áreas públicas são negociadas por mês a preços que variam entre R$ 30 e R$ 70. A cobrança é ilegal. Os flanelinhas agem como manobristas e desrespeitam as leis de trânsito para acomodar os carros

postado em 16/06/2008 08:27
;Lavei 15 carros e vendi duas vagas;, anuncia Reginaldo para um colega na quadra 6 do Setor Comercial Sul. Preço da vaga: R$ 50 mensais. Localização: espaço público. No centro de Brasília, a falta de estacionamentos transformou os antigos flanelinhas em empresários. As áreas foram loteadas entre eles, cada um tem seu campo de trabalho demarcado por meio de um misto de respeito e agressividade. Os motoristas que quiserem estacionar pagam ;gorjetas; com preços fixos. Quando afirma que ;vendeu uma vaga;, Reginaldo está dizendo que conquistou um cliente. Durante a semana, o motorista confiará o carro exclusivamente a ele e, em troca, pagará mensalidade. Os clientes antigos deixam a chave do veículo com o guardador, o que transforma o carro deles em veículo de ;manobra;. Os mais desconfiados ; mas que também usam o serviço do flanelinha ; pedem a vaga acertada quando chegam. Reginaldo, então, tira um dos carros de ;manobra; do lugar e o cliente estaciona. Com algumas poucas variações, esse é o sistema de trabalho dos flanelinhas nas áreas de estacionamento mais disputadas do Distrito Federal. De quarta a sexta-feira, a equipe do Correio percorreu quatro delas ; Setor Comercial Sul, Setor Bancário Sul, Setor de Autarquias Sul e Setor de Diversões Norte ; e constatou que as vagas em áreas públicas agora têm preços. De14 guardadores, apenas um disse que o serviço de reserva de vaga a preço combinado não existia. ;A senhora dá quanto quiser porque este estacionamento é público;, afirmou um flanelinha que trabalha em um dos estacionamentos da parte de cima do Conjunto Nacional. Um outro, que toma conta de uma das áreas do Setor Bancário Sul, disse que não podia cobrar pelo mesmo motivo, mas sugeriu o pagamento de R$ 50 por duas lavagens e serviço de ;manobra;. Este segundo chegou a apresentar um cliente advogado que elogiou o serviço. Os outros doze guardadores abordados estipularam preços entre R$ 30 e R$ 70, variando de acordo com a área em que trabalham. Na quadra 1 do movimentado Setor Bancário Sul (SBS), em frente a um dos prédios da Caixa Econômica Federal, foi cobrado o preço mais caro. Sebastião, conhecido como Carioca, definiu R$ 70 para cuidar do carro. ;Se você chegar às 9h, não tem mais vaga. Se deixar na minha mão, seu carro estará estacionado na hora do almoço;, garantiu. No preço dele estão incluídos manobra diária, duas lavagens e um polimento por mês. Na maioria dos pontos, a procura pelo serviço dos lavadores/flanelinhas/manobristas é muito maior do que a oferta de vagas. Eles organizam filas duplas e até triplas para acomodar os carros dos clientes. Não respeitam calçadas, meios-fios, nem vagas para deficientes ou idosos. Perguntado sobre o risco de o carro receber uma multa, Manuel, da quadra 2 do SCS, explicou que os policiais militares do local já o conhecem. ;Não posso garantir 100% de certeza de não ter multa porque o pessoal do Detran faz surpresas. Mas dou quase;, diz. Enquanto conversava com a reportagem, Manuel entregou um carro estacionado em vaga proibida para um rapaz e, logo depois, colocou outro veículo no mesmo local. Também no SCS, Luiz ofereceu uma vaga fixa por R$ 40 mensais no estacionamento da quadra 1. Cada lavagem, feita com água retirada de um dos prédios próximos, custaria mais R$ 10. Para convencer, mostrou a carteira de motorista e garantiu cuidar de mais de uma dezena de carros dos prédios próximos. ;A gente faz a ;combina;, daí você paga R$ 40 por mês;, afirmou. No estacionamento coberto particular localizado em frente ao espaço de Luiz, a vaga mensal é alugada por R$ 249. ;É seguro deixar com a gente. Aqui, você fica sem preocupação;, garantiu o flanelinha. Apesar de o serviço de manobra oferecido pelos flanelinhas não ser compulsório ; o motorista entrega a chave porque quer ;, ele é ilegal. O fato de os guardadores se tornarem ;donos; de um espaço público prejudica os motoristas que não querem pagar pelo serviço. Estes não têm vez nos estacionamentos, já que os flanelinhas agem como cães de guarda, ocupando as vagas que vão surgindo com os carros dos clientes fixos. ;Eu não deixo com eles. Acho que carro é uma coisa muito pessoal. Mas pago R$ 5 por semana para ter uma vaga na hora em que chego;, conta uma moça que trabalha no SCS e pede para não ser identificada por medo de represálias. Segundo ela, os R$ 5 foram estipulados pelo próprio guardador. Leia mais na edição impressa do Correio Braziliense

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