postado em 11/07/2008 07:59
O telefone da Central Integrada de Atendimento e Despacho (Ciade) do Corpo de Bombeiros não pára. Durante as 24 horas do dia, os militares atendem ligações de todo o Distrito Federal. Grande parte delas são pedidos de socorro a vítimas de acidentes de trânsito causados por imprudência, desrespeitos à legislação e consumo de bebidas alcoólicas. Mas, desde que a lei de tolerância zero à mistura álcool e volante entrou em vigor em todo o país, o dia-a-dia do Corpo de Bombeiros local ficou um pouco mais tranqüilo. O total de chamados atendidos pela corporação caiu 14% nos últimos 20 dias. De 20 de junho a 9 de julho deste ano, os bombeiros atuaram em 763 ocorrências de acidentes, com ou sem vítimas. São 126 casos a menos do que o total registrado no mesmo período do ano passado.
Somados às estatísticas do Departamento de Trânsito do DF (Detran), os dados dos bombeiros mostram os efeitos benéficos da lei que instituiu a tolerância zero ao consumo de bebidas por motoristas (confira quadro). Em 17 dias, as ocorrências de acidentes de trânsito com morte baixaram 38%. De 3 a 19 de junho, antes da legislação ser sancionada, o Detran registrou 21 casos fatais nas vias do DF. Nos 17 dias seguintes, com a vigência da nova norma, foram 13 acidentes com mortes. O número de vítimas também caiu, embora em menor proporção: 18%. São 18 pessoas mortas em acidentes contra 22 na primeira quinzena do mês passado.
Os atendimentos do Corpo de Bombeiros envolvem qualquer tipo de acidente, como batidas entre veículos diferentes, atropelamentos, capotagens e até choques contra objetos fixo, com ou sem vítimas. São casos como o ocorrido no Dia das Mães deste ano, na pista de acesso à Ponte JK. O carro do engenheiro agrônomo André Vicente de Sanches, 38 anos, colidiu com o do servidor público Felipe Gonçalves de Sousa Cruz, 47, que estava em alta velocidade. Ninguém morreu, mas o filho de André, uma criança de 11 anos, perdeu 80cm do intestino e o apêndice. Um exame do Instituto Médico Legal (IML) comprovou que Felipe ingeriu bebida alcoólica e usou maconha antes do acidente. Ele foi preso.
Mesmo com o aumento de quase 10% da frota de veículos do DF, as estatísticas caíram. Mas o trabalho do Corpo de Bombeiros termina quando as vítimas chegam aos hospitais ; os militares não investigam as causas dos acidentes, isso cabe ao Detran e à Polícia Civil. Por isso, oficialmente, a corporação não afirma que os resultados positivos são causados pela mudança na legislação de trânsito. ;Eu trabalhei 13 anos no socorro. Muitas vezes, não dá para saber se a pessoa está embriagada ou não. Mas já vi todo tipo de coisa e é comum encontrar latas de cerveja nos carros envolvidos no acidente;, conta o assessor de Comunicação Social do Corpo de Bombeiros, tenente Fábio Andrade Ribeiro. ;Não consigo não associar esses números em queda com a lei seca;, conclui.
Campanhas educativas
O diretor-geral do Detran, Jair Tedeschi, ressalta que a lei é recente e que os dados ainda são preliminares. As estatísticas do órgão só são fechadas depois de um mês porque incluem as mortes ocorridas dias após o acidente. Mesmo assim, Tedeschi acompanha os números diariamente. ;Gosto de ver as coisas dando resultado;, afirma. Nos primeiros 10 dias de vigência da lei, o registro de acidentes com mortes caiu pela metade. Entre 20 e 29 de junho, o Detran registrou seis ocorrências fatais. De 10 a 19 do mesmo mês foram 12. O mês de julho também começou com estatísticas baixas: em 10 dias, foram cinco acidentes com morte.
O Detran encaminhou um ofício à Polícia Civil com um pedido para o IML enviar os exames dos cadáveres resultantes de acidentes de trânsito. Assim, o órgão poderá fazer uma relação concreta entre as ocorrências e o consumo de álcool. ;Não culpo unicamente a bebida como responsável por acidentes. Mas é um dos fatores que influenciam. A lei veio para acabar com esse fator;, aponta Tedeschi, que reconhece a importância de conscientizar os motoristas para reduzir os números de acidentes ainda mais. Nos próximos 10 dias, uma nova campanha educativa será lançada. Depois de ressaltar a importância de usar o cinto de segurança e os perigos de conversar por celular ao volante, o Detran focará as propagandas no motociclista e no respeito à faixa de pedestres.
Enquanto isso, os agentes continuam atentos à embriaguez ao volante. De 1º de janeiro até ontem, o Detran autuou 863 brasilienses por dirigirem sob influência de álcool ou outras substâncias entorpecentes. São quatro condutores multados por dia, que, com a nova lei, ficam obrigados a pagar R$ 957 de multa, além de estarem sujeitos à suspensão da carteira de motorista por 12 meses.
Depois que descobriu a ;Corrente do Goró;, troca de mensagens por motoristas avisando os locais de blitzes, o órgão de trânsito decidiu mudar a estratégia de fiscalização e, agora, faz operações relâmpagos em diferentes pontos do DF. ;A cultura do brasileiro é defender o bandido e não ajudar a polícia;, reclama o diretor-geral do Detran. Os agentes do órgão passaram a madrugada de ontem de plantão no Recanto das Emas e multaram mais um motorista embriagado.
Alternativas
Apesar de o Sindicato dos Bares, Hotéis e Restaurantes (Sindhobar) decidir que não ofereceria transporte para os clientes, ainda surgem iniciativas de alguns empresários para garantir o consumo de bebidas alcoólicas nos estabelecimentos. Donos de seis bares e restaurantes do Plano Piloto fecharam um convênio com uma empresa de motoristas e oferecem um sistema delivery para quem não quer abrir mão da cervejinha nem desrespeitas a legislação. Por um preço que varia entre R$ 10 e R$ 30, o cliente pode pagar para um profissional levá-lo em casa no próprio carro. O serviço está disponível para quem mora em todo o DF. Participam da iniciativa, chamada de ;Escolta Amiga;, Beirute, Bräuhaus, Carpe Diem, Chiquita Bacana, Gate;s Pub e Líbanus.