postado em 18/07/2008 08:35
Embora a Lei Federal nº 11.705/08 proÃba qualquer quantidade de álcool no sangue de quem esteja dirigindo, o consumo de apenas uma dose de algumas bebidas pode não comprometer a autorização para assumir o volante. O teste do bafômetro se mostrou incapaz de detectar uma dose de licor consumida minutos antes. As cervejas sem álcool vendidas nos supermercados também foram absolvidas pelo teste, mesmo tendo 0,5% de teor alcoólico ; Ãndice vendido pelos fabricantes como se fosse de 0%.
O Correio convidou quatro mulheres, com alturas e pesos parecidos, para testar o bafômetro. Três tomaram cerveja sem álcool ; cada uma experimentou uma marca. Uma delas ingeriu também uma dose de licor de avelãs e outra, além da cerveja, experimentou o creme de papaia com cassis. À quarta convidada foi oferecida apenas uma dose de licor de laranja. Foi justamente esta a única reprovada no teste do bafômetro: o aparelho indicou 0,34mg de álcool por litro de ar expelido.
Por quatro centésimos, a psicóloga Aline Valle de Carvalho, 29 anos, caso fosse flagrada ao volante, teria a carteira de habilitação suspensa por 12 meses, seria obrigada a pagar R$ 957,70 de multa e acabaria conduzida a uma delegacia para abertura de processo criminal por dirigir sob influência de álcool. Ela ficou impressionada com o resultado: ;Apenas uma dose e eu já não poderia dirigir?;.
Sensibilidade
Especialistas consultados pelo Correio alertam que a reação ao álcool varia de pessoa para pessoa e, em geral, as mulheres são mais suscetÃveis aos efeitos das bebidas do que os homens por, entre outros fatores, possuÃrem menos água no organismo. Assim, o álcool torna-se mais concentrado no corpo feminino, potencializando as reações tÃpicas do abuso da substância, como fala pastosa e falta de equilÃbrio.
;As mulheres têm menos enzimas (moléculas orgânicas que aceleram as reações quÃmicas) que são responsáveis pela metabolização do álcool no corpo humano;, explica o toxicologista Arthur Guerra, presidente do Centro de Informações sobre Saúde e Ãlcool (Cisa), uma ONG de São Paulo. ;Outro fator que deve ser levado em consideração é que a massa corporal, menor nas mulheres, facilita a intoxicação pelo álcool;, acrescenta ele.
No entanto, o teste realizado pela reportagem, em parceria com o Departamento de Trânsito do Distrito Federal, revelou que as quatro brasilienses não foram prejudicadas ao ingerirem pequenas doses de bebidas. A também psicóloga Maria Cândida Muniz Trigo, 33, provou o licor de avelã e foi aprovada pelo bafômetro: zero de alcoolemia. As três marcas de cerveja sem álcool também não alteraram a condição das convidadas que as consumiram. As estudantes Mayara Cristina Costa e Silva e Laise Cristina Costa, ambas de 21 anos, só reclamaram do gosto dos produtos ; para elas, muito diferente do sabor da cerveja comum, que contém 4,8% de álcool.
Doce liberado
Sobremesa bastante apreciada pelos brasileiros, o creme de mamão leva licor de cassis na receita. O álcool contido na iguaria também não obriga quem a consome à s penalidades previstas pela lei seca. Mayara comeu uma porção semelhante à s que são servidas nos restaurantes da cidade e teve 0,07mg de alcoolemia detectado pelo bafômetro. Se a marca fosse 0,03mg maior, a estudante poderia ter perdido a carteira de motorista e teria de pagar a multa que equivale a cinco vezes o valor de uma infração gravÃssima.
O teste não absolveu por completo o consumo das bebidas oferecidas à s convidadas pela reportagem. Apenas provou que quantidades mÃnimas dos produtos escolhidos não comprometem a capacidade de a pessoa dirigir nem vão acarretar as punições previstas em lei aos motoristas que beberam antes de assumir o volante de seus carros.
;Tudo depende da quantidade ingerida e do tempo decorrido até o teste do bafômetro;, enfatiza o diretor da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Alberto Sabbag. Mas o médico alerta que não há doses de segurança. Ou seja, na dúvida, entregue a chave do carro para quem não bebeu. ;Em muitos paÃses, os próprios bares e restaurantes oferecem o bafômetro para o cliente. É a única forma de tirar a dúvida;, disse.
Chiclete e bala não têm efeito
Esse foi o segundo teste realizado pelo Correio na lei seca. Para provar o que é mito ou verdade, o jornal e o Detran convidaram o administrador de empresas Breno Lima Sant;Ana, de 31 anos, que experimentou alguns truques sugeridos pelos brasilienses e tirou a prova no equipamento que flagra motoristas embriagados ao volante. O resultado foi publicado na edição de 4 de julho.
Breno, que mede 1,75m e pesa 85kg, tomou duas latas de cerveja e fez o teste do bafômetro em seguida ; o Ãndice de alcoolemia detectado foi de 0,21 miligrama de álcool por litro de ar expelido. Se ele estivesse dirigindo, teria a carteira apreendida, pagaria multa de R$ 957 e, caso não houvesse alguém abstêmio e habilitado no carro, teria o veÃculo recolhido ao pátio do Detran.
O teste dos mitos começou com o antisséptico bucal, passou pela bala de aroma forte e terminou com um chiclete. Em todos os casos, houve variação do teor etÃlico detectado pelo bafômetro, mas não o suficiente para livrar o administrador da multa ou da suspensão da habilitação por um ano: ele só seria preso após a combinação cerveja e antisséptico bucal.
Segundo o chefe do Núcleo de Policiamento e Fiscalização do Detran, Francisco Saraiva, mesmo sem o teste do bafômetro estava claro que Breno havia ingerido bebida alcoólica, apesar de ele não estar cambaleante ou apresentar a fala enrolada.