Cidades

Universidades de Goiás preservam 50 mil peças da pré-história do DF

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postado em 24/08/2008 08:19
Instrumentos bicentenários de fazendas alagadas pelo lago de Corumbá 4, expostos pela UFG
Goiânia ; Quer conhecer a pré-história do Distrito Federal e Entorno? Pegue a BR-060. A 200km de Brasília, laboratórios e museus de universidades goianas guardam relíquias dos primeiros habitantes do Planalto Central. São cerca de 50 mil itens. De rudes ferramentas de pedras feitas por indígenas a requintados vasos de porcelana que enfeitavam os centenários casarões onde viveram senhores de engenho e suas famílias. O Centro-Oeste é ocupado pelo homem há pelo menos 43 mil anos. Há três décadas, arqueólogos tentam recuperar os pertences dos antigos ocupantes dos cerrados goiano e brasiliense para reconstituir o modo de vida dessa gente. Como a Universidade de Brasília (UnB) não tem curso de arqueologia, a maior parte dos estudos sobre os primeiros homens que habitaram o Planalto Central é feita pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e a Universidade Católica de Goiás (UCG).
Nessas duas instituições, os objetos pré-históricos são identificados, catalogados e bem preservados. Eles servem de estudo para pesquisadores brasileiros e estrangeiros, como o francês Antonie Lourdeau, 26 anos. Ele tem ido freqüentemente a Goiânia nos últimos três anos para analisar instrumentos feitos de pedras por índios há 2 mil anos. São objetos cortantes, como pontas de lança, usados principalmente na caça e pesca. Todos encontrados nos anos 2000 em escavações no DF. Antonie Lordeau estuda sítios arqueológicos do Centro-Oeste Lourdeau passa horas debruçado sobre as pedras no laboratório de arqueologia da UCG. ;Elas foram encontradas entre Ceilândia e Samambaia, durante uma obra de saneamento. Fazem parte de um período histórico que me atrai e é objeto do meu doutorado na França;, explicou o jovem arqueólogo, em bom português. Ao lado dele, estudantes do curso de arqueologia da UCG ajudam na identificação e reconstituição de objetos resgatados em sítios arqueológicos, como cerâmicas e porcelanas.
Arte rupestre
A primeira grande contribuição para o resgate da pré-história candanga foi dada por arqueólogos goianos e cariocas integrantes do Projeto Bacia do Paranã, da UFG. Por dois anos, na década de 1970, eles exploraram as cavernas da bacia hidrográfica do Rio Paranã. O resultado do trabalho deu origem à publicação de um relatório detalhado sobre a fase pré-cerâmica e de arte rupestre do Planalto Central, em 1977. Quase 15 anos depois, vieram as primeiras pistas de sítios pré-históricos sob o solo do DF. Elas foram encontradas pelo arqueólogo goiano Eurico Miller, na região do Gama. Em 1991, Miller deparou-se com dois sítios em antiga região de mata densa, derrubada em 1960. Neles, havia restos de cerâmica e artefatos de pedra, espalhados nas cabeceiras do Córrego Ipê, onde hoje está a Universidade Holística Cidade da Paz. No Ribeirão Ponte Alta, Miller e um grupo de exploradores encontraram vestígios de quatro sítios arqueológicos. Segundo o especialista, o achado indica que ali havia uma aldeia indígena, de formato circular, característica de um povo conhecido como Jê. Ainda na Ponte Alta, foram encontrados outros dois sítios, com artefatos de cerâmica feitos pelos homens, um deles bem maior e também de formato circular.
Fragmentos de cerâmicas e vasos: em perfeito estado e resgatados no Distrito Federal e Entorno

Pinturas rupestres são atrações em grutas no município de Formosa
Nos pastos e plantações de algumas fazendas de Formosa (GO), homens, cavalos, bois e outros bichos pisam sob ferramentas fabricadas entre 4 mil e 12 mil anos atrás. Machadinhas, pontas de lanças e outros artefatos estão espalhados por propriedades rurais. E esses não são os únicos tesouros pré-históricos desprotegidos no município, distante 80km de Brasília. Pinturas rupestres feitas pelos primeiros habitantes do Planalto Central enfeitam sete das 29 grutas catalogadas no território de Formosa. Os homens das cavernas também deixaram gravuras em dezenas de paredões e pedras encravadas no cerrado. As pinturas das grutas de Formosa estão nítidas, levando-se em conta o desgaste sofrido ao longo de tanto tempo de exposição. Algumas foram feitas a até 7,5 metros do solo. A maioria tem um só tom: vermelho, laranja, vinho e preto. Poucas têm associação de duas cores. As representações são variadas. Algumas gravuras se referem a animais, como tatus e veados. Também há marcas de pés, com quatro, cinco e seis dedos e desenhos primários de pessoas. Mas há muitas gravuras ainda não decifradas pelos cientistas. Elas têm formatos geométricos e tradições astronômicas. Os pesquisadores supõem ser retratos do céu, das diversas constelações.

; Expedições
Desde o fim do século 19, quatro expedições científicas visitaram as grutas e sítios arqueológicos de Formosa. A maior contribuição foi dada por arqueólogos goianos e cariocas que fizeram parte do Projeto Bacia do Paranã, da Universidade Federal de Goiás. Por dois anos, na década de 70, eles exploraram as cavernas da bacia hidrográfica do rio Paranã. O resultado do trabalho deu origem à publicação de um relatório detalhado e único sobre a fase pré-cerâmica e de arte rupestre do Planalto Central, em 1977. Os arqueólogos concluíram que, devido aos traços finos, os desenhos das grutas de Formosa foram feitos com instrumentos fabricados só para a arte, como pincéis de madeira. No caso das pinturas maiores, eles supõem que os homens das cavernas usaram os próprios dedos para fazer os contornos. Já as tintas, à base do extrato de sementes, tinham formas variadas. ;;Na maior parte das sinalizações a tinta foi utilizada em estado pastoso e, só secundariamente, em estado sólido ou semi-sólido;;, descrevem os pesquisadores no relatório do Projeto Bacia do Paranã.
Oficinas líticas
O estudo também traz o primeiro registro de oficinas líticas na região. As oficinas são pontos com vestígios de ferramentas e utensílios fabricados pelos homens das cavernas. Os pesquisadores encontraram 1.350 peças na área rural de Formosa. Os artefatos e fósseis humanos e animais coletados foram para o Museu Antropológico de Goiânia. Desenhos como os das grutas de Formosa, no Brasil, foram encontrados somente em Sete Cidades, no Piauí. Eles também estão em outros continentes, o que intriga os pesquisadores, já que na pré-história não havia meios de comunicação e de transporte. Os homens ainda não usavam nem mesmo cavalos para se locomover.
Baixo-relevo
Além das pinturas rupestres, Formosa tem outras relíquias pré-históricas. Os homens das cavernas também deixaram pistas de seu cotidiano em diversos paredões. Mas, em vez de tintas, eles usaram ferramentas para desenhar em arenitos, uma rocha frágil. As gravuras em baixo-relevo, classificadas como petroglifos no meio científico, têm as mesmas formas das encontradas nas grutas. Um dos pontos mais conhecidos com esse tipo de arte está a 65km de Formosa. É preciso seguir pela BR-020 na direção de Fortaleza (CE). O sítio arqueológico fica na região conhecida como Bisnau. O acesso também é complicado, infestado de animais silvestres e só deve ser feito na companhia de guias. No fim da tarde, com o sol se pondo, a sombra produzida no baixo-relevo destaca a forma da gravura com o contraste da pedra. COMO CHEGAR SÍTIO DO BISNAU Entrada no Km 46 da BR-020,45km após Formosa. Após deixar a rodovia, siga de carro por uma trilha de terra. São cerca de 5m até a pedra. A visita é gratuita. TOCA DA ONÇA Pegue a GO-116, em direção ao Salto do Itiquira. Ande 2km pela rodovia asfaltada e entre no primeiro acesso à direita. São 7km até a porteira da Fazenda Pedra, onde ficam as grutas. Para informações sobre guias turísticos e agendamento de visita, ligue 3631-4478. Preço da visita: R$ 10 por pessoa. SAIBA MAIS História da terra do homem no Planalto Central ; eco-história do Distrito Federal, do indígena ao colonizador, de Paulo Bertran. Editora Verano, 2000, 270 páginas
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