postado em 27/08/2008 08:18
A Força Nacional de Segurança pode ter reduzido a violência no Entorno, como propagado pelo Governo Federal, mas não conseguiu inibir a máfia da jogatina. Os bingos continuam em funcionamento e alimentando o crime organizado na região, sem sofrer repressão das polícias goianas. As casas com máquinas permanecem abertas o dia inteiro, sob proteção de homens armados que andam em grupo e circulam em carros com vidros escuros para intimidar quem ameaça atrapalhar o negócio ilegal.
É desnecessária uma grande investigação para saber onde e como funcionam os bingos no Entorno. Uma equipe do Correio passou o fim da tarde de segunda-feira em Valparaíso. Em meia hora, a reportagem encontrou três grandes bingos no município goiano distante 35km da Esplanada dos Ministérios. Bastou seguir as dicas dos moradores. Apesar de não haver placas nas fachadas, todos sabiam onde estão instaladas as casas de jogos eletrônicos.
Os três bingos têm características semelhantes: muro alto chapiscado, portão de ferro colorido, guarita com vidro espelhado, estacionamento privativo lotado com carros de Brasília e uma passagem lateral que dá acesso a um galpão sem janela, cercado por aparelhos de ar-condicionado. Todos os muros têm ao menos um buraco próximo ao portão. Por ele, os funcionários vigiam o movimento do lado de fora.
O maior dos bingos visitados pelo Correio fica a menos de 1km da divisa Goiás/DF, em frente ao Play Motel, na Rua 9, paralela à movimentada BR-040. O muro pré-moldado cerca metade do quarteirão. A entrada se dá por um portão amarelo, nos fundos do galpão, que fica em frente à rodovia. O portão só abre quando chega um carro com placa da capital federal. E fecha logo após a entrada do veículo.
Reincidência
A casa foi tema de matéria do Correio em setembro de 2007 (leia Memória). Na época, os repórteres flagraram homens armados na entrada do estacionamento do galpão. A polícia goiana agiu só após a denúncia. Mas não apreendeu máquina nem prendeu suspeitos.
Na mesma rua, três quarteirões depois, atrás de uma loja de uma grande rede vendedora de eletrodomésticos, funciona outro bingo. Pouco menor do que o primeiro, mas com a mesma rotina. O acesso também se dá por um portão amarelo. Nos últimos três anos, após série de matérias do Correio, essa casa foi fechada duas vezes. Mas as máquinas de vídeo-bingo acabaram retiradas antes da chegada da polícia. Ninguém foi preso.
Do outro lado da BR-040, perto do Valparaíso Shopping, o terceiro bingo. É um novo ponto de jogatina. O acesso ocorre por uma rua de terra, paralela à estrada federal, mas escondida por um enorme galpão que serve de comitê eleitoral. Por um portão azul em um muro sem pintura e de esquina, o entra e sai de veículos de Brasília é intenso. Por uma fresta no portão, foi possível ver mais de 30 carros estacionados e quatro homens caminhando entre eles. Na lateral, a entrada para o galpão verde limão. De fora, vêem-se as luzes dos caça-níqueis em meio à escuridão.
No município, a ilegalidade é mantida com o apoio de capangas armados. Quatro deles tentaram cercar a equipe do Correio na tarde de segunda. Quando o carro de reportagem passava pela Rua 9, dois carros brancos fecharam a passagem na esquina do Play Motel e do bingo de muro da cor azul. Os homens desceram e pararam no meio da via com uma das mãos sob a camisa. O veículo do jornal desviou do bando e pegou a BR-040. Durante a apuração, um Vectra novo, de cor prata, seguiu o carro do jornal pelas ruas empoeiradas onde ficam os bingos. O mesmo ocorreu todas as vezes em que a reportagem esteve na cidade fazendo matéria sobre jogatina.
Esquema grande
O Ministério Público de Goiás (MPGO) reconhece a força da máfia dos jogos de azar no estado e denuncia o envolvimento de policiais na rede. ;O esquema é muito grande. Eles têm informantes em todos os lugres, o que dificulta a repressão;, afirma a promotora Alice de Almeida Freire Barcelos, coordenadora do Centro de Apoio Operacional Criminal do MPGO.
Ela revela que em apreensões realizadas pelo MPGO em conjunto com policiais goianos foram encontradas máquinas apreendidas anteriormente e que deveriam ser destruídas ou ficar guardadas em delegacias. Parar ela, isso comprova a relação dos mafiosos com agentes das forças de segurança. Agora, o MPGO quer montar uma força-tarefa para combater a jogatina. A proposta foi apresentada em 24 de julho, mas falta a resposta do Governo de Goiás.
Responsável pelas delegacias do Entorno Sul, o delegado-regional José Luís Martins de Araújo diz que a Polícia Civil goiana ;tem feito várias ações para coibir esse tipo de atividade;. Ressaltou que ;as delegacias da região estão abarrotadas de caça-níqueís;. Mas não apresentou estatísticas de apreensões e prisões nem explicou porque bingos continuam abertos nos mesmos lugares há pelos menos quatro anos. Nem o que fará contra os homens armados que dão proteção à máfia da jogatina.