Cidades

Erro em cirurgia plástica leva médicos a tribunal

Pela primeira vez no DF, cirurgião e anestesista serão submetidos a júri popular, sob a acusação de provocar a morte de uma paciente

postado em 05/09/2008 08:25
A família de Sônia Isis de Andrade esperou 10 anos por esta notícia. Os médicos responsáveis pela cirurgia que matou a mulher de 47 anos em 1998 vão a Júri Popular, ainda sem data marcada. O anestesista Orlando Gomes de Souza e o cirurgião plástico Valter Simões Deperon são acusados de realizarem o lifting facial ; técnica para rejuvenescimento da pele ; sem as condições adequadas. A sentença, de 6 de agosto, é do juiz substituto da Vara do Tribunal do Júri de Brasília, Fábio Francisco Esteves. Será a primeira vez que médicos de Brasília responderão pela morte de paciente, de acordo com o Conselho Regional de Medicina (CRM). Os dois aguardarão o julgamento em liberdade. A tragédia ocorreu no sábado 3 de janeiro de 1998, no Centro Médico Hospitalar de Brasília (Centromed), uma clínica particular, hoje desativada, no Guará. Sônia havia pago R$ 2 mil pelo serviço. Às 11h30, entrou na sala de cirurgia. Entre 12h e 15h, sofreu uma parada cardiorrespiratória: o anestésico aplicado na veia da paciente não interagiu bem com o medicamento que ela usava para combater a bronquite aguda. A mulher entrou em coma e, dois depois, morreu no Hospital Brasília, no Lago Sul, vítima de hipoxia cerebral (falta de oxigênio no cérebro). De acordo com a denúncia do Ministério Público, aceita pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, os médicos sabiam que Sônia tinha bronquite e fazia uso de xaropes. O promotor de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde Diaulas Costa Ribeiro relata que o Centromed não possuía Unidade de Terapia Intensiva (UTI) nem medicação apropriada para reanimar a paciente. Ainda segundo a denúncia, os eletrodos que poderiam ter identificado mais cedo a parada cardiorrespiratória não estavam ligados a Sônia porque o único monitor existente na clínica não funcionava. Quando uma equipe de UTI chegou ao local, já não havia muito o que fazer. Ouça: Sandra Andrade comenta a decisão da Justiça de mandar para Júri Popular o caso que resultou na morte de sua irmã Sônia Andrade em 1998. Em trecho da denúncia recebida pelo TJ em abril de 1999, o promotor sustenta que a cirurgia foi realizada ;sem que estivessem asseguradas as condições mínimas para tanto;. Na sentença em que acata essa tese, o juiz Fábio Esteves diz que há no processo indícios de crime doloso na modalidade dolo eventual (quando não há intenção de matar, mas se assume o risco de fazê-lo). Em sintonia com o discurso do MP, o magistrado alega que os denunciados usaram a clínica no Guará ;sem as condições adequadas para a realização da cirurgia;. Absolvição O Conselho Regional de Medicina analisou o caso em fevereiro de 2002 e decidiu pela absolvição de Valter Deperon. ;Do ponto de vista ético, não ficou comprovado que ele cometeu infração;, justificou o segundo secretário do CRM, Luiz Fernando Salinas. O anestesista Orlando Souza, que na época da cirurgia era diretor técnico e clínico do Centromed, foi punido com uma suspensão de 30 dias. Não era a primeira vez que Orlando figurava como denunciado no CRM. Em 2001, ele havia tido o registro profissional cassado por comandar uma cirurgia como a de Sônia, também em 1998, em que a paciente saiu gravemente lesionada. A cassação só foi confirmada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) em 2004. De 2001 a 2004, portanto, o médico exerceu a atividade livremente. Orlando não foi localizado ontem pela reportagem. O cirurgião Valter Deperon, que continua a atuar em dois consultórios de Brasília, pediu que o Correio entrasse em contato com o advogado José Gomes, que cuida do caso. Para Gomes, não há no processo elementos que apontem a morte de Sônia como crime doloso. Por isso, ele recorreu da decisão na semana passada. O pedido ainda não foi analisado. ;O juiz não leu o processo. Existe uma grande confusão entre as funções do médico anestesista e as do cirurgião plástico;, comentou o advogado. Levantamento do CRM mostra que o número de sindicâncias instauradas envolvendo cirurgias plásticas tem aumentado nos últimos anos. Em 2004, foram 11. No ano passado, o número pulou para 19. A maioria dos pacientes procura o conselho para reclamar do resultado das intervenções. Dos 25 médicos envolvidos nas denúncias de 2007, 14 não eram especialistas. O problema não se restringe ao DF. Entre 2005 e 2007, o Conselho Federal de Medicina apreciou 24 casos de erros médicos em cirurgias plásticas. ;As pessoas têm procurado as clínicas pelo preço e não vêem nem se o local é apropriado. O perigo é que tem muito médico fazendo cirurgia por aí sem conhecimento algum;, alertou o defensor público de Taguatinga André de Moura Soares. Só este ano ele cuidou de dois casos em que pacientes acabaram lesionados por cirurgias malsucedidas. Leia reportagem completa na edição impressa do Correio Braziliense desta sexta

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