Cidades

Malvisto pelo Vaticano, ex-frade tem participação cancelada em encontro

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postado em 20/10/2008 08:10
A participação de Leonardo Boff no encontro que marcou os 800 anos do carisma de São Francisco ainda consta na agenda exposta no site dele. A passagem aérea para Brasília, onde cerca de 1,2 mil leigos e religiosos franciscanos de 12 países se reuniram no último fim de semana, estava comprada. A hospedagem do teólogo e ex-frade havia sido reservada em uma casa de família. A desistência da viagem veio três dias antes do início do evento. Boff decidiu ficar no Rio de Janeiro, onde mora, ao ser avisado de que o arcebispo de Brasília, dom João Braz de Aviz, e a Nunciatura Apostólica, que representa o Vaticano no Brasil e tem sede na capital federal, teriam feito restrições à presença dele na reunião. A palestra de uma hora e meia que o teólogo daria na tarde de sábado não ocorreu. E a notícia revoltou os participantes. Boff é conhecido por defender opiniões incompatíveis com a doutrina da Igreja Católica. Foi ele quem ajudou a consolidar no Brasil a Teologia da Libertação, corrente cuja boa parte dos pensamentos desagrada ao Vaticano. Em 1992, após várias ameaças de punição, ele desligou-se da Ordem Franciscana e largou o sacerdócio. Na noite da última terça-feira, a presidente da Família Franciscana do Brasil, Maria Vilani Rocha de Oliveira, recebeu um e-mail de dom João. Em uma carta anexada, segundo Maria Vilani, o arcebispo mostrava-se preocupado com a programação do encontro. ;Dom João disse que havia ali nomes de pessoas que não estavam em comunhão com a Igreja;, afirmou a religiosa. Ela entendeu o comunicado como uma indireta à participação de Boff e resolveu, então, comunicá-lo da situação. ;A gente sabe que era por causa dele;, ressaltou Vilani. A suspeita foi reforçada quando, ainda na semana anterior ao encontro, Maria Vilani recebeu uma ligação de um representante da Nunciatura Apostólica reforçando o que dissera dom João na carta. Na sexta à noite, quando o encontro começou no Colégio Santo Antônio (911 Sul), muita gente já sabia que Boff não viria. ;É uma discriminação de gente que não pratica o Evangelho. Na Igreja, todos temos o direito de falar;, protestou o frei colombiano Luis Patinho, 80 anos. ;Mas os últimos serão os primeiros;, completou o frade, citando uma passagem bíblica. Decepcionados, alguns participantes prometiam ontem, durante o encerramento, entregar uma carta de repúdio à postura da Igreja de Brasília diante desse episódio. ;De certo modo, o que ocorreu foi uma censura. Por mais que ele (Leonardo Boff) tenha deixado a Igreja, continua sendo franciscano;, comentou a irmã Guiomara Godoi, que mora em Curitiba (PR). A missa de encerramento do encontro seria celebrada por dom João, na Igreja Nossa Senhora de Fátima, na 906 Sul. Mas ele não apareceu na celebração. Para o senador Pedro Simon (PMDB-RS), franciscano e participante do encontro, o constrangimento poderia ter sido evitado. ;Faltou diálogo;, opinou o senador. Caminhada franciscana Com a chateação pela ausência de Leonardo Boff entalada na garganta, os franciscanos reunidos em Brasília fizeram, na manhã de ontem, uma caminhada pela Esplanada dos Ministérios para encerrar o encontro. Vestidos com camisetas brancas, seguiram acompanhados de um trio elétrico até a Praça dos Três Poderes. Ao som de músicas religiosas, balançavam bandeiras com os dizeres ;Paz e Bem;, a típica saudação franciscana. Uma das coordenadoras do encontro, irmã Maria Fachini, fez questão de deixar claro que, apesar do mal-estar provocado, a ;prensa; em Boff não atrapalhou o andamento dos trabalhos. ;Ele (Leonardo Boff) já está acostumando com isso. E o carisma franciscano é maior que essas coisas;, argumentou. No entanto, ela não conseguiu esconder a decepção: ;Foi um ato de autoritarismo. São Francisco respeitava as diferenças;. Na rampa do Palácio do Planalto, o vice-presidente da República, José Alencar, e o presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), aguardavam os franciscanos. Os políticos receberam uma cópia da ;Carta aos Governantes;, documento que faz uma releitura de um texto entregue por Francisco de Assis aos governantes de sua época. Após ouvir a leitura da carta, Alencar surpreendeu ao convidar a todos a subir a rampa do palácio e saudá-lo de perto. O vice-presidente posou para fotos com os participantes do encontro e exaltou o carisma

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