postado em 17/11/2008 08:06
;Saí da cidade e vim para a roça, mas agora tenho que colocar
cerca na casa, criar cachorro, colocar cadeado e, ainda assim, viver com medo;.
A frase de um produtor rural da região de Planaltina mostra que calma e tranqüilidade, palavras que traduzem a vida no campo, não se aplicam à realidade de quem vive fora das cidades no Distrito Federal. Estradas escuras, problemas de comunicação e presença de bandidos entre os funcionários são fatores que contribuem para diminuir a segurança das 141 mil pessoas que vivem em 20 mil imóveis rurais no DF.
Abraão Lopes Barros, 38 anos, trabalha duro para manter bem a lavoura de hortaliças no Núcleo Rural Rajadinha, área de Planaltina. Com o que ganha vendendo tomates, jilós e outros produtos para mercados da cidade, tenta dar algum conforto a si mesmo e à mãe, de 73 anos, com quem mora. Há quase um ano, no entanto, muito do que conquistou foi levado por bandidos armados, que invadiram a chácara onde ele vive há 12 anos. ;Foi no dia 23 de dezembro. Era começo da noite, umas 19h15. Estava assistindo televisão. Minha mãe foi lá fora fazer alguma coisa e o ladrão já botou a arma na cabeça dela;, relata.
O agricultor tinha uma uma escopeta de repetição calibre .12 em casa. ;Mas eles chegam de surpresa e não adianta de nada ter arma. Muito pelo contrário. Eles sabiam que eu tinha a escopeta e levaram junto com televisão, DVD, calçados, perfume... Tudo que conseguiram colocar no carro;, enumera. Os dois invasores usavam capuzes e estavam muito nervosos. Prenderam mãe e filho em um dos quartos e saíram cantando pneus na pista que leva ao Vale do Amanhecer e ao Plano Piloto.
A vítima ligou para a polícia assim que se viu livre dos assaltantes, mas nunca mais teve notícia de seus pertences. Arma não quis mais. ;Agora, me apego em Deus, porque é só ele que protege. Para ajudar, coloquei uma cerca na casa e estou criando cachorros;, explica.
Cães
Os cães, um rottweiler e um fila, também são a única defesa do agricultor e comerciante Sérgio da Silva, 56, que também vive na região de Planaltina, onde existem 45 comunidades rurais. Ele cuida da lavoura e de uma pequena mercearia que atende aos moradores da área e já foi alvo de assaltantes por duas vezes. ;A primeira foi há quatro anos. Estava preparando a família para ir a um aniversário, quando eles chegaram. Eram quatro. Estavam encapuzados, mas reconheci como gente da região pela voz. Um deles até vacilou e me chamou de ;seu; Sérgio;, recorda.
Clientes que chegaram ao comércio também foram assaltados pelos bandidos, que carregaram dois carros da família com o produto do roubo e foram embora sem problemas. ;Foram duas horas de terror. Ameaçaram todo mundo e teve um que atirou em mim, só que errou e acertou a parede;, conta. Os ladrões também levaram de Sérgio um revólver calibre .38, que ele não teve a oportunidade de usar. ;Depois de um tempo, eles assaltaram várias outras chácaras e a polícia pegou e recuperou minhas coisas. Da arma eu nem quis saber mais;, completa ele, que foi assaltado de novo três anos depois e não quis ligar para a delegacia por não acreditar em uma solução.
;Dessa outra vez, foram dois que chegaram de carro enquanto eu estava tirando leite, às 6h. Pediram um pacote de arroz, mas levaram quase todas as mercadorias;, conta. Antes de sair, os dois amarraram Sérgio com fita adesiva e ainda agradeceram. ;Foi o que mais me deixou com raiva;, afirma. Um amigo do comerciante resolveu ligar para a polícia. ;Mas a PM só apareceu 40 dias depois. Aqui é perigoso e não tem jeito. Estamos abandonados;, admite, com descrença.
DICAS
Cuidados que o produtor rural deve ter para minimizar os riscos
de assalto à propriedade
- Não deixar equipamentos de valor à vista em casas que ficam perto da pista
- Não deixar que desconhecidos saibam que existe uma arma na propriedade
- Pesquisar, na delegacia da cidade, se os funcionários têm
alguma passagem pela polícia
- Não contratar pessoas que não tenham documentação
- Guardar o telefone de policiais responsáveis pela ronda na área
Falha na comunicação
Falha na comunicação
Agricultores de cidades como Brazlândia, Planaltina e Santa Maria correm o risco, inclusive, de não conseguir contato com a polícia quando precisam. ;Eles ligam no 190 e, por causa de problemas no sistema, a ligação vai para a PM de Goiás ou Minas Gerais, que nem sempre nos repassa as ocorrências;, admite o chefe do Comando de Policiamento Regional Leste, coronel Edilson Rodrigues. ;Por isso, na área rural de Planaltina, que corresponde a 25% do território de todo o DF, disponibilizamos dois números de celular que até queria pedir para vocês divulgarem ;, completa.
Os números ficam com PMs que fazem rondas na região. ;Temos um grupamento específico para atender a área. São quatro postos comunitários e quatro viaturas;, informa Rodrigues. Os policiais que atuam no local não são trocados há três anos porque conhecem bem as inúmeras estradas e atalhos, além dos próprios produtores rurais. ;A confiança é tanta que temos conosco 140 chaves de propriedades de lá;, atesta o coronel. Funcionários das próprias propriedades rurais, segundo o militar, se envolvem em assaltos.
Os produtores reclamam mais canais e menos problemas de comunicação. ;Sempre reclamamos com a Secretaria de Segurança, mas não há respostas;, diz o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do DF, Renato Simplício.
O Correio entrou em contato com a Secretaria de Segurança e recebeu a informação, via assessoria de comunicação, que as políticas públicas de combate à violência rural estão sendo formuladas pelo órgão em conjunto com os conselhos de segurança das zonas rurais. Na maior delas, Planaltina, esse conselho, no entanto, não está funcionando, segundo o coronel Rodrigues. ;Mas estamos conversando com os produtores para reativá-lo;, promete. Não há previsão de quando as políticas públicas serão aplicadas.
CONTATOS
PM da zona rural de Planaltina: 8426-1602 e 9137-3280