postado em 18/11/2008 08:07
Para ter uma noite de sono tranqüila, a funcionária pública Iane Cláudia de Almeida, 37 anos, precisa sair de casa. Ela mora no condomínio Jardins do Lago, no Setor Jardim Botânico, a menos de 20 metros da casa de festas Villa Patrícia. Em dias de confraternizações ou casamentos, o vaivém de carros e a música incomodam os moradores vizinhos, que travam na Justiça uma batalha pelo fechamento do salão de eventos. ;É impossível dormir por causa do barulho. Nos fins de semana, fico acordada até os convidados irem embora, o que nunca acontece antes das 3h;, reclama Iane.
O empreendimento funcionou nos últimos sete meses sem alvará e chegou a ser interditado pela Agência de Fiscalização do Distrito Federal. No último dia 10, a Procuradoria do DF emitiu parecer contrário à concessão do documento. Mas quatro dias depois, a Administração Regional do Jardim Botânico emitiu autorização para o funcionamento do local. Para a concessão do alvará da Villa Patrícia, a casa de festas obteve a anuência de 83% dos vizinhos. Mas os moradores dos lotes limítrofes ; justamente os mais incomodados ; não foram ouvidos.
Os proprietários da casa negam qualquer tipo de transtorno e garantem que o volume de som dos eventos é medido a cada meia hora, para evitar incômodos à vizinhança. Mas um grupo de moradores do Jardins do Lago vai recorrer à Justiça para tentar suspender o alvará da Villa Patrícia. Eles reclamam do barulho e também do trânsito intenso nos dias de evento.
Na luta para garantir o sossego no condomínio, a comunidade já procurou o Ministério Público do DF, a Procuradoria do Distrito Federal, a 30ª Delegacia de Polícia, a Administração Regional do Jardim Botânico, o Fórum do Paranoá e a Agência de Fiscalização do GDF. Os documentos encaminhados a todos esses órgãos somam mais de 400 páginas. Os moradores documentaram todos os pedidos de providências encaminhados às autoridades e à Justiça. Além dos ofícios, também há fotos das filas de carros que se formam em dias de festas.
O funcionário público Alberto Valério Souza, 42 anos, vive no conjunto B do condomínio Jardins do Lago, o mais próximo à casa de festas Villa Patrícia. Juntamente com os vizinhos, já recorreu a todos os meios legais e organizou abaixo-assinados contra o empreendimento. ;Quando tem festa, é impossível pegar no sono. Vamos acabar ficando doentes, já que ninguém consegue dormir;, reclama.
A briga contra a casa de eventos dura dois anos, desde que o local começou a funcionar. Um primeiro alvará foi expedido pela Administração Regional de São Sebastião em 2006. Em abril deste ano, o GDF revogou o documento, já que a responsabilidade pela área passou para a Administração do Jardim Botânico. No início do ano, a promotora de Justiça Liz Elainne de Silvério expediu recomendação para que não fosse concedida mais nenhuma autorização à casa de festas. ;O estabelecimento em questão possui insanável falta de condição de funcionamento, emitindo sons e ruídos acima dos permitidos para áreas residenciais;, argumentou a promotora.
Nos últimos dois anos, moradores do Jardins do Lago registraram 11 ocorrências policiais para reclamar do barulho na Villa Patrícia. A primeira foi registrada na 30ª DP no dia 15 de dezembro de 2006. A última foi no dia 9 de outubro deste ano. Em junho, a 30ª delegacia lavrou um termo circunstanciado em desfavor da casa de festas, enquadrando o caso no artigo 42 do Decreto Lei nº 3.688/41, que trata da perturbação do trabalho e sossego alheios.
Em maio, os proprietários pediram um novo alvará de funcionamento. Mas continuaram a abrir as portas antes da emissão do documento. No dia 26 de junho, a Subsecretaria de Fiscalização emitiu auto de notificação contra a casa por funcionar sem alvará. No dia 2 de outubro, a recém-criada Agência de Fiscalização interditou a Villa Patrícia por descumprimento da notificação.
Liminar
Com a interdição, os donos buscaram uma liminar na Justiça para realizar todos os eventos já contratados, sendo o último previsto para o dia 14 de novembro de 2009. ;Inúmeros gastos foram feitos pelas contratantes, não se esquecendo dos aspectos emocionais envolvidos nesse tipo de evento. Os prejuízos de ordem patrimonial e moral seriam irreversíveis;, argumentaram. O TJDF concedeu a liminar, mas apenas para as festas marcadas para 3 e 4 de outubro deste ano, os dias subsequentes à interdição.
;Nós encaminhamos um abaixo-assinado com 47 nomes à Administração Regional do Jardim Botânico pedindo que o alvará não fosse concedido;, lembra o funcionário público Luís Otávio da Rocha, morador do condomínio. No último dia 10, quatro dias antes da concessão do alvará, o procurador do DF Wilson Rodrigues Damasceno emitiu um parecer contrário à liberação do documento. ;Existe um clamor público por sossego, garantia legal que não está sendo observada. Há infringência às regras urbanísticas e ambientais, porquanto a casa de festas funciona fora do zoneamento em imóvel residencial;, argumentou o procurador.
Na última sexta-feira, a Administração Regional do Jardim Botânico concedeu o alvará. O documento autoriza o funcionamento do local das 8h às 3h, de segunda a segunda. O administrador regional do setor, Fábio Barcellos, explica que emitiu o documento com base no decreto 29.566/08. ;Os proprietários apresentaram laudo do Ibram (Instituto Brasília Ambiental), comprovando que não há ruídos excessivos, e tiveram a anuência de 83% dos vizinhos, bem mais do que os 70% exigidos por lei;, explica Fábio. ;Se a Justiça mandar fechar o local, vamos acatar imediatamente. Mas, por enquanto, a emissão do alvará está totalmente de acordo com a lei;, acrescenta.