postado em 01/12/2008 08:05
O principal ponto de aliciamento de crianças e adolescentes para o tráfico e a prostituição infantil ocorre logo na entrada da Estrutural. É nas imediações de um galpão premoldado ; ponto de espera pelo transporte escolar ; que os criminosos escolhem suas vítimas. A denúncia é de uma moradora, mãe de uma adolescente de 14 anos que ficou desaparecida por 17 dias e hoje está escondida na casa de conhecidos.
A exploração sexual de crianças e adolescentes da Estrutural veio à tona com a prisão de Simone Silva, 31 anos, conhecida como bate-bucha ou tramontina, acusada pela polícia de aliciar e manter uma rede de prostituição infantil. Na última sexta-feira ela foi presa em uma chácara no Parque Estrela XII, bairro de Santo Antônio do Descoberto (GO), distante 44km de Brasília. A chácara, do irmão de Simone, Emerson Guedes de Farias, seria usada para manter as meninas em cárcere privado.
Antes de se mudar para lá, os programas aconteciam na Quadra 8 da Estrutural, um dos endereços com mais registros de homicídio no primeiro semestre deste ano (veja matéria na página 15). Abadio Alves Pereira, 77 anos, também acabou na delegacia. Segundo duas vítimas, ele era um dos homens que pagavam pelos favores sexuais. Emerson e Abadio foram liberados após serem ouvidos. Simone foi para o presídio feminino.
A moradora da Estrutural denuncia que os criminosos têm várias artimanhas para conquistar a confiança das meninas antes de forçá-las a se prostituírem ou trabalharem para o tráfico. Ela não sabe dizer o nome deles ou quantos são. ;Eles exploram a miséria material, aproveitam-se do abandono da família ou mandam outras garotas baterem e ameaçarem para então oferecer proteção. Depois, cobram os favores;, resumiu ela.
A filha dela virou alvo do grupo. Uma dia a menina chegou em casa toda machucada. Levou uma surra e recebeu ameaças de uma adolescente. ;Registrei ocorrência. Pouco tempo depois, ela apanhou da mesma garota na escola. Registrei outra queixa. Mas até hoje não deu em nada;, relatou. A mulher se assustou ainda mais quando a filha contou que Simone Silva lhe ofereceu proteção. ;Ela disse para minha filha que seria uma mãe para ela. Eu disse: ;Nada disso, você já tem mãe;;, relembrou. A menina recusou a ajuda e, mais tarde, foi surrada pela terceira vez. ;É uma perseguição ferrenha. Muitas cedem e acabam desse jeito.;
Outra estratégia dos bandidos é usar garotos para se aproximarem das meninas. Outras vezes, chamam para festas, pagam sorvetes e oferecem coisas simples que elas não podem ter em casa. Depois, começam as cobranças. Acuadas, muitas fogem de casa. ;É uma tentativa de escapar da pressão deles;, disse.
O galpão citado pela moradora fica a 500 metros dos postos das polícias Civil e Militar. A reportagem conversou com moradores e com os policiais de plantão. Todos se disseram surpresos com o caso. E que só tomaram conhecimento dos fatos quando a história foi veiculada pela imprensa. Em Santo Antônio do Descoberto, os freqüentadores de um bar próximo à chácara onde Simone Silva foi presa também afirmaram não saber de nada. O Correio localizou e entrevistou Abadio Alves, 77, um dos homens que, segundo a polícia, pagava entre R$ 10 e R$ 20 para ter relações sexuais com adolescentes exploradas por Simone.
Usando o mesmo chapéu azul descrito pelas vítimas de 14 e 15 anos, ele negou que pagasse para ter sexo com as meninas. ;Minha idade não dá mais para essas coisas;, disse Abadio. No entanto, ele confirmou conhecer Simone ;desde que ela era criança; e que ela foi à casa dele com duas adolescentes. ;Na primeira vez, ela trouxe as meninas para me conhecer. Depois, elas vieram sozinhas, pedindo dinheiro para ir embora. Dei R$ 10 para cada uma, abracei, beijei no rosto e só;, relatou.
Policiais da 8ª Delegacia de Polícia (SIA), onde o aliciamento é apurado, passaram o fim de semana investigando o caso. O delegado de plantão Paulo Francisco Pereira acredita que a prisão de Simone Alves deve encorajar outros pais a denunciar. ;Esse tipo de situação geralmente gera constrangimentos à família;, disse. De acordo com o delegado, todas as pessoas citadas no caso serão ouvidas novamente. ;Elas poderão ser indiciadas e até ter a prisão preventiva decretada;, afirmou.