Cidades

Gravidez de garota de 14 anos aponta para esquema de exploração sexual em hotéis

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postado em 11/12/2008 08:10
A jovem de 16 anos segura no colo um bebê de 11 meses. Ela tem pele morena e cabelos negros. A criança, cor branca e fiapos loiros. Segundo a adolescente, o menino é filho de um estrangeiro que esteve hospedado no Setor Hoteleiro Norte (SHN) da capital federal no início de 2007. O homem teria pago R$ 100 para fazer um programa com a garota, na época com 14 anos. Ela afirma que, durante dois meses, a situação se repetiu dezenas de vezes com outros hóspedes do hotel Garvey. De acordo com a menina, os programas ocorriam com a mediação do recepcionista do hotel, Luiz Antônio Capuzzo, 56 anos, acusado de aliciar jovens e mulheres para os clientes. Ele nega. Mas empregados do local e a polícia confirmam que hóspedes contam com o auxílio de funcionários para ter acesso às prostitutas. A chefe da Delegacia Especial de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), Glaucia Ésper, não tem dúvidas sobre a participação de Antônio no caso de prostituição infantil na área central de Brasília. Segundo ela, o relatório com o resultado das investigações aponta o homem como mediador entre hóspedes do Garvey e garotas de programa. Entre elas, adolescentes como a menina engravidada precocemente. ;A menina e outra garota (maior de idade) já o reconheceram e temos a confirmação de testemunhas. Para nós, a participação dele é certa;, afirmou a delegada, que apura a extensão do esquema. Indiciado por submeter a adolescente à prostituição e mediar a lascívia entre maiores, o acusado pode pegar até 13 anos de prisão, caso a Justiça o responsabilize pelos crimes. O Correio esteve no hotel Garvey, onde Antônio continua como recepcionista. Logo na entrada, um manobrista perguntou à reportagem: ;É para ver o negócio sobre a menina, não é? Prostituição nessa área rola solta;. O suspeito de aliciar a jovem que engravidou aos 14 anos de idade nega qualquer envolvimento com o crime. Admite que a jovem pode ter entrado no hotel para saciar o desejo de um hóspede, mas se defende dizendo que alguém teria usado seu nome. ;Alguns clientes procuram prostitutas e sei de hotéis que oferecem garotas. Mas, em 35 anos de hotelaria, nunca me envolvi com isso. Nunca vi essa menina;, afirmou ele, pai de três filhos e padrasto de duas adolescentes. Dez programas por noite Na tarde de terça, o Correio conversou com a adolescente de 16 anos e com a mãe dela. A princípio, a garota que carrega na barriga as estrias da gravidez indesejada evitou o assunto. Estava nervosa com a presença da reportagem, mas acabou revelando os detalhes da exploração sexual. Em fevereiro de 2007, ela fugiu de casa após discussões com a mãe. No Conic, conheceu uma mulher identificada como Alessandra, de aproximadamente 20 anos. ;Ela me falou sobre o negócio lá no hotel. Como não tinha onde dormir e nem o que comer, aceitei;, lembrou. No SHN, segundo a jovem, as duas foram abordadas por Antônio Capuzzo em frente ao Garvey. ;Ele pediu o número do meu celular para avisar quando o cliente quisesse um programa. Foi aí que tudo começou;, disse. Nos depoimentos das vítimas consta que o próprio Antônio as recebia e conduzia até os quartos. A adolescente chegou a fazer 10 programas em uma só noite. Em cada um, recebia R$ 100. Mas ficava com apenas R$ 20. ;Eu dava R$ 30 para o Antônio e R$ 50 para uma mulher com quem eu morei no Lago Azul, um dos bairros mais violentos do Novo Gama (GO), a 58 km de Brasília;, contou. De acordo com a jovem, uma colega que ela conheceu durante os programas a teria levado até a casa da mulher (identificada como Rose), que cobrava para que a garota passasse os dias no município goiano para se prostituir à noite. ;Estamos investigando os nomes citados;, observou a adjunta da DPCA, Alessandra Figueredo. A mãe da jovem ouvida pela reportagem foi quem denunciou o desaparecimento e a exploração sexual da filha à polícia. Ela conseguiu encontrar a garota em uma casa do Lago Azul, dois meses depois de a adolescente ter fugido. ;Até de prostituta eu me passei para ter informação. Nunca vou desistir dela;, contou a massagista terapêutica. Indignada, ela pede indenização ao hotel para ajudar a cuidar do neto. Segundo a jovem, o estrangeiro loiro e alto hospedado no lugar foi uma das poucas pessoas com quem ela transou sem camisinha. A menina, que abandonou a escola na 3ª série do Ensino Fundamental, sonha voltar à sala de aula e se formar médica para cuidar do filho. Fila imensa Apesar de a violência contra a menina ter ocorrido em fevereiro de 2007, só em outubro deste ano a Polícia Civil instaurou o inquérito. A delegada Glaucia Ésper justifica o atraso com o acúmulo de casos na DPCA. Segundo ela, hoje são aproximadamente 500 na fila. Além disso, a unidade está há quatro dias com o sistema fora do ar, o que dificulta o trabalho dos cerca de 40 agentes. Para concluir o inquérito, a ser enviado para a Justiça em dois meses, a delegada quer ouvir novos depoimentos, entre eles o de Capuzzo. Segundo Glaucia, a exploração sexual de crianças e adolescentes não é exclusividade dos setores hoteleiros. ;O crime ocorre em diversos pontos. O mais crítico é o Setor de Diversões Sul (Conic).; A gerente do Garvey, Adelgiza Castro, descarta qualquer ligação do lugar com a prostituição infantil e exige a apuração dos fatos. ;Estamos colaborando com a polícia. Mas só vamos demitir ele se comprovada a culpa na Justiça;, afirmou. Questionado sobre a exploração sexual da adolescente nos quartos do hotel, um funcionário disse não ter conhecimento do caso. Mas admitiu a dificuldade de controlar os acessos. ;Temos mais de 400 quartos. É difícil ver tudo.; (JC)

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