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Dono do poço vira coronel da água em cidade do Entorno

Sem contar com abastecimento regularizado, habitantes de Águas Lindas ficam à mercê de homem que transformou o fornecimento em um negócio particular. Mesmo ilegal, tem ajuda das autoridades

postado em 08/01/2009 08:29
Um recurso natural, que por lei deveria ser de todos, a água tem apenas um dono em um bairro de Águas Lindas (GO). Dono de um poço artesiano, José Romualdo Lima, 51 anos, faz o que seria o papel do Estado: irriga as torneiras das 80 famílias que residem no Jardim do Entorno 1. Para isso, ele cobra uma taxa de R$ 40 de cada morador, que chama de ;simbólica;. Quem não paga em dia, sofre a lei do coronelismo. Além de ter o fornecimento interrompido imediatamente, tem de se explicar na delegacia do município. Foi assim que aconteceu com o casal de serralheiros Elizete Rodrigues, 41, e Alexandre Alves Ferreira, 39, em 27 de dezembro. Eles resolveram parar de pagar a conta da água em maio do ano passado, porque Romualdo deixou de emitir o comprovante de pagamento. O esquecimento não prejudicou somente o controle dos dois, mas o próprio fornecedor se confundiu e passou a cobrar os meses que os moradores afirmam ter pago. Resultado: no dia em que não estavam em casa, o serviço foi interrompido sem aviso prévio. ;Ele veio aqui com um policial civil e simplesmente cortou o cano e colocou uma rolha;, acusa Elizete. Além de ficarem sem abastecimento, os dois foram convidados a comparecer no Centro Integrado de Operações de Segurança (Ciops) de Águas Lindas, acusados de furtar água particular. Lá, o casal afirma que pagou R$ 100 e parcelou o restante da dívida acumulada em 16 meses de inadimplência. O recibo da entrada foi manuscrito em um pedaço de papel em nome de Alexandre e Romualdo. Mas a Polícia Civil não fez o boletim de ocorrência. O casal denunciou a truculência policial ao Ministério Público. ;Isso é crime. O MP vai oferecer denúncia contra esse policial;, garantiu o promotor de Justiça substituto de Águas Lindas, Alberto Francisco Cachuba Júnior. Quanto a Romualdo, Cachuba disse que o MP vai apurar o caso para ver em qual responsabilidade penal ele será qualificado. ;Nosso maior problema é não deixar essas pessoas sem o fornecimento de água. Se ele parar de abastecer as casas, elas vão ficar sem;, ponderou o promotor. O MP já conhecia o caso, mas decidiu aguardar o resultado da eleição para prefeito, no ano passado. De posse do abaixo-assinado com 14 assinaturas de moradores do bairro, que pedem a mudança do fornecedor, o promotor vai propor uma reunião com a Seneamento de Goiás (Saneago) e a Companhia de Saneamento do Distrito Federal (Caesb) para tentar resolver o problema sem que as famílias paguem caro para ter a água em suas casas. ;O MP espera que elas não estabeleçam um custo elevado ao cidadão;, disse o Cachuba. Engavetado Em 2005, os governos de Goiás e Brasília firmaram parceria que prometia levar a infraestrutura de abastecimento de água e tratamento do esgoto para Águas Lindas. As obras começariam em outubro daquele ano e custariam R$ 185 milhões. Mas o termo de compromisso foi engavetado. Somente a sete dias no cargo, o prefeito eleito Geraldo Messias promete resolver o problema. ;O prefeito passado (José Pereira, do Democratas) não assinou o termo criando o consórcio entre as duas fornecedoras;, afirmou. O monopólio de Romualdo começou há 10 anos. Ele pediu demissão da empresa em que trabalhava ; especializada justamente no ramo que exerce hoje ; e abriu seu próprio poço artesiano no Jardim Entorno 1. Segundo ele, a intenção é ajudar as pessoas de baixa renda que não podem construir sua própria fonte de água. Para isso, investiu R$ 40 mil. Ele se gaba de fornecer à comunidade 200 mil litros de água por dia. ;Aquilo tem me dado muita dor de cabeça. Eu já ofereci à Saneago, mas não querem comprar meu três poços;, afirma. Romualdo, porém, não revela quanto pediu para a empresa. Mas o abastecimento das casas é arbitrário. Tem dias em a água é liberada apenas das 6h às 12h, como ocorre nos meses de seca. ;Como tenho três poços, vario o racionamento. Um dia um, depois em outro;, conta. Moradora da Quadra 9, Elizete já passou uma semana sem água. ;Perguntei se ele daria desconto na conta, mas recebi uma resposta irônica, de que ele não teria como pagar a cirurgia plástica da mulher;, afirma Elizete. Os carnês, por sinal, levam o nome da mulher dele na capa: Santa Ana Artesiano Ltda.

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