Cidades

Máfia dos concursos: Ortiz também é acusado de ser chefão de rinhas

Com a apreensão de 200 galos e acessórios para brigas nas casas do homem considerado o mandante de fraudes em processos seletivos, lista de crimes passa a incluir maus-tratos a animais e jogo de azar

postado em 06/03/2009 08:10
O homem acusado de liderar a máfia dos concursos tem o nome envolvido em mais uma atividade ilícita. Quase quatro anos depois de denúncia feita pelo Correio, policiais federais encontraram em um dos endereços do ex-técnico judiciário Hélio Garcia Ortiz em Brasília um centro de treinamento para rinhas de galo. Cerca de 200 animais, além de medicamentos e equipamentos especiais para as brigas, foram apreendidos ontem à tarde por agentes da Delegacia de Repressão a Crimes Ambientais, da Polícia Federal (PF). A operação contou com 10 policiais e ocorreu um dia depois que a corporação iniciou as buscas a Ortiz, considerado foragido pela polícia. Ele é acusado de envolvimento em nova tentativa de fraude no último concurso do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), realizado no DF em fevereiro pela Fundação de Apoio a Pesquisa, Ensino e Assistência (Funrio). Na quarta-feira, equipes da Delegacia de Repressão a Crimes Fazendários estiveram no Guará, onde fica a casa da família de Ortiz, e no Park Way, no Setor de Chácaras Veredão, para prendê-lo. Os policiais não o encontraram, mas levantaram indícios de rinha galo no segundo local. Organizaram, assim, outra operação. No início da tarde, os homens da delegacia de crimes ambientais entraram na propriedade de Ortiz e descobriram as duas centenas de galos. Os bichos estavam confinados individualmente em gaiolas de madeira e de metal. Havia no lugar anabolizantes e alimentos especiais, usados para encorpar e fortalecer musculatura. ;É um centro de treinamento com proporções nunca antes vistas no Brasil;, afirmou o titular da especializada, Fabiano Martins. Também chamou a atenção dos policiais federais a descoberta de equipamentos específicos para as batalhas de galos. Duas arenas circulares de concreto, além de biqueiras e esporas, deram uma noção de como o ex-técnico judiciário e funcionários da chácara preparavam os animais para encararem as disputas nos ringues. ;Deu para perceber que os bichos ficavam isolados em gaiolas pequenas para que ficassem irritados antes das brigas. Assim, entram nos locais de briga com capacidade até para se matar;, explicou Martins. Segundo o responsável pela Delegacia de Repressão a Crimes Ambientais, a preparação servia para selecionar os galos mais agressivos e fortes. Os bichos com as melhores performances em combate eram vendidos em países da América Latina, como Peru, Venezuela e Bolívia. A PF, por exemplo, encontrou indícios de que os exemplares mais bem treinados chegaram a ser negociados por algo entre R$ 3 mil e R$ 5 mil. Um ótimo negócio para quem é proprietário de cerca de 200 animais criados especificamente para rinhas. Hobby Apesar de não encontrarem Hélio Ortiz na chácara do Setor de Mansões Veredão, os policiais federais ouviram os depoimentos de alguns funcionários do lugar. Entre eles, um chacareiro. O homem, cuja identifica a PF preferiu manter em sigilo, admitiu o crime e confirmou a participação do ex-técnico judiciário na atividade ilegal (leia O que diz a lei). Assim, um novo inquérito será aberto, paralelo à investigação sobre a fraude no concurso do Depen em fevereiro. Ortiz é acusado de crime ambiental, por maus-tratos aos animais, e exploração de jogo de azar. O delegado Martins, porém, ainda não descartou a possibilidade de existirem outros centros de treinamento comandados por ele no DF. Em maio de 2005, o Correio visitou o mesmo local onde ontem a PF apreendeu os galos (veja fac-símile). A publicação da reportagem ocorreu no mesmo dia em que o acusado de ser o cabeça da máfia dos concursos se entregou à polícia. Na época, a investigação estava sob responsabilidade da Polícia Civil do DF. Naquela visita, a reportagem flagrou vários bichos logo na entrada do terreno localizado no Park Way ; havia ainda uma casa que não servia como moradia. Também encontrou uma arena usada para as rinhas, escondida em um galpão. Um dos empregados revelou que os combates serviam como hobby para Ortiz.
Em 2005, o Correio mostrou a estrutura de Ortiz para rinhas

Veja o vídeo da PF sobre a rinha de Ortiz

O que diz a lei Lei de crimes ambientais O artigo 32 diz que praticar abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos rende pena de três meses a um ano de detenção. Lei das contravenções penais O artigo 50 diz que estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante o pagamento de entrada ou sem ele, também prevê pena de três meses a um ano de detenção. Decreto Federal 16.590 A rinha de galo é considerada uma atividade ilícita desde 1924, quando a norma proibiu a concessão de licenças para quaisquer diversões que causassem sofrimento aos animais.
Tramitação demorada Além das duas novas acusações, o ex-técnico judiciário Hélio Ortiz responde a um processo na Justiça Federal aberto há quatro anos. Ele encabeça a lista dos 44 acusados pelo Ministério Público Federal de participar da máfia dos concursos ; 28 por formação de quadrilha e estelionato e 16 por serem beneficiários de fraude em pelo menos 12 processos seletivos. O julgamento está sob responsabilidade da juíza Maria de Fátima de Paula Pessoa Costa, da 10ª Vara Federal. A análise de documentos e os depoimentos dos réus, porém, se arrastam desde outubro de 2005. O procurador da República Gustavo Velloso, um dos representantes do Ministério Público na ação, informou, por meio da assessoria de imprensa, que a complexidade do processo contribui para a demora. Em nota, ele informou que ;devido ao grande número de réus, algumas diligências que estão sendo feitas, relativas a quebras de sigilo bancário e telefônico, exigem algum tempo;. Assim como a magistrada Maria de Fátima, Velloso evitou dar entrevistas antes da conclusão do julgamento. Todos os acusados de envolvimento na máfia dos concursos estão em liberdade. Ortiz, porém, agora vive mais uma vez a condição de foragido. O nome dele surgiu na investigação de uma tentativa de fraude em concurso após a prisão de um professor de matemática e de um comerciante de Taguatinga. Eles foram flagrados em 15 de fevereiro durante seleção para agente penitenciário. A investigação trouxe informações de que o ex-técnico judiciário atuava como articulador de profissionais escolhidos para fazer as provas no lugar dos candidatos a cargos públicos. Para a Polícia Federal, é indício de que a máfia dos concursos jamais parou de agir na capital do país. O candidato, que cedeu o lugar para o professor preencher as questões, também admitiu ter pago R$ 10 mil adiantados a Ortiz. Caso passasse no concurso, pagaria mais 10 vezes o valor do salário. É a mesma fórmula denunciada por uma mulher que contou ao Correio ter sido enganada pelo líder das fraudes. Em depoimento publicado ontem com exclusividade, ela disse que pagou entre R$ 5 mil e R$ 6 mil para ser aprovada na seleção de um tribunal do DF. ;Inicialmente, ele (Ortiz) falou que tinha condições de arranjar STJ, TJDF, Senado Federal, Técnico Penitenciário, Polícia Civil, PM;, afirmou.

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