Cidades

Máfia dos concursos: cerco ao chefão das seleções fraudadas

Incluído no sistema de procurados, Hélio Ortiz pode ser preso se tentar fugir por portos ou aeroportos. Para a polícia, ele não tem mais contatos com as organizadoras de provas públicas e age de forma pontual

postado em 07/03/2009 10:00
O ex-técnico judiciário Hélio Garcia Ortiz está com os movimentos cada vez mais limitados no Brasil. Considerado foragido há pelo menos três dias pela Polícia Federal (PF), o homem acusado de liderar a máfia dos concursos teve o nome incluído no Sistema Nacional de Procurados e Impedidos (Sinp). Isso quer dizer que ele pode ser preso assim que pisar em qualquer aeroporto ou porto do país. O banco de dados integrado reúne dados como foto, data de nascimento, filiação e detalhes do mandado de prisão expedido pela Justiça Federal. Além de responder a processo em Brasília por fraudes em mais de 12 concursos públicos, Ortiz ganhou outra vez espaço no noticiário policial ao se ver envolvido em duas novas investigações da PF. A abertura de um dos inquéritos ocorreu na última quinta-feira. Agentes federais encontraram em um dos endereços dele em Brasília um centro de treinamento para rinhas. Mais de 200 galos eram criados e selecionados em chácara do Park Way para brigas ilegais e revenda. Apurou-se que os animais eram vendidos por até R$ 5 mil. Também havia no lugar biqueiras, esporas e medicamentos especiais. O segundo caso diz respeito à tentativa de fraude em concurso para o Departamento Penitenciário Nacional (Depen). O processo seletivo, organizado pela Fundação de Apoio a Pesquisa, Ensino e Assistência (Funrio), foi realizado em 15 de fevereiro. A PF flagrou um professor de matemática fazendo as provas no lugar de um concorrente, identificado como um comerciante de Taguatinga. Há indícios de que Ortiz teria oferecido os serviços do mestre ao candidato, que pagou R$ 10 mil adiantado e, se passasse na seleção, completaria com 10 vezes o valor do salário. Tal investigação, aberta na Delegacia de Repressão a Crimes Fazendários da Polícia Federal, reforçou a ideia de que a máfia dos concursos nunca parou de agir no Distrito Federal. O episódio também serviu para que a PF reunisse informações de como o ex-técnico judiciário teria passado a atuar depois da série de prisões e do enfraquecimento do esquema em 2005 ; em 22 de maio de 2005, a Operação Galileu, da Polícia Civil do Distrito Federal, prendeu 103 pessoas. Para o delegado Júlio César Fernandes, titular da delegacia de crimes fazendários, Ortiz tem se valido da fama de fraudador de concursos para colecionar golpes na capital do país. O responsável pela apuração do caso acredita que o principal acusado não tem mais contatos nas entidades responsáveis pela organização de processos seletivos públicos no Brasil. ;Atualmente, não há nada que leve a crer que ele (Ortiz) tenha esses contatos. Não há mais esquema montado. Mesmo assim, vem falsificando documentos e agindo de forma pontual para fraudar concursos;, explicou Fernandes. Grande estelionatário O novo inquérito, além de depoimento obtido com exclusividade pelo Correio, sugere como Ortiz atua às vésperas de concursos importantes. Existiriam duas possibilidades. Um delas seria a contratação de professores para preencher as questões no lugar do candidato. A outra passaria pelo auxílio de intermediários. Eles teriam a missão de descobrir interessados em pagar para conseguir uma vaga no serviço público. Haveria, inclusive, uma fórmula de pagamento. O concorrente paga uma espécie de entrada entre R$ 5 mil e R$ 10 mil e, caso aprovado, mais 10 vezes o valor do salário. Uma mulher entrevistada pela reportagem disse que Ortiz ofereceu pessoalmente cargos em tribunais superiores, no Congresso Nacional e na polícia. Ela pagou cerca de R$ 6 mil para ser aprovada na seleção de um tribunal entre o início de 2007 e o fim de 2008. Como não passou, começou a cobrar o dinheiro de volta. Segundo ela, várias pessoas caíram no golpe. Algumas teriam desembolsado até R$ 20 mil. Para o delegado Júlio Fernandes, o acusado explora o perfil persuasivo. ;As investigações demonstram que ele é um grande estelionatário. E os supostos lesados aderem ao comportamento criminoso;, afirmou. O Correio conversou ontem com o advogado Pedro Barreto, um dos defensores do ex-técnico judiciário no processo da máfia dos concursos. Ele disse que a família ainda não procurou o escritório de advocacia para representar Ortiz nos dois inquéritos abertos nesta semana. Também revelou que não encontra o cliente há mais de um ano. ;Se assumirmos o caso, vamos recomendar que ele se apresente para a polícia. É o melhor caminho;, ponderou. (Colaborou Marcelo Ferreira) Denuncie Quem tiver informações sobre Ortiz ou foi lesado pode contactar a Polícia Federal pelo telefone 3799-9503.
Os rolos de Ortiz Se somadas, as penas previstas para todos os crimes que envolvem Hélio Ortiz chegariam a 36 anos de prisão. Nos últimos 20 anos, ele teve pelo menos 10 passagens pela polícia, além de sofrer processos disciplinares no Tribunal de Justiça e ser demitido. Formação de quadrilha, estelionato, falsidade ideológica e fraude em licitações Ortiz encabeça a lista de 44 acusados de fraudar pelo menos 12 concursos públicos no Brasil. O grupo começou a ser desarticulado em 22 de maio de 2005, na Operação Galileu, da Polícia Civil. A ação prendeu 103 pessoas durante a prova para agente penitenciário do Ministério da Justiça. O processo tramita hoje na 10ª Vara Federal. Em caso de condenação máxima, Ortiz pode receber pena de até 17 anos. Estelionato, falsificação de documento público e uso de documento falso Ortiz é acusado pela Polícia Federal de tentar fraudar o último concurso do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) em fevereiro. Há indícios de que ele tenha atuado como intermediário para que um professor fizesse as provas no lugar de um candidato. São 17 anos de prisão se pegar as penas máximas. Crime ambiental e jogo de azar O homem acusado de agir como líder da máfia dos concursos também tinha um centro de treinamento de galos de briga em uma propriedade no Park Way. Mais de 200 animais foram apreendidos quinta-feira pela Polícia Federal. Encontraram arenas, biqueiras, esporas e medicamentos usados para preparar os animais para rinhas. Os bichos eram vendidos por até R$ 5 mil a países da América Latina. Mais dois anos de reclusão se cair nas punições máximas. Punições funcionais Apesar da indefinição do processo aberto em 2005 para julgar os 44 réus da máfia dos concursos, pelo menos em um órgão os envolvidos acabaram punidos. Os 16 funcionários do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) suspeitos de fraude no concurso de 2003 perderam os cargos. Entre eles, Hélio Ortiz. As investigações revelaram que a quadrilha interferiu no concurso organizado pelo Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe) da Universidade de Brasília (UnB). As punições se deram a partir de apuração interna, promovida pela presidência do TJDF. Assim, houve 15 exonerações por fraude. Já o homem acusado de ser o líder do bando foi demitido por decisão unânime dos desembargadores, que o acusaram de improbidade administrativa, lesão aos cofres públicos e dilapidação do patrimônio nacional ; a exoneração de funcionários públicos como o de Ortiz só acontece se existe crime, como exige a Lei 8.112, de 1990. Sem pagamento As perdas das funções públicas ocorreram entre dezembro de 2005 e novembro de 2006, após menos de um ano de análises individuais realizadas pela Comissão Permanente de Processo Disciplinar da Corregedoria do TJDF. Nenhum dos 16 ex-funcionários acusados de envolvimento na máfia dos concursos figura atualmente na folha de pagamentos do órgão, segundo informações da assessoria de imprensa do tribunal. Receberem apenas enquanto estiveram afastados.

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