Cidades

Demolição revela descaso com obras de Athos Bulcão

Dois painéis que enfeitavam a sede do Clube do Congresso na Asa Sul desapareceram. Estrutura dará lugar a um centro comercial

postado em 17/03/2009 09:01
Dois painéis de Athos Bulcão enfeitaram, durante pelo menos 30 anos, as paredes da sede social do Clube do Congresso, na 702/902 Sul. Um deles, pintado nas cores azul e branco e com as inconfundíveis formas geométricas do artista, embelezava a sauna. O outro, uma montagem com blocos de gesso em autorrelevo, adornava a parede que acompanhava a escadaria de mármore do hall de entrada. As obras faziam parte do legado de Athos espalhado pela capital, mas desapareceram do prédio, que começou a ser demolido na semana passada. Ninguém sabe dizer exatamente o que ocorreu com o trabalho do artista, morto em julho do ano passado. A probabilidade maior é que os painéis tenham sido destruídos. Um centro empresarial será erguido no antigo clube. O lote foi colocado em leilão em 2000 e acabou arrematado pela iniciativa privada. Até setembro de 2006, uma academia funcionava no local, mas o prédio está abandonado desde então. Há cerca de dois anos, o terreno foi comprado pelo empresário Davi Avelar, que fez parceria com a Construtora Brasília (Conbral) para a edificação do centro. Serão duas torres de quatro andares cada ; o estabelecido pelo gabarito do setor ;, destinadas a clínicas e salas comerciais. A Conbral aprovou o projeto na Administração de Brasília e conseguiu alvará de demolição no fim do ano passado. A derrubada da antiga sede do clube começou na semana passada. A previsão é que o trabalho demore mais uma semana. A construção do centro empresarial, que deve durar 18 meses, está prevista para ter início em maio. O diretor-presidente da Conbral, Ennius Muniz, garante que não havia nenhuma obra de arte no clube quando a construtora começou a trabalhar. ;Quando recebi o prédio, ele estava todo descascado. Até nos falaram dos painéis, mas não tinha mais nenhum azulejo quando chegamos;, diz. Abandono Os painéis foram projetados em 1972. Ontem, o Correio esteve no prédio em demolição, mas foi impedido de entrar no local. O superintendente regional do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Alfredo Gastal, conta que há pelo menos três anos os painéis não estão no local. ;Aquele clube foi abandonado há anos. A sede social não tinha mais portas nem esquadrias. Eu estive lá uma vez para ver o que tinha sobrado e só tinha cacos no chão e fragmentos dos azulejos;, relata. O Congresso Nacional foi procurado pela reportagem, mas a assessoria de imprensa do Senado Federal informou apenas que o órgão não tem mais qualquer relação com o clube. A secretária executiva da Fundação Athos Bulcão, Valéria Cabral, está revoltada com a provável destruição da obra. Em 2007, quando soube que o prédio estava interditado por tapumes, ela ligou no clube e alertou um encarregado pelo local da presença das obras. ;Ele falou que sabia, me pediu para ficar tranquila, pois nada seria colocado abaixo;, conta. Agora, a fundação está fazendo, em parceria com o Iphan, um inventário da obra de Athos na cidade. Há duas semanas, uma técnica esteve no clube para tentar tirar medidas e fotografar os painéis, mas foi impedida de entrar. ;Falaram que não tinha mais nada lá, que estava tudo destruído.; Há dois anos, o painel de gesso do hall de entrada foi reproduzido na fachada do restaurante Piantella (202 Sul), com autorização de Athos. Valéria lamenta a perda da obra original. ;O azulejo é matéria-prima, ainda pode ser fabricado. O problema é a falta de respeito com uma obra de arte. No momento em que uma obra se incorpora à arquitetura, ela deixa de ser nossa. Poderiam ter nos telefonado antes, a gente tentava tirar os azulejos com mais cuidado e salvar alguma coisa;, afirma. Segundo o diretor-presidente da Conbral, a empresa pode reconstruir os painéis no novo edifício. ;Se nos derem o projeto, a gente refaz, sem problema.;

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