Cidades

Transporte pirata atua livremente na rodoviária de Sobradinho

Em três horas, Correio flagra 13 viagens de carros irregulares no Terminal de Sobradinho, a 100m da sala do órgão de fiscalização. Governo alega que há uma migração da prática do Plano Piloto para as satélites

postado em 18/03/2009 08:13
O transporte pirata atua livremente no Terminal Rodoviário de Sobradinho, disputando passageiros com os ônibus de linha. Um grupo de motoristas faz da prática da lotação um emprego praticamente fixo e coloca vidas em risco fugindo da fiscalização e de multas que podem chegar a R$ 5 mil. Cidadãos, que são aliciados na fila do ônibus, optam pelo risco alegando comodidade e escassez de veículos oficiais. A movimentação do transporte ilegal em Sobradinho começa pouco depois das 8h, quando o trânsito de ônibus já não é tão intenso. O principal alvo dos piratas é o passageiro que vai para Planaltina. Por isso, todos os dias um grupo deles se forma nos bancos que ficam na frente do box da linha 504.4, operada pela empresa Viva Brasília. Durante a manhã, o intervalo entre um ônibus e outro gira em torno de 40 minutos. Como os piratas saem o tempo todo, adaptam o itinerário aos passageiros e até dão desconto na passagem, tornam-se uma opção atraente para pessoas como a dona de casa Gislene Aparecida Medeiros, 27 anos, que ontem foi ao dentista em Sobradinho. ;Quando sair um pirata eu vou pegar para chegar em casa antes. O ônibus demora e para muito. Nunca tive problema indo de carro;, garante ela, que em seguida muda de opinião. ;Na verdade, tenho um primo que é motoboy e nunca caiu de moto, mas já se acidentou em transporte pirata. Perdeu um mês de trabalho porque quebrou o braço;, completa. O carro que levava o primo de Gislene estava fugindo de uma viatura da Polícia Militar quando tombou perto da entrada de Planaltina. Fugir da fiscalização é uma rotina para quem ganha o pão dessa forma. Ontem, o assunto principal dos piratas de Sobradinho era uma blitz do Detran montada logo no início da manhã na entrada do Jardim Roriz, bairro de Planaltina. Um homem de mais ou menos 50 anos, vestindo camiseta verde e bermuda, que chegou na rodoviária por volta das 9h, contou seu susto para todos os colegas. ;Quando entrei lá não tinha nada. Estava voltando com o carro lotado e vi os retornos fechados. Suei frio na hora, mas não me pararam. Estou com as pernas tremendo até agora;, relatou ele, que, mesmo assim, continuou levando passageiros. Entre as 8h30 e as 11h20 de ontem, o Correio flagrou 13 viagens de piratas. Os carros de passeio dirigidos, na maioria das vezes, por homens de meia-idade, levaram 54 passageiros ; mais do que um ônibus cheio. No último flagrante, um homem de camiseta vermelha levou três pessoas no carro enquanto o ônibus estava no box, quase saindo. No período da manhã, cinco ônibus foram de Sobradinho para Planaltina. A maioria saiu com menos de 10 passageiros. Cobrança Até uma mulher enfrenta os riscos do transporte pirata. Ela, que usava calça jeans e blusa preta, saiu do terminal por volta das 10h com cinco passageiros, um deles uma criança de colo. O excesso de gente em um único carro também não é raro. Pouco depois das 9h, por exemplo, um Gol preto deixou a rodoviária com sete pessoas dentro. Os carros de passeio ficam estacionados do lado de fora do terminal, bem perto da área de embarque. Após aliciar os passageiros, os piratas os levam andando até o local. Tudo isso a cerca de 100 metros da sala do órgão responsável pela fiscalização da pirataria, o Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans). ;Esse é um dos problemas que enfrentamos;, admite o secretário de Transportes Alberto Fraga. ;Já avisei aos fiscais em reunião que eles precisam fiscalizar, não ficar sentados na frente do computador. Se isso continuar, vou fechar todas as salas em rodoviárias;, completou ele, que diz ainda não ser fácil combater a pirataria. ;Mesmo assim, na minha gestão já prendemos mais de 10 mil piratas nas blitzes e operações;, completou ele. Segundo dados do DFTrans, foram 4.325 casos em 2007, 4.534 no ano passado e 192 em 2009, sendo 19 ônibus, três micro-ônibus, uma van e 169 carros de passeio. Ainda segundo Fraga, a pirataria está migrando para as cidades mais afastadas porque o cerco está fechado no Plano Piloto, que era o principal campo de ação desses motoristas. ;Não estou dizendo que acabou no Plano. Diminuiu, mas ainda acontece, sobretudo nas paradas de ônibus. Estamos combatendo;, comenta o secretário. Risco para os dois lados Os motoristas do transporte ilegal acham que o maior perigo do ofício são as autoridades, mas, no último dia 3, o corretor de imóveis Luiz Alves Filho, 53, perdeu a vida transportando bandidos. Ele foi morto por Jeferson Diego Rodrigues Neto, 21, passageiro que pegou na BR-020, próximo ao condomínio Mestre d'Armas, enquanto fazia lotação entre Planaltina e a Rodoviária do Plano Piloto com o Fiat Uno (JHG 7429-DF). Ele pegou Jeferson no fim da tarde daquela terça e resolveu não obedecer ao assaltante, que ordenou com uma arma que o motorista fosse para o Paranoá. Ao frear em frente ao posto da Companhia de Policiamento Rodoviário da subida do Colorado, Luiz foi atingido por um tiro na nuca e morreu. ;Quem entra num carro sem nem saber se o motorista está habilitado ; e já achamos vários sem carteira ; tem uma ponta de irresponsabilidade. Já ocorreram casos de estupro, agressão e assalto;, relata Alberto Fraga, que admite que a pirataria se desenvolve nas falhas do transporte público. ;O ônibus demora ou passa cheio. Muita gente acha cômodo o pirata. Pedimos às pessoas que tenham paciência, pois o risco é grande e estamos melhorando os ônibus;, conclui o secretário, que prometeu atuar hoje com a fiscalização em Sobradinho. FIQUE ATENTO Os perigos do transporte pirata Para os passageiros: # Desconhecimento sobre as condições mecânicas e de segurança do veículo # Desconhecimento sobre as intenções do motorista # Nenhuma garantia em caso de acidentes # Não ter com quem reclamar de um serviço mal prestado Para os motoristas # Fica sujeito a multa que varia de R$ 2 mil a R$ 5 mil # Pode ter o veículo recolhido ao depósito do Detran # Desconhecimento sobre as intenções dos passageiros

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