Cidades

Familiares descrevem Sérgio Casadio como introspectivo, mas amoroso

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postado em 05/04/2009 08:28
Uma criança brincalhona, mas um pouco introspectiva. Um adolescente com dificuldades de aprendizagem, porém, divertido. Um apaixonado por voleibol. Ótimo filho. Bom devoto, seguidor dos ensinamentos religiosos. Profissional dedicado, competente. Pai carinhoso. Uma pessoa extremamente confiável. Do bem. Na ótica dos familiares, amigos, ex-colegas de trabalho e de colégio, essa é a descrição de Sérgio Alexander Dias Casadio, 35 anos, o homem que confessou a morte de três brasilienses entre novembro do ano passado e janeiro deste ano. Ele contou em depoimento ter planejado tudo, de forma fria e metódica. E agradeceu por ter sido preso pela polícia, há pouco mais de uma semana. Faria novas vítimas, caso continuasse em liberdade. Sérgio não conhece os pais naturais. Passou a infância e a adolescência em Taguatinga, sob o carinho, proteção e rigidez de pais que o adotaram ainda bebê e são fiéis seguidores da doutrina das Testemunhas de Jeová. Mineiro do interior, o pai postiço ajudou a construir Brasília. Sempre morou em Taguatinga. Primeiro, em um acampamento de operários. Depois, no terreno onde construiu a casa de dois pavimentos. Sérgio nunca bebeu, fumou ou usou outras drogas. Muito menos teve passagem pela polícia até a fase adulta. Ainda criança, porém, a mãe adotiva cismou que ele tinha algum problema. Estava incomodada por Sérgio não interagir como os meninos da mesma idade e apresentar certa dificuldade de aprendizagem. ;Esse menino não é igual aos outros;, comentou a mulher com o marido. O pai marcou uma consulta médica para o filho. No dia seguinte, o menino estava na sala de um psiquiatra. Após uma série de exames, constataram que ele tinha ;um estreitamento no crânio;, segundo o pai revelou a amigos próximos. O tal estreitamento seria sua maneira de explicar limitações no aprendizado escolar do filho. Mais tarde, no entanto, Sérgio demonstraria ser um sujeito capacitado e meticuloso, no trabalho e no crime. Repetência escolar Antes, o ainda adolescente Sérgio deu motivos para aumentar a preocupação dos pais em relação a uma possível limitação do filho. Aos 13 anos, em 1986, passou a cursar a antiga 6ª série no Centro de Ensino Médio 3, em Taguatinga Sul. Fazia o trajeto entre a casa e a escola a pé. Morava a duas quadras do colégio. Às vezes, ficava após o término das aulas para jogar vôlei com os colegas. Aos domingos, as partidas ocorriam na quadra da QSF 15. O mesmo interesse, porém, não tinha pelas outras disciplinas. Tanto que, em seis anos, completou apenas três da vida escolar. Deixou o colégio aos 18, antes de iniciar o 1º ano do extinto 2º grau. Sem o estudo, começou a se dedicar ao trabalho. Além de uma revenda de carros, onde trabalhava como consultor técnico, e das quadras de vôlei, frequentava a casa dos pais e a igreja. Nos cultos, conheceu a primeira namorada. Casou-se aos 20 anos, virgem, como queriam os pais. Mas a companheira escolhida desagradou aos familiares, apesar de também ser testemunha de Jeová. Parentes próximos acreditavam que a mulher tinha uma vida fora dos preceitos da religião. A união durou dois meses. Acabou por suposta traição da esposa. Frustração profissional Separado, Sérgio passou a se dedicar mais ainda ao trabalho. Além dos automóveis, só queria saber do vôlei, que jogava regularmente com amigos no meio da semana. Trabalhou com carteira assinada em três grandes revendedoras de carros de Brasília. Sempre como consultor técnico. Atendia os clientes que levavam os veículos para revisão ou ao conserto. Explicava o problema e dava a solução. Sérgio era tido como um profissional altamente qualificado, apesar de nunca ter feito um curso superior ou técnico de engenharia mecânica. Em uma das concessionárias, pediu demissão três vezes e, em todas, o chefe implorou para ele voltar. Aumentou o salário do empregado na tentativa de segurá-lo na firma por mais tempo. As demissões do funcionário se deram por causa da sua frustração profissional. Para ele, não passava de uma obrigação estressante e tediosa. Apesar de ser reconhecido como excelente consultor técnico, sempre almejou outra função. Queria ser vendedor. Ter menos problemas e ganhar melhor salário com comissões pomposas a cada negociação concretizada. Ao menos uma vez, deixou clara a insatisfação. Saiu da empresa para nunca mais voltar após ver uma colega, que havia começado como consultora técnica e aprendido o ofício com ele, ser promovida a vendedora em pouco tempo de casa. Na informalidade Após as três grandes concessionárias, Sérgio conseguiu vaga em uma pequena revenda de carros usados, na Cidade do Automóvel, à margem da via Estrutural. Trabalhou como vendedor, mas não ganhava tanto quanto esperava. Foi o último emprego formal. Desde então, há pouco mais de um ano, passou à condição de autônomo. E logo entrou para o crime. Vivia da venda do ágio de veículos e só fechava negócios se pudesse obter vantagens mais à frente. Queria acumular dinheiro, mas não colocou um bem em seu nome ; tinha o nome sujo na praça por conta de dívidas. Parte do que ganhava, mandava para os três filhos, atualmente com idade entre seis e dez anos, que teve com três mulheres diferentes, em relacionamentos passageiros. Nunca pagou pensão alimentícia, mas arcava com o material escolar e as roupas das crianças. O último endereço fixo dele era uma quitinete barata de um prédio construído irregularmente onde deveria haver chácaras. Na Rua 10A da Colônia Agrícola Vicente Pires, a menos de 100m da via Estrutural e 200m do posto da Polícia Rodoviária, o imóvel mal acabado abriga oito pequenos apartamentos nos dois pavimentos superiores. No térreo, há três salas comerciais abandonadas. Sem suspeita Na quitinete alugada, Sérgio matou uma das três vítimas. Na sala do imóvel, jogou um pedaço de mármore na cabeça da namorada, Rízia Regiane de Oliveira, 33. Deixou-a sangrando no chuveiro para evitar sujeira no apartamento. O crime começou a ser planejado no primeiro dia do ano e ocorreu em 2 de janeiro. Ninguém desconfiou. Ele tirou o corpo enrolado em um tapete, no bagageiro do carro. O Correio tentou entrevistar os vizinhos de Sérgio. Nenhum sequer atendeu o interfone. A dona do prédio também não quis falar com a reportagem. Negou até que ali tivesse morado o assassino confesso e a namorada dele. ;Nunca aluguei um quarto para pessoas com esses nomes;, afirmou a mulher, sem esconder o nervosismo. A reportagem encontrou os pais e a irmã dele na antiga casa da família. Hoje, eles ocupam apenas o segundo pavimento da casa de Taguatinga Sul. O primeiro é alugado para um salão de beleza. Sem esconder as lágrimas, o pai atendeu aos jornalistas. Pediu desculpas. ;Gostaria muito de falar quem é o meu filho, como ele é realmente. Está doendo demais. Nós estamos chocados. Amigos dele choram o dia inteiro;, desabafou o homem, de roupas simples e pele morena castigada pelo tempo e trabalho. Ele e a filha contaram que haviam contratado um advogado na quarta-feira. ;Nem ele (o advogado) nem a gente ainda sabe o que realmente aconteceu. Estamos tentando entender tudo;, comentou a irmã. Um dos melhores amigos de Sérgio é um policial civil, também testemunha de Jeová. Ambos costumavam ir e voltar juntos das partidas de vôlei com amigos. O policial, também considerado profissional exemplar, contou aos colegas de trabalho nunca ter desconfiado de Sérgio. Os comentários vieram após a prisão do homem acusado de matar ao menos três pessoas. Como todas as outras pessoas próximas do suposto assassino em série, o investigador se diz chocado.

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