postado em 10/04/2009 16:00
No Ano Internacional da Astronomia, a capital da República não tem o que comemorar. Há 12 anos, o Planetário de Brasília acumula pó, mofo, rachaduras e promessas de reforma e reabertura. A sala de teto abaulado que um dia levou centenas de crianças ao espaço sideral nem de longe lembra o lugar mágico guardado apenas na memória de quem desvendou os mistérios do universo sem tirar os pés da Terra.
Quando o mundo comemora os 400 anos das primeiras observações telescópicas do céu feitas por Galileu Galilei, astrônomos profissionais ou curiosos de Brasília tentam se contentar com a renovada promessa de que, desta vez, a obra será concluída ; por R$ 7,3 milhões ;, e o planetário voltará a deslumbrar seus visitantes a partir de março de 2010. Mas máquinas e homens trbalhando, somente a partir de 25 de maio.
A última vez que o planetário abriu as portas foi em 1997 (veja Memória). Em 2004, o Governo do Distrito Federal, então chefiado por Joaquim Roriz, assinou um convênio com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Por meio dele, o governo federal se comprometia a repassar R$ 700 mil para compra e manutenção de equipamentos. A contrapartida do GDF era reformar o prédio, obra avaliada em R$ 2,5 milhões. O governo federal cumpriu a parte dele. O dinheiro foi gasto conforme o contrato, mas a reforma nunca saiu.
Problemas estruturais
Segundo o secretário de Ciência e Tecnologia do DF, Izalci Lucas, o governo local contratou a empresa para fazer o projeto de reforma em 2005. Na época, Izalci ocupava o mesmo cargo. A proposta previa novo uso para o pavimento superior, transformando-o em um espaço para exposições, biblioteca e terminais de acesso à internet. O valor saltou para R$ 7,1 milhões.
Mas um mês após o começo das obras, a empresa teria detectado problemas estruturais e a necessidade de desmontar a base do projetor e a mesa de comandos do equipamento. ;Não encontramos nos arquivos do GDF o cálculo estrutural do prédio. Com isso, foi necessário fazer um novo cálculo com base na estrutura pronta para saber onde e como mexer. Sem ter essas informações, não tinha como fazer nada;, relatou o secretário de Obras, Márcio Machado.
O sumiço do projeto original do planetário custou ao governo um gasto extra de R$ 252,8 mil. Para desmontar e montar o equipamento, serão necessários outros R$ 130 mil. Esses foram os motivos para a interrupção da obra em 2008, segundo Izalci, que à época garantiu o término da reforma para maio de 2009. Agora, a promessa é que em 25 de maio os trabalhos sejam retomados e o prédio entregue em 6 de março de 2010.
Márcio Machado disse que R$ 2,5 milhões estão garantidos. O restante depende do andameno das obras. O Ministério de Ciência e Tecnologia informou estar em entendimento com o GDF para ;encontrar a melhor solução e o mais rápido possível;.
Visita fascinava crianças e adultos É provável que uma geração inteira de brasilienses sequer saiba o que é o planetário. Mas quem esteve no local fala com entusiasmo quase incompreensível para os dias atuais. A convite do Correio, um grupo de amigos voltou ao planetário na tarde de ontem. Eram os servidores públicos Estevão Caputo, 40 anos, Denis Fernandes, 34, e Marcelo Domingues, 38, e a assistente social Juliana Pontes, 25, e o astrônomo Airton Lugarinho de Lima Câmara, que trabalhou no prédio de 1982 a 1989. Quando o tapume foi retirado e a luz do dia clareou parte da sala de projeção escura e cheirando a mofo, vieram o espanto, o entusiasmo e o saudosismo. ;Quando eu era criança isso aqui era gigantesco!”, destacou Denis. Por conta da reforma, tantas vezes iniciada e interrompida, as poltronas com assentos reclináveis foram retiradas. ;A gente ficava quase deitado, olhando para o teto. A impressão é que estávamos dentro de uma nave espacial, soltos no espaço e podíamos tocar os planetas;, recordou Denis, empolgado. Hoje, Marcelo Domingues preside o Cube de Astronomia de Brasília (Casb). Ele se lembra de ter visitado o planetário três vezes. ;Na projeção, os planetas ; alguns coloridos ; cruzavam o céu na nossa frente. Mesmo muito simples, quem veio aqui uma única vez, ficou deslumbrado, com certeza;, garantiu o servidor público, que atribui à experiência a paixão pelo universo que carrega vida afora. Quando esteve no planetário pela primeira vez, Juliana tinha 6 anos. O que ela guarda na memória são fragmentos de lembranças, mas de uma coisa não tem dúvida: ;A gente ficava quase deitado e via um céu que você quase nunca vê na cidade;. O astrônomo Airton Lugarinho muito provavelmente recebeu alguns dos colegas de ontem para a visita na década de 1980. Ele contou que havia um programa de simulação de lançamento de foguete. As luzes se apagavam, flashes eram disparados, seguidos de ruídos e apareciam imagens do céu rodando. ;Nesse momento, a gente dizia: ;Você está convidado para uma viagem a lua.; Lembro ter ouvido uma criança dizer: ;Espera, não posso ir, não avisei a minha mãe.; A sensação que se tinha era de que realmente você estava numa nave;, comentou.
Memória Histórico de abandono Com 35 anos, o Planetário de Brasília é marcado por problemas que resultaram no seu fechamento em 1997. Com a ideia de unir o céu e o mar, o arquiteto Sérgio Bernardes projetou 16 aquários para ocupar o pavimento superior. Eles nunca saíram do papel. Reformas, já anunciaram muitas. Nenhuma ainda sequer começou. 1974 O planetário é inaugurado em 15 de março pelo governador Hélio Prates, mas em 30 dias o lugar precisa ser fechado por estar inacabado. 1975 A reabertura do planetário ocorre em agosto, mas os problemas estruturais continuam. O prédio segue aberto por um breve período, até ser fechado novamente em 1979. 1980 Após um ano sem funcionar, o planetário volta a receber o público em outubro. Passa cinco anos aberto e é fechado novamente devido a problemas técnicos. 1997 Problemas sérios de estrutura como infiltração, mofo, sujeira e quebra do projetor assolam o planetário. Reformas são realizadas, mas insuficientes para a reabertura. 2004 Convênio firmado entre o Ministério da Ciência e Tecnologia e o GDF define recursos para o setor que beneficiam o planetário. As obras de recuperação são orçadas em R$ 2 milhões. 2005 É feita uma nova avaliação das estruturas do planetário que descarta os aquários previstos no projeto original. A reforma que deveria ser concluída no primeiro semestre de 2006 não sai do papel. 2006 Em 12 de maio, o governo local anuncia que o Ministério da Ciência e Tecnologia vai liberar R$ 344 mil para a reforma do planetário. Obras iniciaram em agosto. 2008 Em 17 de julho, a Secretaria de Obras anuncia o início da reforma, prevista para terminar em 10 meses. O custo sobe para R$ 7,2 milhões. Operários limparam os prédios, mas a obra nunca começou.