Cidades

TJ manda a Vivo revelar dados de uma pessoa que constrangeu mulher casada

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postado em 23/04/2009 07:59
Em que momento termina o direito de uma pessoa e começa o de outra? O questionamento pode render horas de discussões ainda mais acaloradas quando, em jogo, está o princípio constitucional da privacidade nos e-mails, nas salas de bate-papo e em mensagens de texto pelo celular. E o debate pode ser maior se tiver como objeto mensagens de amor anônimas enviadas para uma mulher casada por meio de torpedos. Foi o que ocorreu em Brasília. Sem saber quem estava invadindo a intimidade familiar, a brasiliense Maria*, 40, entrou com ação na Justiça contra a operadora de celular Vivo para exigir a identificação de quem lhe mandava as mensagens. Na última segunda, o Tribunal de Justiça do DF publicou a decisão depois de dois anos de tramitação e recursos. A 2ª Turma Recursal confirmou sentença do juiz do 7º Juizado Especial Cível para condenar a operadora a fornecer os dados de um desconhecido que lhe enviava mensagens de cunho amoroso. ;O direito da autora está sendo violado por alguém que utilizou o serviço telefônico da empresa ré. É razoável que (a operadora) forneça as informações necessárias para a autora tomar as providências;, sentenciou o Juiz Flávio Almeida da Fonseca. ;Tenho um bom casamento que já dura 10 anos, mas eu e meu esposo chegamos a discutir por causa das mensagens;, explicou Maria. ;Por isso, decidi ir até o fim e confrontar essa pessoa que não sabe quanto mal pode estar fazendo a uma família;, disse. A vítima afirma não desconfiar da origem das mensagens que terminaram pouco depois de ela ter dado entrada no processo. A Vivo informou por meio de nota que, apesar de sempre cumprir decisões judiciais, considerando a peculiaridade do caso objeto da matéria, apresentará o recurso. Entendimento De acordo com o juiz Paulo Blair, doutorando de direito constitucional da Universidade de Brasília, o caso é uma quebra de privacidade, mas que deve ser permitida em casos extremos. ;Uma coisa é o texto, outra é a vida real. A privacidade é um direito fundamental, mas não é um absoluto.; Ele completa ao destacar que não pode um indivíduo, valendo-se da privacidade da comunicação, causar danos à ordem de direito. ;O direito de privacidade não pode ser um escudo para violar a Constituição;, completou. Para Thiago Tavares Nunes de Oliveira, presidente da SaferNet Brasil, ainda há, nesse caso, um elemento que favorece a decisão da Justiça. ;Divulgar o número não é ir contra a privacidade porque quem está solicitando a revelação do dado é o destinatário;, observa. ;Hoje em dia, cada vez menos as navegações são anônimas. A rede mundial de computadores permite a identificação quando o crime é pela internet e, pelos celulares, podemos contar com cadastros das operadoras.; A polêmica sobre a manutenção da privacidade tem como origem a Constituição, que prevê a tutela do sigilo das correspondências e comunicações telegráficas e telefônicas. No entanto, a Justiça já entende como diferente a quebra de sigilo telefônico e a quebra de sigilo de dados telefônicos, pois, enquanto a primeira trata de interceptação da comunicação que deve ser evitada, a segunda corresponde à obtenção de registros existentes na companhia telefônica sobre ligações realizadas, dados cadastrais do assinante, data da chamada, horário, número do telefone chamado, duração do uso e valor da chamada. * Nome trocado a pedido da vítima Memória Precedente no Sul Apesar de ainda rara nos tribunais brasileiros, a polêmica envolvendo a Vivo e uma usuária da operadora de celular não é inédita. ;A sociedade e o Estado estão se adaptando às novas tecnologias e definindo interpretações legais para proteger o cidadão sem ferir a Constituição;, observa Thiago Tavares Nunes de Oliveira, presidente de diretor de projetos da ONG SaferNet Brasil. Em 31 de maio de 2007, o Tribunal de Justiça de Porto Alegre (RS) deu ganho de causa à família de Márcio Russomano Fernandes. Filho de um médico, ele usava a linha de celular de um plano empresarial da Associação dos Médicos do Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RS) firmado com a Claro. Em dezembro de 2005, Márcio passou a receber mensagens de texto de conteúdo ofensivo, com a intenção de denegrir o relacionamento dele e da namorada, Renata Tonin. Os torpedos, de acordo com a vítima, eram enviados da homepage da operadora, o que impossibilita ao autor visualizar o número de telefone do remetente das mensagens. Ao procurar uma solução extrajudicial foi informado pela operadora de celular que as informações pretendidas só poderiam ser fornecidas mediante ordem judicial. O juiz Mário Rocha Lopes Filho acatou o pedido e ordenou à operadora que fornecesse a origem dos computadores de onde as mensagens eram mandadas, bem como o provedor utilizado ou o número do telefone que originou as referidas mensagens. (EK)

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